segunda-feira, 26 de junho de 2023

João Batista Marques, o tempo e a história

Carlos Alberto dos Santos Dutra

 


 

Tive a grata satisfação de reencontrar o senhor João Batista Marques, o grande memorialista de nossa vizinha Panorama/SP, cidadão que muito sabe, trabalhou e escreveu sobre nossa cidade de Brasilândia/MS, sobretudo a história de seu berço e nascedouro que brotou das margens do rio Paraná, no Porto João André.

 

E lá o encontro em sua residência, sob o peso da idade, em meio a uma centena de livros numa imensa biblioteca que ocupa parte significativa da sala em sua casa, e onde o visitante inesperado pode deitar os olhos sobre a mesa de centro do ambiente e encontrar espalhados ali diversos livros de autoria deste ilustre personagem, e que lhe causa maior alegria e orgulho poder falar sobre cada uma de suas obras.


Depois de tirarmos uma foto com a entrega de um exemplar do 2° volume do livro História e Memória de Brasilândia que lhe ofertei, falo bem próximo ao seu ouvido (pois ele resiste ao uso do aparelho auditivo) e lhe digo que o seu nome faz parte da história de Brasilândia. Ocasião em que recordamos a data em que ele esteve em Brasilândia, no ano de 2012, durante o lançamento do livro O território Ofaié pelos caminhos da história, quando sua presença muito honrou nossa cidade naquele dia 24 de abril.


O texto abaixo é um pequeno registro, porém, de relevância histórica e etnográfica que traduz e assume, igualmente, singela homenagem em vida a este escritor, historiador e memorialista de Panorama/SP: 

“A mão estendida sobre os olhos buscam alcançar a outra margem do rio. Uma leve brisa sobre as ruas empoeiradas do povoado de Panorama, as poucas casas, ainda de madeira, aos poucos vão surgindo no lugar. O ventre da terra ainda guarda na lembrança os indígenas Ofaié, chamados Xavantes que ali viveram até 1930.

João Batista Marques, caminha pelas ruas da cidade, levando nos ombros seus 75 anos de vida e vivências (hoje com 84 anos). Encontro-o na feira, num domingo de sol, vendendo seus livros e falando com o povo. Entretenho-me com ele falando sobre minhas dúvidas e desejo de conhecer um pouco mais sobre a história de João Augusto André, personagem que deu nome ao porto da margem direita do rio Paraná no, hoje, município de Brasilândia, em Mato Grosso do Sul.

Seu recente livro, “E o burgo se moderniza”, publicado pela Editora Jóia, de Dracena/SP em 2011, explica-me que é o terceiro que publica, enquanto faz uma prece silenciosa ao Senhor Deus de todos os deuses agradecendo a graça recebida, isto é, por conseguir terminar este terceiro livro, pela saúde razoável e pelo prazer que tem sentido no viver do dia a dia (...) [1].

E não por acaso, o seu livro que me cai nas mãos, gentilmente doado pelo autor, apresenta no Prólogo as informações que andava buscando. As terras onde hoje se localiza a cidade de Panorama foram inicialmente habitadas pelos índios das tribos Ofaié Xavantes, isto até os anos 1930 do século passado; com a chegada dos brancos à região, ou seja, os ‘civilizados’ que vieram para colonizar estas terras houve muitos conflitos, mas as carabinas papo amarelo manejadas pelos brancos falaram mais alto que os arcos e flechas manejados pelos indígenas [2].

Sabe-se que no ano de 1945, o sr. Quintino de Almeida Maudonnet, empresário de tradicional família campineira, informado por amigos, que a Cia. Paulista de Estradas de Ferro tinha planos de estender os seus trilhos até a divisa do Estado de São Paulo com Mato Grosso, decidiu formar uma sociedade para comprar a Fazenda São Marcos Evangelista com m/m 2,700 alqueires junto ao ribeirão das Marrecas, margeando o Rio Paraná, terras devolutas cuja posse era do Sr. José D´Incáo, farmacêutico em Presidente Wenceslau, Alta Sorocabana.

