sexta-feira, 31 de março de 2023

 

Edilson Fernandes Lopes, meu amigo Fera, adeus.

Carlos Alberto dos Santos Dutra


 


A história do nosso país é construída de migrantes que cruzam o Brasil, de Norte a Sul, e do Centro Oeste ao Sudeste. Homens e mulheres  que deixam sua terra natal para buscar a sorte, emprego e felicidade.

Aquela família era uma delas. Foi quando os olhos do pequeno Edilson Fernandes Lopes se abriram lá na distante Caetité, no alto sertão do estado da Bahia, no dia 8 de maio de 1960.

Tinha a honra de nascer na mesma terra que sua mãe -- dona Yeda Dolores Fernandes Lopes --, havia nascido e para onde voltara, depois de ter casado com Ataíde Lopes na vizinha Panorama/SP, cinco anos antes. Para a alegria dos avós maternos, Amphilóphio Fernandes da Silva e Laudemira Gomes Moraes Fernandes, o menino e seus irmãos cresciam fortes e saudáveis.

Para quem vem do Nordeste, parada obrigatória, quando não definitiva, é São Paulo. E lá se encontrava o jovem Edilson em sua adolescência e juventude, bebendo e provando os apelos luminosos e perigos de uma metrópole, verdadeira terra das oportunidades. A procura do sucesso, entretanto, nem sempre é igual e acessível a todos, exigindo esforço sobre-humano para vencer os desafios e exigências do cotidiano de uma grande cidade.

É, mas a história do menino Adilson estava apenas começando. Envolvido com certas amizades da noite paulistana, no ano de 1986, uma fatalidade o joga no rol dos proscritos sendo obrigado a deixar sua São Paulo passando a ser hóspede temporário de um estabelecimento prisional.

Sentença injusta, um mês após, resiliente, intenta fuga, passando desde então a viver na clandestinidade. Com o passar dos anos, estabelecido em Brasilândia, revelou-se exímio mecânico, depois funileiro. 

Homem irreverente e que sempre disse o que pensava a todos; não era de bajular engravatados, tendo também um bom coração. Era capaz de tirar a roupa do corpo para ajudar um irmão que lhe cruzasse o caminho.

Avizinhei-me dele no antigo bairro Cohab, hoje Tomaz de Almeida, nascendo uma amizade sólida e verdadeira. Sempre visitados por clientes e amigos, nunca deixou de colocar sobre a brasa um pedaço de carne ou um peixe que estava sempre à espera do recém-chegado ao lado da cerveja. E para aqueles que o conheciam-na essência e intimidade também lhes era ofertado graciosamente o que também procuravam.

Por seus predicados e humanidade, convidei-o para ser meu padrinho de casamento religioso em cerimônia reservada que ocorreu na igreja matriz da Paróquia Cristo Bom Pastor sacramento presidido pelo Pe. Lauri Vital Bósio.

Consolidou-se, assim, uma amizade e sintonia que me permitiu no ano 2008, já como advogado, depois de várias tentativas promovidas por terceiros, de conseguir, via judicial, liberá-lo do pesado encargo que o impediu por 22 anos de poder exercer sua cidadania plena, tirar documentos e não ter que se esquivar todas às vezes de blitz policial nas estradas.

Decisão que desde 2003 já existia e que o amigo Fera desconhecia que rezava: --Declarada extinta a pena imposta ao réu, por ter o Estado decaído do direito de executá-la (Prescrição). E, assim, foi possível entregar tal carta de alforria em mãos para que sua alegria fosse perfeita e abrisse as portas de seu coração para o seu futuro.

Pouco tempo depois, lá estava ele em Campo Grande, com sua empresa aberta, com CNPJ e tudo, prestando serviços de artesanato, o que fez por vários anos. Depois, estabelecendo-se no estado do Paraná, abre uma empresa de modulados de madeira onde revela todo o seu lado criativo e artístico, despontando ali um futuro promissor.

Sim, deixava para trás o amigo Fera, os velhos tempos de isolamento social, do refúgio nas músicas de Janis Joplin e Raul Seixas, eternos, onde o enfrentamento ao preconceito sempre falava mais alto e alimentou sua autoestima por anos. 

Quantas vezes apresentou-se no portão de minha casa, com uma trouxa de roupa nas costas dizendo que ia embora e que não dava mais para aguentar a pressão. Depois de uma longa conversa e um abraço, conseguíamos dissuadi-lo de tal ideia e recomeçar.

Foi neste tempo, no ano de 2000, que a poesia “Eis o Homem” foi redigida em sua homenagem tendo sido publicada em jornais e livros. Sua reprodução aqui, na data de seu passamento, é uma singela lembrança que perpassa também o coração das filhas Daniele e Eliene, irmãos, mãe, sobrinhos, e todos os amigos que nutriam estima e amor por ele:

"O rosto ainda traz o brilho da juventude que não o deixou de todo. Irreverente e símbolo de 'problema', arrebata as angústias e sensibiliza-se com a flor.

Poeta excluído, bebe as dores e contradições intestinas do mundo. 

Dedicado ao trabalho, curte as sobras que a vida lhe proporcionou. 

Transforma-se em “fera” para sobreviver. Pisam-lhe o rosto com ares de caridade. Roubam-lhe os sonhos e o sustento da família. Hostilizam sua fé e debocham de sua sorte. 

Consciente e sereno, entretanto, rompe com a vida normal e se lança ao espaço. Em asas de liberdade, voa mais longe que a morte e saboreia resignado fragrâncias de cumplicidade.

Causa admiração este homem que há tempo já devia ter deixado de ser, o resto que lhes permitiram. 

