A
suinocultura e os licenciamentos ambientais.
Carlos
Alberto dos Santos Dutra.
A
manifestação ruidosa da comunidade urbana do reassentamento Novo Porto João André, ocorrida
dias atrás pelas ruas da cidade, desnudou uma questão que mais cedo ou mais tarde o município teria que enfrentar, uma vez que, cada vez mais, o cidadão tem acesso
às informações e deseja decidir sobre os destinos de sua cidade, seu
desenvolvimento, e aplicação dos recursos.
Para tanto o município conta, como sempre contou, com seu tradicional arcabouço jurídico. Acontece que na maioria das vezes, a comunidade e o
próprio poder público desconhece o conteúdo e o alcance deste aparato
legislativo. E tampouco interage com o povo sobre as decisões que tem tomado.
No caso específico dos licenciamentos ambientais, sobretudo dos projetos de suinocultura, atividade que há vinte anos vem fomentando a economia de Brasilândia, em regime de parceria e consórcio com os produtores rurais, cabe aqui um dedinho de prosa e atenção sobre este assunto intocado.
No caso específico dos licenciamentos ambientais, sobretudo dos projetos de suinocultura, atividade que há vinte anos vem fomentando a economia de Brasilândia, em regime de parceria e consórcio com os produtores rurais, cabe aqui um dedinho de prosa e atenção sobre este assunto intocado.
Recordemos
que os primeiros projetos de suinocultura iniciaram nos anos 1994 pelo Grupo
Arthur Hofig e que deram impulso significativo na economia do município. Duas décadas depois, o Grupo AH possuía um
plantel de 108.492 cabeças, com uma reprodução de 8.100 matrizes, obtendo um
resultado em 2012, em vendas, de 195.718 cabeças e 21.623 toneladas de carne
vendida, com um número de 93 colaboradores.
De lá
para cá o pioneirismo da suinocultura cada vez mais foi incentivado e
estimulado como uma nova alternativa para a economia da região gerando emprego
e renda para a comunidade, o que garantiu àquela empresa alcançar seu objetivo de distribuir riquezas elevando a melhoria
de vida dos parceiros.
E os
benefícios para Brasilândia logo vieram. Os mais antigos hão de recordar dos pioneiros nesta atividade. Um deles, o primeiro
parceiro na cidade a implantar o projeto, foi a família
Franzin que no dia 20 de junho de 1999 recebeu em sua propriedade rural, o
Sítio Santa Luzia, a primeira remessa composta de 810 leitões. Um dia histórico, um marco na suinocultura de Brasilândia.
O
livro “História e Memória de Brasilândia” (que estou escrevendo) registra que naquela
oportunidade, encontrava-se no ato da entrega, o Gerente de Mercado, Miguel Estevam; o Gerente da Granja, Carlos Alberto Brands e o Técnico em Suinocultura, Franklin Ribeiro.
A
empresa, junto com o município conseguiu um convênio onde a Prefeitura na época,
de livre e espontânea vontade, encarregou-se de doar aos primeiros seis
parceiros do projeto um poço semi-artesiano e também a terraplanagem para
construção dos barracões, as escavações e abertura das valetas, para canalizar
os dejetos dos suínos até as lagoas de decantação, tudo isso em benefício ao
produtor rural em parceria com o Grupo Hofig Jr.
Tudo
isso abriu caminho para outros produtores que vieram depois e também se dedicaram
a exploração da suinocultura agregando valor à atividade agropecuária de
Brasilândia, o que conferiu ao município status entre os dez maiores produtores
de suíno do Estado. Seus nomes e sua historia deixarei para revelar àqueles que
se dispuser a adquirir o livro que se encontra no prelo. Ficou patente, assim, a
importância inconteste desse ramo de atividade no incremento da economia do município.