Sobre esse fato, informa João Batista Marques, que sete anos antes, a tal fazenda chamava-se Fazenda Marrecas e serviu de abrigo à família do Sr. Avelino Bobato, esposa e onze filhos que chegaram à Panorama para trabalhar. A Fazenda Marrecas que pertencia ao Sr. José D’Incáo, nas mãos da Imobiliária Campineira, transformou-se em Fazenda São Marcos Evangelista [3].

O pesquisador, aqui, deseja ir mais à fundo sobre o tal ribeirão das Marrecas. Havia sido informado, por outras fontes, da existência de uma missão capuchinha no lugar e que havia sido responsável pela catequização dos indígenas Ofaié, mencionados no início da colonização de Panorama.  Para isso, entretanto, é preciso retroceder e voltar no tempo cronológico quase meio século. E é o livro do Sr. João Batista Marques que nos confirma e tal informação, tendo-a obtido da boca do Sr. Benedito Felix, nascido em 1903 e que aos 14 anos de idade andou por aqui acompanhando um grupo de pescadores da cidade de Jaú [4].

A foto é de 1914 e mostra a Missão do Ribeirão das Marrecas. Assim conta o citado senhor que veio a falecer no ano de 2000 [e] estava lúcido de memória: Andava alardeando nos bate-papos com os amigos, ter descido o Rio Paraná no ano de 1917 e encontrado na Margem esquerda do Ribeirão das Marrecas, várias tábuas e uma caixa de madeira com pregos já enferrujados. Perguntava ele quem seria que teria passado por aquele local, se pergunta o aprendiz de historiador.

A chegada das Missões Franciscanas em Panorama, quase um século depois deste fato, no ano de 2009, esclarece o mistério guardado pelo rio. Os frades capuchinhos acamparam à margem esquerda da Marreca no ano de 1913, para catequizar um bando de índios Xavante que viviam dispersos pelas matas, e para isso trouxeram  integrantes da tribo da aldeia Ofaié Xavantes, localizada na margem direita do rio Verde, pouco acima do Rio Paraná [5].

Para enriquecer a informação, o autor teve o cuidado de reproduzir uma foto da primeira capela da Missão, e na página 15 a fotografia de um grupo de 18 indígenas Ofaié acompanhados de autoridades (o prefeito de Valinhos, o sr. Joaquim Félix e um tal de velho Paraíba que ciceroneou o grupo na viagem que realizaram na região.

Sobre o aldeamento Ofaié na margem do rio Verde, os missionários capuchinhos mantiveram contato ainda por algum tempo, prestando-lhe, sobretudo assistência à saúde nos casos de maleita que vitimava os indígenas com a ocupação cada vez mais intensa das bordas dos rios Paraná, Verde e Pardo, no então, sul de Mato Grosso. Relacionaram-se, inclusive, com funcionários do Serviço de Proteção aos Índios-SPI e com o etnólogo alemão naturalizado brasileiro Curt Nimuendajú [6].

Um grupo de italianos provindos de Vercelli, terra do arroz na Itália, liderados pelo Sr. Luigi Cantone implantaram a empresa Cisalpina Agrícola S.A., que, em verdadeira quebra de braço com a Cacex, reguladora das importações na época, recebeu o apoio da empresa Panorama S.A., e recebeu um grande número de implementos agrícolas, que mereceu a cobertura da mídia, e atraiu a atenção para a futura cidade (...). Mais gente se deslocou para Panorama ajudando o seu desenvolvimento. Infelizmente a iniciativa do Sr. Luigi Cantone fracassou por culpa das enchentes que alagavam as várzeas de Mato Grosso e as máquinas acabaram imprestáveis [7].

Pessoas como João Batista Marques, aparentemente comuns, podem passar despercebidas, nas praças, nas feiras e ruas da cidade. Guardam, porém, a memória dos dias que vão passando, ou já passaram, e que ainda carecem ser ouvidas e registradas. As páginas dos livros, infelizmente, nem todos observam, mas o carinho, o respeito e a dedicação com que os acontecimentos são retratados e eternizados nas laudas do tempo é motivo de orgulho...”, e merecedor de nossa homenagem.


Brasilândia/MS, 26 de junho de 2023.