Causa admiração este homem que não sendo pária, junta-se à massa e a pinta em cores de horizonte, para além de muitas noites. 

Causa admiração sua coragem de sorrir e acreditar no amanhã. 

Mesmo que lhe não lhe estendam a mão, mesmo que lhe neguem o pão. Mesmo que lhe digam não!"

Descanse em paz amigo, irmão e compadre, nosso guerreiro Fera.

Brasilândia/MS, 31 de março de 2023.



quarta-feira, 22 de março de 2023

 

Os cientistas do amanhã diante de nossos olhos.

Carlos Alberto dos Santos Dutra.



Dizem que escrever é que nem se coçar. Depois que começa é impossível parar. Mas como ficar calado diante de tanta coisa acontecendo a nossa volta? Quantas coisas maravilhosas e edificantes diante dos nossos olhos enquanto muitos continuam presos à intrigas que só alimentam o desânimo e o descrédito no ser humano?

Pois é contra essa ideologia da desesperança, de só levar vantagem e só ver o lado negativo das coisas, que as letras do articulista se rebelam e insistem em saltar do teclado espraiando sua verve no papel como se fosse uma prancha de surf avançando em direção ao imenso mar azul que ainda cobre as fibras de nossos corações de marinheiros.

A noite do dia 28 de novembro daquele ano de 2014 prometia ser animada. O anfiteatro do Centro Cultural Senador Ramez Tebet logo se tornou pequeno para o evento. Pais e filhos, professores e monitores da Biblioteca SESI Indústria do Conhecimento nesta noite presenciaram algo inédito em Brasilândia. Acontecia neste dia um encontro histórico entre o presente e o futuro, encontro digno de dar inveja à National Aeronautics and Space Administration-NASA.

O evento, uma simples entrega de certificados, diplomando concluintes de um curso e uma turma de alunos, aparentemente somava-se a mais uma dessas cerimônias que as autoridades municipais estão cansadas de promover, mormente numa cidade que no último lustro se notabilizou em preparar muito bem sua mão de obra e valorizar o aprendizado profissional e cultural de seus munícipes... adultos.

Mas, na verdade, o que presenciávamos não era mais uma cerimônia, mas a cerimônia, pois estava marcando naquele momento a vida de 68 crianças que cumpriram não um curso qualquer, mas a temporada amarela do Programa Genius Robotic, desenvolvido pela Lego Education, programa dirigido ao público infanto-juvenil focado no desenvolvimento de habilidades, competências, atitudes e valores para a vida, com forte ênfase em liderança e empreendedorismo, com o mérito de alimentar desde cedo as potencialidades das crianças.

Nem sempre valorizamos nossas crianças como elas merecem. Na maioria das vezes as nivelamos por baixo, pelas piores notas, pelos defeitos e pelos erros cometidos. Com raras e honrosas exceções, as promovemos à grandeza, à sabedoria e ao conhecimento. Esse, porém, não é o caso da elite pensante da urbe que lá se encontrava nesta noite memorável. Acima da classe social, etnia ou credo, o que vimos ali foi um espetáculo de conhecimento e grandiloquência. Mais que isso: vimos mãos de crianças manipulando o futuro e o amanhã com os pés firmes no hoje desta terra fundada há 50 anos por Arthur Hoffig.

Nas palavras da secretária municipal de educação da época, professora Floriana Débora de Souza Ladeia, representando o prefeito municipal, Jorge Justino Diogo, os presentes puderam conhecer melhor o programa e adentrar o mundo da tecnologia já vivido e partilhado por aquelas crianças especiais que, todas sorridentes, exibiam com orgulho poder apresentar e ser apresentados a seus pais como futuros cientistas.

Por meio de aventuras robóticas em formato de histórias em quadrinhos e baseadas na metodologia do aprender-fazendo, as crianças e os jovens estão sendo estimulados a resolver situações-problema vivenciadas pelos personagens e a desenvolver soluções criativas e inovadoras para as questões propostas, em síntese disse.

A cerimônia, entretanto, ainda reservou uma agradável surpresa. Algo incomum ocorreu, contrariando o que geralmente acontece em eventos oficias, quando pseudopolíticos se alongam em enfadonhos discursos e arrazoados distantes de tudo e de todos. Foi dada a palavra às crianças que puderam dizer suas impressões sobre o programa e a experiência comum que viveram.

Sem dúvida o ponto alto da festa: ouvir dos beneficiados, sem ensaios e deixando a voz do coração falar mais alto o que essas atividades semanais cercadas de zelo pelas monitoras representaram para suas vidas, seu aprendizado e consciência cidadã. Uma mãe também falou do significado e importância do projeto no aprendizado, resultando mudanças de comportamento e amadurecimento dos filhos, sentimento esse comungado pelos demais pais e educadores.

Também se pronunciou a professora Maria Cristina Alves da Silva, representando as monitoras professoras Benedita Laurinda Cardoso, Vilma Galli Dutra, Leila Datore Schio, Suely Fernandes Costa e a colaboradora Gilda Gomes da Cruz, explicando aos presentes a dinâmica dos encontros e a abrangência do ensino ali ministrado.

Falou que os módulos eram compostos por episódios, conduzidos por meio de uma aventura central e aplicado às turmas, de forma individualizada, por educadores certificados pela Lego Education, que foram capacitados, sendo que as aulas foram desenvolvidas por meio do uso integrado de material de robótica - bloco Lego programável, motores, roldanas, engrenagens e sensores - e dinâmica de aprendizagem com foco no trabalho em equipe, gerando para os alunos uma aprendizagem sólida e significativa de forma lúdica, estimulante e divertida, explicou.