Em virtude
do impacto ambiental, e das já conhecidas complicações decorrentes da
coexistência e proximidade desta atividade com unidades residenciais, esta nova
realidade exigiu do município debruçar-se sobre a parca legislação que possuía
e a necessidade de disciplinar a implantação destes projetos na proximidade da
zona urbano, haja vista que muitos dos produtores interessados em aderir à
suinocultura eram sitiantes ou moradores na região periurbana do município.
Na
ausência do preenchimento da vaga de biólogo que o município protela há mais de
um lustro, entre outras limitações estruturais, o que daria autonomia ao
município para realizar ele mesmo os licenciamentos ambientais, ao contrário,
essa atividade permanece a cargo do órgão estadual, o IMASUL que, a partir
de Campo Grande, procede às liberações e licenças para a implantação desses empreendimentos.
No caso de projetos localizados na
região periurbana dos municípios, a legislação do Estado de Mato Grosso do Sul,
há muito segue as determinações ainda vigentes da Resolução
nº 30/1982, de 26 de abril de 1982, que permite a instalação de criadouros de
suínos somente a uma distância mínima de 1000 metros do perímetro urbano do município.
A legislação municipal de
Brasilândia por sua vez também dispõe sobre essa proibição (art. 177 da Lei 399/1985, Código de Postura),
ratificando este limite através do art.
25 da Lei 2211/2007, de 1º de novembro de 2007 que trata do Controle de Zoonoses, detalhando
que esta proibição também se estende às concentrações
residenciais de vilas e povoados.
Ora, durante os estudos para a
implantação de um empreendimento desta magnitude e importância é imprescindível
que haja a participação da Secretaria de Desenvolvimento e Conselho de Meio
Ambiente do local, pois o órgão estadual que libera esses empreendimentos nem
sempre tem o conhecimento necessário sobre a realidade onde está sendo
implantada tal atividade. Senão vejamos:
A construção do empreendimento que
está sendo questionado pelos moradores do reassentamento Novo Porto João André,
localiza-se uma região que envolve dois núcleos habitacionais, um deles, numa
distância muito inferior aos 1000 metros facultados pela legislação para a
criação de animais ungulados. Se pelo aspecto demográfico e social é visível
que o lugar encontra-se habitado por mais de 300 famílias, pelo aspecto jurídico
e legal, igualmente, é passivo que o local possui status de estrutura urbana. O que torna a criação de suínos no entorno destes
loteamentos uma afronta à legislação depondo contra a incolumidade pública.
O reassentamento, denominado a
partir de então Loteamento Novo Porto
João André foi declarado área urbana por força do Decreto nº 4788/2018, de 5 de outubro de 2018. Já o outro lindeiro
próximo ao empreendimento, o Loteamento
Urbano Beleza do Rio Verde, criado em 2008, ali foi instalado graças à
expansão urbana que o município se submeteu, por força do Decreto 2180/2007, de 16 de maio de 2007, e que transformou aquela
região igualmente em área urbana.
Diante disso, a manifestação dos
moradores do Loteamento Novo Porto João
André, em que pese possa ser entendida como desafiadora aos órgãos
instituídos, não deixa de ser uma justa demonstração de descontentamento daqueles
moradores pelo fato de não terem sidos consultados antes do início das obras,
que segundo consta, já se encontram adiantadas.
Em que pese possa a reação sonora
daquela comunidade ser entendida (e instrumentalizada) como um grito contra a
suinocultura, sob-hipótese alguma, isso assim pode ser entendido, uma vez que o
dedo em riste dos manifestantes notadamente aponta firme, sim, contra os atos
administrativos praticados pelo IMASUL e não contra esta atividade geradora de emprego e renda para Brasilândia.
Mas, como tudo no Brasil, pela
absoluta incapacidade do poder público se articular entre si e fomentar o diálogo com a sociedade civil, esse será mais um caso que irá para os
braços do Ministério Público, outra vez transformado, como de praxe, em senhor das causas primeiras ou das razões últimas.
Brasilândia/MS, 31 de julho de 2019.
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