  


Da esquerda para a direita: Prof. José de Souza Koi (Cacique Ofaié); Prof. Francisco Aparecido Lins (Secretário Municipal de Educação); Jorge Daniel Silva Oliveira (Vereador Presidente da Câmara); Dr. Antônio de Pádua Thiago (Prefeito Municipal); Carlos Alberto dos Santos Dutra (Escritor); Adilson Aspet (Diretor da Fundação de Cultura de MS); Prof. Dr. Giovani da Silva (Historiador) e João Batista Marques (Escritor convidado e palestrante).




Fonte: https://panoramanoticia.blogspot.com/2014/04/escrito-joao-batista-marques-lanca-seu.html

Publicado em: [1] - Publicado em http://carlitodutra.com/joao-batista-marques-o-tempo-e-a-historia, em 28.Out.2013; http://www.agorams.com.br/jornal/2013/10/joao-batista-marques-o-tempo-e-a-historia-por-carlos-a-s-dutra/, em 29.Out.2013; http://fronteiraagora.com.br/portal/joao-batista-marques-o-tempo-e-a-historia, em 29.Out.2013; http://www.tribunams.com.br/colunista/se-me-deixam-falar/joao-batista-marques-o-tempo-e-a-historia-por-carlito-dutra, em 31.Out.2013; e http://www.jornaldiadia.com.br/news/noticia.php?Id=6277#.UnkSd6BTvow, em 29.Out.2013.

Disponível em: DUTRA, C.A.S. Diálogos Impertinentes e crônicas de adeus. Brasilândia, Edição do Autor, 2020, pág. 102. https://clubedeautores.com.br/livro/dialogos-impertinentes-e-cronicas-de-adeus

 



[1] - Marques, João Batista. E o burgo se moderniza. Dracena/SP, Editora Joia, 2011, p. 205.

[2] - Idem, p. 1.

[3] - Marques, João Batista. E o burgo se moderniza. Dracena/SP, Editora Joia, 2011, p. 1.

[4] - Idem p. 7.

[5] - Idem, p. 7-8.

[6] - Dutra, Carlos Alberto dos Santos. O território Ofaié pelos caminhos da história. Editora Life, Campo Grande/MS, 2011, p. 

domingo, 25 de junho de 2023

 

Diário de Axayray: Indigenismo e Missão entre os Ofaié.

Carlos Alberto dos Santos Dutra


 Num determinado ponto do planeta, mais visível na latitude 21° 14' 54.32’ S  e longitude 52° 7' 59.89’ W apontada pelo gps do Google, o dia corre comum, como qualquer outro na vida daquela pequena comunidade de pele escura e hábitos delicados. Katai[1] ergue os braços em direção à mãe Okuin-rê[2], que olha comprido para o filho e sorri. Ela passa a mão no cabelo levemente ondulado do filho e diz: Angaraí, mas he-tiú[3]. O clima está frio, e a aldeia Anodi vive agora tempos novos, sob uma leve brisa outonal que adentra a porta das casas pela estreita fresta do novo século e milênio que se aproximam. 

Os pés de marolo[4] são festejados pelos Katot[5] que invadem seus galhos em busca de alimento cada vez mais escasso no cerrado brasileiro, devido o avanço da cana-de-açúcar que parece sufocar a vida de qualquer aldeia. Ao longe, o eucalipto também os espreita. Cha-taí[6], um dos poucos não indígenas da aldeia, esposo de Okuin-rê[7], está na roça plantando Kotiá[8] e Heíet[9]. Perfeitamente integrado e aceito pela comunidade Ofaié, sente-se um deles, e tem que aproveitar a Fíie[10] que logo deve cair do céu, se Agachô[11] permitir, confia também o restante da aldeia. Noutros tempos o Paií[12] agitava o chocalho ao redor do cocho de Kauim[13] conversando com os deuses pedindo aquela dádiva dos céus para alegria das plantas. 

A filha caçula do casal, a Ortetô[14] Charâ-a[15], logo estará em casa retornando do colégio onde estuda e enfrenta os desafios da cidade. Na Ofaié E-Iniecheki, a escola da aldeia, os alunos estudam somente até a 4ª série. O professor Hang-tar-hec[16] se esforça em fazer o grupo reaprender a língua falada por seus pais, e os anima a falar o ofayé, ele que apreendeu com o pai, Ha-í[17] e o avô Chião[18], e que até bem pouco tempo manejava o arco com destreza e arte para a alegria de Oti-xô[19], antes de terminar os seus dias numa cadeira de rodas, acometido de um derrame que lhe paralisou o corpo. Apesar do descaso da educação com o ensino bilíngue isso ainda é um sonho para Xehitâ-ha, Teng-hô[20], Char-tã[21] e Hanto-grê[22]. 