Diante de todos ali se encontrava a elite intelectual de hoje e os cientistas do amanhã de nossa cidade, sendo capacitada nos conceitos tecnológicos por meio de aventuras e construção de robôs, quem diria. Maior felicidade sentiu quando, um a um, foram receber o diploma sendo anunciados pela chefe de cerimônia, a assistente social Dalreny Dourado Junqueira, todos sorrisos. Carinhosos e dando demonstração de afeto e respeito às monitoras, foi lindo vê-los abraçarem-se, indo alguns às lágrimas, tamanha a emoção.

Quando as crianças voltaram para casa, carregando junto de si o pequeno diploma amarelo conferido pela Oficina de Tecnologia Franqueadora Ltda, empresa do grupo Zoom, distribuidor exclusivo da Lego Education no Brasil, certificando a sua participação no programa Genius Robotic, elas não eram apenas a alegria de seus pais e professores.

Mais do que uma ação da FIEMS/SESI de Mato Grosso do Sul que o governo municipal de Brasilândia desenvolveu na cidade, a noite para aquelas famílias representou um momento de fé e  fortalecimento dos laços que os unia, uma espécie de oração, pautada no respeito e admiração a esses pequenos gênios: primeiro passo para que essas crianças com idade entre 7 e 11 anos se engajem no mundo da ciência e da tecnologia, preparando-se para buscar soluções às questões de hoje e do amanhã para o Brasil e a humanidade.


 

Fonte: 



























DUTRA, C.A.S. Diálogos impertinentes e crônicas de adeus, Brasilândia/MS, 2020, pág. 93.


terça-feira, 21 de março de 2023

 

A violência, a infância e as redes sociais.

Carlos Alberto dos Santos Dutra






Hoje, os servidores municipais ao ligarem seus computadores na rede da Prefeitura de Brasilândia se depararam com uma linda imagem em homenagem à memória de Gabi, lembrando da importância de não deixar quem você ama ser a próxima vítima. E conclamando à sociedade a denunciar qualquer forma de violência contra crianças e adolescentes. Sim, a denúncia pode ajudar a salvar e mudar uma vida. 


violência é um fenômeno social que cresceu de forma significativa nos últimos tempos. Em termos gerais a definição e categorização mais utilizada quando se refere à violência é apresentada pela Organização Mundial da Saúde, OMS, que identifica três tipos de violência:

 

A primeira, a violência autoinfligida, que é a violência cometida pelo indivíduo contra si próprio, cujos exemplos são a automutilação e o suicídio; a segunda, a violência comunitária, que é a violência cometida por grupos políticos, sociais ou econômicos, cujos exemplos são as formas de atuação das facções criminosas e os crimes de ódio direcionados a determinados grupos.

 

E a terceira, a mais frequente, que é a violência interpessoal, quando ela é cometida por um ou mais indivíduos contra outro indivíduo, podendo ele ser parte ou não do mesmo círculo social do agressor. São exemplos de violência interpessoal a violência contra a mulher, o feminicídio, o abuso infantil, o abuso ao idoso, os homicídios e os latrocínios. 

Concorre ainda o fato de que, objetivamente, a violência, na maior parte das vezes, vai além da violência física, conduta que ofende a integridade ou saúde corporal do indivíduo. É o caso da violência psicológica, da violência sexual, da violência patrimonial, da violência moral. 

Para o senso comum as causas da violência são sempre de natureza estrutural e sistêmica, tidas como resultantes das profundas desigualdades socioeconômicas, a falta de oportunidades à população mais pobre e a ausência ou inadequação das políticas públicas sociais e de segurança promovidas pelo Estado. 

No mais das vezes busca-se sempre justificar o que é injustificável, encobrindo os fatores e os motivos que os indivíduos têm para serem violentos. A pressão social e os valores que as instituições exercem sobre os cidadãos pouco são mencionados, porém, são essenciais pois apresentam-se como instrumentos que influenciam na exacerbação da violência no cotidiano das pessoas. 

Um dos fatores pouco lembrado que potencializam a violência no Brasil, além da negligência do Estado, o sistema judiciário falho, o aumento da circulação de armas e o tráfico de drogas, é a violência virtual motivada pelo avanço da tecnologia e a velocidade com que as informações circulam diariamente através da internet e nas mídias sociais. 

Segundo Luciana de Rezende Nogueira, as redes sociais, os aplicativos e os sites colocaram a população em outro nível interativo, outra etapa da sociedade contemporânea. Entre as ferramentas que estão ao alcance de qualquer pessoa estão os vídeos ou textos que são lançados nas redes sociais e são capazes de mobilizar pessoas com uma velocidade que nunca se tinha visto ou se podia imaginar antes. 

A pesquisadora lembra que os celulares que antes tinham a função de comunicação via voz, agora com a evolução da tecnologia auferem novas funções e dão às pessoas comuns outras possibilidades como a visibilidade, através de vídeos, fotos ou textos que ganham destaque, como o exemplo de denúncias dos mais diversos tipos de abusos vivenciados pelas pessoas. 

Esse movimento traz à tona um novo tipo de interação com a sociedade, que antes era dominada apenas pelos grandes meios de comunicação como a televisão. Apesar desse novo universo ser útil e facilitador de informações e debates, as redes sociais e outras áreas da comunicação digital têm aberto um novo espaço para a violência, sobretudo contra as crianças, o adolescente e a mulher. 

Realidade que, se não enfrentada com determinação e coragem, só reforça a violência social que vitima o cidadão desde a inocência do mundo infantil, jogando-o irremediavelmente nos braços da transgressão, da pornografia, e do aliciamento ao crime, entre outros. Formas de violência sutis e sorrateiras que pedagogicamente adentram os lares sem a devida atenção dos pais ou responsáveis.

Não é de hoje que os profissionais médicos alertam para o aumento nas queixas que chegam até seus consultórios relacionadas ao uso excessivo de aparelhos eletrônicos, e para a diminuição da capacidade de comunicação, de resolução de problemas e de sociabilidade de crianças até 5 anos.


Todo pai e mãe devia saber que, além do conteúdo não supervisionado que é visto pelo filho, o problema não se limita à primeira infância somente. O contato excessivo com telas mexe com o cérebro de jovens, que ainda não está suficientemente amadurecido para controlar impulsos, fazer julgamentos, manter a atenção e tomar decisões.


Que os celulares são parte da rotina da vasta maioria das pessoas, isso é inconteste. Mas, diante dos riscos e exigências será que é possível ter uma relação mais saudável com a tecnologia? O desafio está em como identificar as situações em que o uso desses dispositivos ultrapassou os limites, especialmente na infância e na adolescência.


Para o psicólogo Thiago Viola, do Instituto do Cérebro do Rio Grande do Sul, a primeira coisa é estabelecer limites. A criança e o adolescente precisam saber que podem entrar na internet por um determinado número de horas por dia.


A recomendação de tempo varia de acordo com a faixa etária. A recomendação da Sociedade Brasileira de Pediatria – SBP é a de que crianças menores de dois anos não tenham nenhum acesso às telas. Dos três aos seis anos, é possível ofertar atividades em dispositivos eletrônicos por 30 minutos a uma hora, sempre com a supervisão de um adulto. E, entre o sexto e o décimo ano de vida, é possível ampliar um pouquinho esse limite, desde que exista um acompanhamento de alguém responsável.


Ademais, é muito importante mesclar as atividades online com outros momentos de lazer, brincadeiras e conversas presenciais entre familiares e amigos, recomenda o psicólogo. Isso porque existem formas de identificar e tratar os quadros de vício no uso de celular e outros dispositivos eletrônicos:


A primeira coisa é observar se a prática está prejudicando algum aspecto da vida daquele indivíduo. Se ele apresenta dificuldades nos âmbitos social, profissional, educacional ou familiar, é necessário buscar a avaliação de um profissional de saúde, orienta o médico Rodrigo Machado, do Ambulatório Integrado dos Transtornos do Impulso do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo.


Se os pais percebem que seus filhos têm queda no rendimento escolar, estão substituindo o dia pela noite, não participam das refeições e faltam à rotina estabelecida na casa, ele deve passar a observar mais de perto a relação de seus filhos com o celular ou o computador. Para os casos em que há diagnóstico de um transtorno, é possível intervir por meio da terapia cognitivo-comportamental, uma abordagem da psicologia que busca analisar, racionalizar e propor intervenções nos hábitos e nos pensamentos do paciente.


Por fim um alerta: nesse contexto, a primeira intervenção é se desconectar aos poucos. De nada adianta castigar ou tirar o celular da criança ou do adolescente de forma brusca e definitiva, aponta a médica Evelyn Eisenstein, que coordena o Grupo de Trabalho em Saúde Digital da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). E conclui: E, claro, esse ato de se desconectar da internet precisa envolver todos os integrantes da família, não apenas os jovens, destaca a pediatra.


Em síntese, a precaução dos pais com o uso do celular e das redes sociais pelos filhos é também uma forma de proteger as crianças e adolescentes contra a violência virtual no universo cruel que vivemos. Eventos do tipo Gabi Vive, celebrando o Dia Municipal de Combate à Violência Infantil são bem-vindos e motivo de aplauso para a conscientização de nossa cidade. Em que pese as crianças e jovens terem acesso franco e livre a todo o conteúdo e informação possível através da internet, muito de vigilância parental ainda precisa ser posto em prática.


Conscientização urgente e necessária capaz alargar os horizontes da parca formação crítica da população, permitindo aos pais e responsáveis se antecipar ao risco de ver seus filhos sofrerem ou virem a praticar algum tipo de violência motivada por sabe lá quem. Mesmo a violência daquelas imagens aparentemente ingênuas e diálogos banais velados que somente aqueles olhinhos inocentes trancados no quarto entendem e teimam em contemplar... 

Brasilândia/MS, 21 de março de 2023.


Fonte: https://www.preparaenem.com/geografia/violencia-no-brasil.htm#:~:text=As%20causas%20da%20viol%C3%AAncia%20s%C3%A3o,de%20seguran%C3%A7a%20promovidas%20pelo%20Estado., acesso em 21.03.2023. 

https://www.ibes.med.br/7-estrategia-para-acabar-com-violencia-contra-criancas-e-adolescentes/ acesso em 21.03.2023. 

http://ihs.sites.uff.br/wp-content/uploads/sites/47/2019/08/MIDIAS-SOCIAIS-porta-de-entrada-para-violencia-contra-mulher-de-LucianaRezende.pdf acesso em 21.03.2023. 

https://www.bbc.com/portuguese/geral-60853962 acesso em 21.03.2023.

segunda-feira, 20 de março de 2023

O Cerco de Jericó e o novo Magnificat que necessitamos.
Carlos Alberto dos Santos Dutra



A Paróquia Cristo Bom Pastor iniciou nesta semana com muita devoção o chamado Cerco de Jericó que é uma celebração não litúrgica, mas que tem embasamento bíblico e origem na Igreja Católica. A exemplo do que ocorre em diversas partes do mundo, os fiéis dedicam uma semana de intensa oração, missa diária, adoração ao Santíssimo, confissão, jejum, pregação da Palavra de Deus e o terço de Nossa Senhora; cada comunidade a seu modo e possibilidade.
 