A descrição de Axayray começa assim, mesclando palavras e nomes Ofaié como um desafio imposto ao autor de transferir esse saber ao leitor disposto com ele caminhar. Mais que isso, entende que algo possa ser extraído de proveitoso neste universo e relação havida entre o tempo e a história, relação estabelecida entre a atividade que exerceu como missionário e o aprendizado que recebeu daquele povo indígena. Algo como que contrariando a explicação dada por tantos pesquisadores e estudiosos, autoridades e governantes, de que os Ofaié tinham trilhado um caminho sem volta e que nada mais poderia ser feito para salvá-los das garras do latifúndio agressivo que tomou de assalto suas terras férteis das margens do rio Paraná, eis que eles se apresentam ternos e suaves, pelos caminhos da história. Não obstante, por trás, ao lado e à frente da luta dos povos indígenas, sempre houve quem os procurasse obstinadamente dizimá-los, como também houve quem procurasse protegê-los e promovê-los ao longo da margem direita deste rio que se parece com o mar, e que os Ofaié chamam de Keregawá-tá[23]. 

Ao mesmo tempo em que o autor arrisca ser criticado por especialistas da antropologia e linguística por narrar e grafar de forma leiga palavras em ofayé que ouviu ao pé do ouvido dos mais antigos e que aqui são citadas, sendo que muitos desses indígenas já morreram deixando um vazio enorme no peito do pesquisador e comunidade, busca com este texto caminhar no rumo que vai além das palavras. 

São apontamentos guardados em caixas, são vozes ainda retidas na memória, recolhidas amiúde pelo pequeno gravador e dezenas de fita k-7, hoje em desuso, mas cujo som ainda se impõe sobre a realidade que nos escapa como se tivessem vida própria, saltando para fora do baú do esquecimento, alimentando em nós o desejo de gritar e ir além da escrita, por atalhos e gritos sufocados que teimam em nos interpelar. 

A caneta desliza sobre o papel, e lá no pé da serra de Bodoquena (já no município de Porto Murtinho/MS), sob a luz da vela, lá está o missionário buscando chamar atenção sobre a importância e a riqueza desta língua e sua história para a sobrevivência de um povo, cujos remanescentes ainda hoje habitam o município de Brasilândia, em Mato Grosso do Sul. A língua ofayé[24], todos dizem e publicam, se encontra nos últimos estertores. 

Muito já foi dito e estudado, escrito e divulgado sobre a extinção física do povo Ofaié -- Darcy Ribeiro que o diga[25]. Mas sobre os últimos oito falantes da língua materna, classificada como pertencente ao tronco linguístico Macro-Jê, muito pouco se diz. Assim escrevem os especialistas e estudiosos da matéria, estruturalistas ou não, incapazes que somos para dar uma resposta mais consequente e que garanta o reconhecimento e a sobrevivência física e cultural deste povo. 

As duas filhas de Kiní-i, as pequenas Emilly e Kemilly, frutos da nomenclatura e hábitos contemporâneos deste mundo global, se encontram ao lado e envolvem num abraço carinhoso o dindo missionário, demonstrando confiança e prenúncio de esperança para o povo Ofaié. Ah! Como o tempo voa. A lembrança vai ao encontro do vento quando este povo se deixou conhecer, lá pelas bordas do Pantanal, no distrito de Morraria do Sul, num lugarejo chamado Tarumã. Lá num cantinho do mundo Reserva Kadiwéu adentro conhecido pelo nome de Vazantão: foi lá que este missionário e os Ofaié se deram a conhecer e foram, praticamente, redescobertos (...).

 

Fonte: DUTRA, C.A.S. Diário de Axayray – Indigenismo e Missão entre os Ofaié. Brasilândia/MS, Edição do Autor, 2021, pág. 7-10 (Introdução). Disponível em https://clubedeautores.com.br/livro/diario-de-axayray

 



[1] - Katai é o nome do Ofaié Carlos.