Mas, o que é o Cerco de Jericó? Qual é a sua fundamentação bíblica? Sua prática de configuração carismática pentecostal nos aproxima mais da Igreja? Qual é o seu valor para a superação dos problemas pessoais, familiares, econômicos, enfermidades, dependências químicas, influências de demônios, etc.? O que essa devoção desperta em cada um de nós?
 
Movidos pela fé interior, na verdade, os fiéis são motivados, num sentido figurado, a derrubar as muralhas de um Jericó que hoje são os seus maiores dramas, limites e sofrimentos. E o fazem a partir de uma pequena porta de Luz que se abre e lhes oportuniza realizar uma experiência religiosa íntima, profunda e existencial de fé.
 
De certa forma aproxima os fiéis de uma Igreja que, aos poucos, se tornou distante, com liturgias formais, sermões moralistas e uma linguagem inacessível, incapaz de dialogar com os simples e com elementos do cotidiano.
 
E isso tudo é alcançado, quando se revisita o Antigo Testamento, pelas palavras do jovem Josué (6,1ss), que foi formado por Moisés desde sua juventude para substituí-lo, e que deu continuidade à tomada de posse da terra prometida, recebendo a autoridade espiritual e o governo sobre as tribos de Israel. Esse é o objetivo do Cerco de Jericó: derrubar as muralhas do pecado pela força do Santíssimo e da Oração.
 
É com essa intenção que o evento iniciado lá na Polônia, organizado por fiéis piedosos daquele país, e que recebeu o nome de Cerco de Jericó propagou-se. Em fins de novembro de 1978, sete semanas depois do Conclave que havia eleito João Paulo II, lá encontrava-se o peregrino, movido pela força do Espírito Santo, semeando na sua própria terra, a Oração e o Santo Terço, como força capaz de remover a discórdia, a divisão e o pecado no mundo.
 
Estava li o sentido maior do Cerco de Jericó: prostrar-se no silêncio fecundo diante do Senhor Eucarístico, que semeia luz às almas e quebra os alicerces das muralhas que nos afastam de Deus e dos irmãos. Essas são as curas e libertações que os fiéis esperam: portas que estavam fechadas se abrem, crises conjugais e econômicas, doenças, e tantos outros problemas são colocados aos pés do Santíssimo, implorando a sua Misericórdia.
 
A Paróquia Cristo Bom Pastor, sem dúvida, vive e sente nestes dias o poder de Deus derramando o seu Santo Espírito sobre os católicos e a todos aqueles que se encontram distantes e se sentem chamados a participar dos Sacramentos, da Palavra e da vida comunitária, que cresce e se multiplica no coração de cada um, verdadeira benção que transforma vidas.
 
Quando chegamos ao ponto de falar: Agora só Deus! Se não for o Senhor nesta situação, é impossível prosseguir! Está na hora de voltar a conversar com Deus. Como bem lembrou o padre João Marcos Polak, nesta hora precisamos sair do superficial para mergulharmos em uma maior intimidade com Deus.
 
Porém alerta: o caminho não é fácil, pois fácil é ir para baixo, para o abismo. Uma vida de facilidade é uma vida sem objetivos e sem virtudes. O homem só se torna virtuoso renunciando a si mesmo e aos seus vícios, focando no chamado e na missão que Deus lhe confiou.
 
Segundo este padre da Canção Nova, o céu é para gente forte, guerreira, ‘teimosa’ consigo mesma, persistente e confiante na Misericórdia do Senhor. O medíocre vai viver na média, se contenta com pouco, vive em cima do muro e reclama de tudo.
 
Em que pese a procura exacerbada do aspecto curativo e contemplativo da Religião, esquecendo o principal – a dimensão profética a serviço da vida e da justiça – possa levar a constituir um caminho de subjetiva alienação, o Cerco de Jericó e a Adoração ao Santíssimo, se realizam em unidade com a Igreja.

Sobremaneira quando seguido da Celebração Eucarística, expressão do Corpo místico de Cristo que é a Igreja e seu Magistério. Precaução e vivência, sem dúvida, que impede o risco de que Deus seja transformado em mero objeto de desejos pessoais. Em suma, evoca o novo Magnificat que o mundo cristão de hoje necessita e é chamado a proclamar.

Brasilândia/MS, 20 de março de 2013.
 
 
 
Fonte: 


https://www.vidapastoral.com.br/edicao/o-cerco-de-jerico-uma-critica/, Publicado em setembro – outubro de 2017 - ano 58 - número 317.
 


sábado, 11 de março de 2023

  

O povo Ofaié e a manjedoura de seu renascimento.

Carlos Alberto dos Santos Dutra


Francisco Rodrigues Xehitâ-ha, líder Ofaié e o diretor de Meio Ambiente da Cesp, Fernando Ferreira Camargo (Foto: Arquivo Dutra, 1994).

Duas datas podem ser lembradas no dia 11 de março. A primeira é a data da criação e instalação da Comarca de Brasilândia (criada pela Lei nº 664/86, instalada no dia 11 de março de 1987), e que abrangia na época a jurisdição dos municípios de Brasilândia e Santa Rita do Pardo. Um marco para o amadurecimento jurídico desta região. 

A outra data na qual nos debruçamos sobre o seu significado maior, é a da transferência da comunidade indígena Ofaié para o seu território imemorial que ocorreu dez anos depois, em 11 de março de 1996 e que garantiu aos primi ocupandi finalmente um pedaço de suas terras ancestrais. Igualmente um marco para o reconhecimento ontológico desta comunidade. 

Jogados de um lado para o outro, desde quando estas terras e seus rios passaram a ser visitados pelos bandeirantes, monções paulistas, linhas telegráficas, postos de atrações, fortes militares, missões religiosas, bugreiros e suas batidas chamadas dadas, e grandes extensões de fazendas..., este povo indígena não sucumbiu. 

Razões de sobra os Ofaié têm para comemorar o dia em que pisaram num cadinho de terra e puderam dizer em alto e bom som, aos quatro ventos: Esta terra tem dono!, como profetizou Sepé Tiaraju em 1753. Depois de muita luta iniciada após o retorno do desterro que a manteve distante por longos oito anos na serra da Bodoquena, eles estavam de volta no centro da história. 

Uma rápida digressão história e lá podemos ouvir um telefonema, no dia 13 de abril de 1994, com informações ainda imprecisas, mas que davam a entender que o líder indígena Ataíde Francisco Rodrigues, o Cacique Xehitâ-ha Ofaié deveria estar presente em Campo Grande no dia 18, onde haveria de acontecer a assinatura de um convênio entre Funai e a concessionária elétrica Cesp. 

A informação vinha da cidade de Presidente Epitácio/SP, de um dos escritórios da Cesp. O Cimi Regional de Campo Grande logo telefona para Brasilândia/MS confirmando a notícia. Rapidamente entramos em contato com Xehitâ-ha, levando a notícia em direção à barranca do rio Paraná, para o assimilar lento da aldeia instalada nas imediações da fazenda Cisalpina. 

Últimos preparativos para a viagem, um carro da Cesp vem buscá-lo e lá está o líder Ofaié sentado à mesa assinando um acordo tido por muitos como  impossível de se realizar. No dia 18 de abril de 1994, portanto, véspera das comemorações do Dia do Índio, em Campo Grande/MS, na sede da Secretaria Estadual de Meio Ambiente, Ataíde Francisco Rodrigues Xehitâ-ha, ao lado do diretor de Meio Ambiente da Cesp, Fernando Ferreira Camargo; do representante da presidência da Funai, Sérgio Moscoso, e a secretária de Meio Ambiente do Estado de Mato Grosso do Sul, Emiko Kawakami de Resende, devolve aos Ofaié sua esperança. 

Foi quando ficou garantido a esta comunidade indígena as condições mínimas para reagruparem-se numa área contígua à Terra Indígena Ofaié Xavante, declarada pela Funai como de posse permanente indígena para efeitos de demarcação (Portaria 264, de 28 de maio de 1992), colocando os últimos caçadores e coletores de Mato Grosso do Sul praticamente dentro de seu antigo território, de onde foram retirados em 1978. 

Passados dois anos, e lá se encontrava a comunidade naquele dia 11 de março de 1996, reunindo entre os seus pertences, todos seus esforços e esperança de retornar a manjedoura de seu antigo território. Chão que seus pais e patrícios conquistaram e fizeram a pé, através de trilheiros, encurtando distância entre os campos e cerrados da Brazil Land Cattle and Packing Company, que aos poucos foram sendo tomados e transformados em sítios e fazendas. 

O olhar, aos poucos vai se distanciando dos palmitos e bacuris. A poeira da estrada agora toma o lugar da suavidade dos rios Verde e Paraná que vai ficando para trás. Ao longe, o rumor das águas da futura hidrelétrica Porto Primavera prenunciava o temporal de uma inundação que a todos atingiria e não tardaria a chegar. E lá se foram os caminhões carregando a mudança dos Ofaié e junto deles suas parcas lembranças. 

A data 11 de março, neste ano celebrada, passados 27 anos de sua origem, representa a vitória de um povo que nunca desistiu, sobretudo os mais antigos que dedicaram a vida por um sonho: o de retornar a sua terra. Antes, porém, tiveram que provar que existiam, tiveram de provar que eram índios e provar que tinham direitos. Foi pelas mãos, sobretudo de um líder, Xehitâ-ha, que este sonho não esmoreceu e se concretizou, depois, ao longo dos anos por meio das demais lideranças que o sucederam. 

Sim, a comunidade indígena Ofaié pode escolher muitas datas para festejar as suas vitórias que foram diárias durante o longo itinerário que empreenderam desde 1986, quando retornaram para sua terra natal. A memória dos que sedimentaram esta estrada é a força e o alimento das novas gerações que permanecem firmes valorizando a cultura e o brio que lhes garante a coragem dos novos rostos para seguir em frente. 

Parabéns Povo Ofaié. Feliz Dia do Retorno a Manjedoura do vosso Renascimento nas margens do Córrego Sete para além do amanhã.

Brasilândia/MS, 11 de março de 2023.

sexta-feira, 10 de março de 2023

 

A Feira da Lua, os Produtores e a Cultura

Carlos Alberto dos Santos Dutra


Feira do Artesanato na Praça da Pedra em Brasilândia em 2004 (Foto: Arquivo Jair Bezerra Xavier, 2015).


Existem binômios que são sempre estimulantes: feira e artesanato; feira e viola; feira e empreendimento; feira e literatura; feira e esporte. Isso porque Feira é sempre  manifestação de Cultura, espaço residual de liberdade e criatividade do povo e dos amantes da arte que se expressa na música, na dança, no teatro, no artesanato, nas artes plásticas, entre outras obras e produtos confeccionados com todo o primor pelos moradores de um lugar. 

Aqui em Brasilândia não seria diferente. Desde muito cedo suas instituições e poder público dedicaram especial atenção para as manifestações culturais de sua gente, acolhendo-as e promovendo-as. Seja pela beleza e originalidade das coisas da terra produzidas, seja pelo elo de comunicação criado entre os governantes e o povo, ainda de configuração rural. 

Um dos primeiros eventos dessa natureza que se tem notícia foi a 1ª Feira Verde Arte de Brasilândia, realizada entre os dias 20 e 22 de outubro de 1989 sob a coordenação do CODECOMB (Conselho de Desenvolvimento Comunitário de Brasilândia), e aconteceu nas dependências da quadra de esportes da Escola Municipal Arthur Höffig. 

Foi uma das primeiras exposições culturais que aconteceu na cidade, onde os munícipes tiveram a oportunidade de expor sua produção artesanal. Cada entidade na época montou sua barraca com o apoio da administração municipal garantindo a participação de associações, grupos de artesãos, apresentações musicais e produtores rurais. 

Ponto alto do evento na época, sob o aspecto cultural, foi a participação de integrantes da comunidade indígena Ofaié que ainda era novidade para muitos dos brasilandenses que somente aos poucos passava a identifica-los como detentores de uma cultura própria digna de ser apreciada. Foi-lhes reservada uma barraca e onde integrantes deste povo expôs seus produtos, basicamente arcos, flechas e colares, aos visitantes. 

Passados 33 anos deste acontecimento, o fato ainda é lembrado por quem viveu nesta época. E lá estavam os alunos das escolas do município sentados no chão, em frente dos indígenas que fabricavam ali mesmo, na frente dos visitantes, seus artefatos, numa ação pedagógica impar para aqueles tempos. 

Sobre esse evento, na época, a equipe do professor José Cândido da Silva, que era o prefeito, chegou a filmar em VHS as atividades ali realizadas, porém, a ação do tempo e o desleixo das administrações públicas com a memória e patrimônio cultural é inexorável, e este material se extraviou, perdendo Brasilândia um dado de sua história consubstanciada na figura dos pioneiros artesões Eduardinho Cri-í, Aparecida Hanto-grê, Pereirinha He-í, e o jovem João Carlos Canrê, hoje todos in memoriam, que se fizeram presentes naquela que foi, senão, a primeira grande feira cultural realizada no município. 

Mas estava lançada a semente. Seis anos após, eis que o então vereador Jaime Assis de Alencar, popular Jaime Doce propõe a criação de uma Feira Livre no município. Embora a preocupação inicial fosse o barateamento dos alimentos para a população, ela carregava no ventre a ideia que, anos mais tarde, seria concretizada. 

De fato. A indicação apresentada em 1995 propunha a implantação de uma Feira Livre aos domingos para a população ter alimento mais barato. Iniciativa que deveria ser estendida também ao distrito Debrasa. A ideia foi tão bem aceita na época, que chegou a ser anunciada pela administração com o Povo no Poder, sob o título de 1ª Feira Livre do Produtor de Brasilândia. 

A concretização da iniciativa, entretanto, teve o reforço de duas importantes proposições apresentadas pelo Legislativo municipal. A primeira, pelo vereador Irineu de Souza Brito, no ano de 1997, que sugeriu para o evento um nome original e criativo: Feira da Lua em razão de ser realizada a noite e que deveria funcionar aos sábados. E a segunda proposição, dois anos depois, da lavra do vereador Marcos Roberto Lopes, popular Beto da Maurimar, então presidente da Câmara, que reforçou o pedido anterior do colega. 

Foi, contudo, com o surgimento dos Reassentamentos Santana, Santa Emília e Pedra Bonita, em 1999, que a ideia da Feira Livre tomou impulso e vigor. Desejo revigorado com o aumento de produtores de hortifrutigranjeiros no município em busca de local para venderem os seus produtos, o que foi decisivo para a implantação da Feira. 

A inauguração oficial da Feira Livre do Produtor Rural de Brasilândia deu-se no dia 8 de fevereiro de 2000, na localidade conhecida como Praça da Pedra (Praça José Pinto Nunes). Cinco anos depois, a Secretaria Municipal de Agricultura, sob a coordenação do secretário José Carlos Dela Bandera, consolidou a Feira Livre do Produtor como política pública, passando a também fazer parte das comemorações de aniversário do município. 

Com o tempo, em consequência das dificuldades e oscilação inerentes aos ciclos sazonais da agricultura, a participação dos pequenos produtores rurais na Feira foi diminuindo, sendo substituída a oferta de produtos diversificados e comercializados por entidades filantrópicas e por empresários do próprio comércio local. Permaneceu, entretanto, o viés cultural e de abertura de espaço para as manifestações artísticas do povo brasilandense que passou cada vez mais a ser incentivado. 

Não obstante, estava materializado o destino da Feira como espaço de promoção do que o município melhor produzia: hortifrutigranjeiros, alimentação, artesanato e arte musical. Depois, com o nome de Feira e Viola que vigora até hoje, já a partir de sua 2ª edição realizada em  2013 estava garantido aquele espaço destinado a levar diversão e entretenimento aos brasilandenses (...). Este é o nosso objetivo: valorizar o que tem de melhor em Brasilândia, ressaltou o prefeito, na época. 

A partir de então seguiram a cada semana novas edições do Feira e Viola, evento que reunia centenas de pessoas sob o comando do radialista Ceará Santos, e sempre apresentando diversas atrações musicais da cidade e da região. A partir de 2014, o evento passou a ser realizado também no Bairro João Paulo da Silva (Praça Ostelino Cardoso) nas quartas-feiras, permanecendo na Praça da Pedra aos sábados, sempre conciliando produtores rurais e os talentos artísticos da cidade e região (...). 

..........

Fonte: História e Memória de Brasilândia, Volume II-Patrimônio, página 36-37;  Volume III-Cidadania, página 102; Volume IV-Desenvolvimento, página 320.

  










Feira do Artesanato na Praça da Pedra em Brasilândia em 2004 (Foto: Arquivo Jair Bezerra Xavier, 2015).

sexta-feira, 3 de março de 2023

 

A Biblioteca, o Livro e o Conhecimento.

Carlos Alberto dos Santos Dutra



Tudo começou no ano de 2013 em São Paulo com uma ideia inspirada no conceito de BookCrossing, criado nos EUA no começo dos anos 2000 e buscava combinar leitura e urbanidade. Trata-se do projeto Esqueça um livro e espalhe conhecimento, que, preferencialmente, passou a ser comemorado no Dia do Escritor, 25 de julho.

A ideia, nos informa a amiga Yuri, consiste em esquecer, de propósito, um livro em algum lugar: no restaurante, no ponto de ônibus, num banco da praça, no mercado, consultório médico; a escolha é livre.

O doador ainda pode deixar no interior do livro um bilhetinho explicando o projeto e o presente. Tipo, assim: Ei, você que achou este livro. Agora ele é SEU. Que tal LER esse livro e depois incentivar que outra pessoa faça o mesmo?

A iniciativa faz parte de um projeto de incentivo à leitura e compartilhamento de conhecimento que está sendo utilizado, principalmente, nos grandes centros urbanos onde o corre-corre é maior e quase não se tem mais tempo de frequentar uma biblioteca e muito menos adquirir um livro em alguma livraria.

Cá na nossa pequenina Brasilândia, felizmente ainda nos sobra tempo de frequentar a Biblioteca Pública instalada no centro da cidade. O prédio do Centro Cultural Ramez Tebet configura um marco e esteio da cultura local, o que nos enche a todos de orgulho observar que a Biblioteca e a Casa da Cultura ainda resistem, desafiando o obscurantismo que por vezes ronda a todos.

Tal fato nos faz retroceder no tempo quando lá encontrávamos entre as estantes de livros, duas servidoras públicas animadas desempenhando o ofício de bibliotecárias, conferindo o cutter dos livros e fichas catalográficas das novas obras que chegavam à Biblioteca Municipal Profª. Abadia dos Santos. Tratava-se das professoras Vicentina de Jesus Coutinho e Vilma Galli Dutra.

Há 10 anos, a internet ainda não havia assumido o controle total sobre nossas vidas e as buscas bibliográficas ainda brotavam do papel; tampouco o celular havia se popularizado a ponto de se tornar indispensável à nossa sobrevivência e informação. Ir a Biblioteca Pública permanecia sendo um hábito salutar incentivado pelos professores das redes municipal e estadual de ensino de Brasilândia.

A efervescência cultural e a demanda era tanta que a Biblioteca, na época, teve de ampliar o horário de atendimento os leitores. Não somente alunos em busca de obras indicadas pelos currículos escolares, uma vez que as escolas também possuíam suas bibliotecas prático-pedagógicas. Mas também a população em geral valia-se daquele acervo para ampliar seus conhecimentos, dedicando-se à leitura de obras de alcance universal.

A Biblioteca passou a funcionar das 7 horas da manhã às 22 horas da noite, de segunda à quinta-feira, quando eram disponibilizados os 10.299 livros do acervo que a instituição possuía na época, sobre os mais variados temas desde a ficção dos poemas, contos e crônicas, até o mundo da filosofia, história, geografia e obras da literatura encartadas em enciclopédias, livros e revistas.

Segundo as professoras que prestavam atendimento na Biblioteca o horário noturno foi mais que aprovado pelos frequentadores que passaram a contar com a comodidade de poderem acessar obras literárias e pesquisas escolares, fora do horário de trabalho.

Animadas com a receptividade, as professoras montaram painéis de fotografias registrando a presença dos leitores naquele espaço de saber. Painéis que permanecem até hoje, sendo constantemente atualizados pelos novos professores e bibliotecários que ao longo dos anos revezaram-se na tarefa de incentivadores da leitura.

Num antigo site da Biblioteca, no Facebook ainda é possível conferir a alegria de dezenas de leitores reunidos naquele espaço, desde rostos muito jovens e olhinhos brilhantes debruçados sobre desenhos infantis, até rostos já marcados pela idade cujo olhar e pensamento buscam descobrir os mistérios da vida e do mundo que os rodeia, seja na simples arte de viver, seja no crescimento pessoal e profissional.

A Biblioteca Pública de Brasilândia, desta forma, assume papel importante na democratização do acesso à cultura e à informação, tendo sua vocação e olhar voltados para a comunidade contribuindo na preservação de sua memória, sua produção material e intelectual e seu acervo. O que em última instância reforça o valor e a autoestima de sua gente.

Enquanto a Biblioteca Escolar cada vez mais volta os olhos, por força de seus currículos, para as novas tecnologias e demandas da sociedade, que exige célere o acesso à informação de forma ágil e digital, as Bibliotecas Públicas e os livros impressos representam a última trincheira do conhecimento palpável acumulado, despacito, que explicam e constroem perene o patrimônio dessas comunidade.

Temos visto muitas Bibliotecas Públicas municipais fechando suas portas ou então sendo acomodadas em espaços cada vez mais diminutos e precários, como se já fosse dispensável sua utilidade e importância. Felizmente Brasilândia ainda se mantém firme no propósito de continuar semeando ao vento, através dos livros, o alimento do saber com gosto de ver saltar do papel as letras que transformam homens e mulheres em cidadãos e cidadãs que o futuro espera para nossa cidade. Parabéns Biblioteca Municipal Profª. Abadia dos Santos!

.

Fonte: https://portalregional.net.br/2013/10/biblioteca-municipal-professora-abadia-dos-santos-amplia-horario-para-atender-leitores/?amp, 30 de outubro de 2013.

https://www.educamaisbrasil.com.br/educacao/noticias/campanha-esqueca-um-livro-e-espalhe-conhecimento-incentiva-a-leitura-em-todo-pais, 25 de julho de 2018.