[2] - Okuin-rê é o nome Ofaié de Joana.

[3] - Está tudo bem, mas está frio, no idioma ofayé.

[4] - Araticum do mato.

[5] - Periquito, no idioma ofayé.

[6] - Nome em ofayé do senhor Osmar.

[7] - Nome em ofayé da Srª Joana.

[8] - Arroz no idioma ofayé.

[9] - Feijão no idioma ofayé.

[10] - Chuva no idioma ofayé.

[11] - Deus criador do povo Ofaié.

[12] - Equivalente ao Xamã, rezador dos Ofaié.

[13] - Milho fermentado usado nas festas dos Ofaié, equivalente à Chicha cultuada pelos Guarani.

[14] - Menina na língua ofayé.

[15] - Nome ofayé da menina Luciana

[16] - Nome ofayé do Prof. Silvano.

[17] - Nome ofayé de Severino.

[18] - Nome ofayé de Tomé.

[19] -Oti-xô é o nome Ofaié de  Arlindo.

[20] - Nome de Neuza, que quer dizer lugar distante, na língua ofayé.

[21] - Nome ofayé da pedagoga Marilda.

[22] - Nome ofayé da artesã Aparecida.

[23] - Nome dado ao Rio Paraná pelos Ofaié.

[24] - O autor grafa Ofaié (com i), quando se refere ao povo (como consta nos escritos históricos e antropológicos dos viajantes, naturalistas e expedições que descreveram estes indígenas a partir do século XIX), e grafa Ofayé (com y), quando se refere à língua falada por esta comunidade indígena (como pregam pesquisadores e linguistas hodiernamente).

[25] - A língua Ofaié está salva! escreveu Ribeiro, Darcy. Confissões. São Paulo: Companhia das Letras, 1997, p. 171.

quarta-feira, 21 de junho de 2023

 

Feliz Aniversário Professor da Terra Mié



1- Senhores peço licença
Que no más vou me chegando
Aos pouquitos vou hablando
Deixando o peito pulsar
Quero aqui homenagear
Uma pessoa querida
Que pelas canhadas da vida
Por estes pagos chegou
E com o seu nome marcou
A vida de muita gente.
Índio velho inteligente
Na garupa a humildade
E trabalhou com vontade
Ao lado dos pequeninos
Pois Deus lhe dera o destino
Ser defensor da verdade.

2- Peço perdão aos senhores
A minha xucra linguagem
Mas não me falta coragem
Para cantar esta glória
De gente que faz história
Como é o caso do Mié
Homem de muita fé
Vindo de um pago distante
É ele o aniversariante
Homenageado agora
E o faço sem demora
Lembrando a caminhada
Daquele que fez estrada
Prá chegar no Mato Grosso
E logo causou alvoroço
Quando defendeu a terra
Sem alarde, sem guerra
Água fresca neste poço.

3- Ouviu as queixas do povo
E a causa do lavrador
Do oleiro, o pescador
Do ribeirinho espoliado
Tantos gritos abafados
De tiranos afamados
Resquícios da ditadura
Tempo de escassa fartura
Que clamava por justiça
Pois no campo da cobiça
Falar de paz e direito
É como faltar o respeito
Ao latifúndio vigente
Mas Oigalê cuera valente
Que se lança na defesa
Contra forte correnteza
Buscando estancar a dor
Da injustiça e o desamor
A sua maior proeza.

4- Padre Mieceslau de um dia
Voz dos fracos e oprimidos
Peito inflamado contido
Quando a opressão campeia
E olha que a coisa tá feia
Pro lado dos excluídos
Vendo peões diminuídos
Seus direitos aviltados
Os corações apertados
Vendo a miséria e a desgraça
Se amontoado nas praças
Tão distante dos altares
Navegou por outros mares
Olhou firme na esperança
Mié optou pela mudança
Pastoral da terra abraçou
E a semente que plantou
Trouxe o altar para o chão
Somando a voz do irmão
Novo templo edificou.

5- Este nosso homenageado
Me perdoe o que me escuta
Mas é homem que labuta
Nesta terra há 30 anos
Mas não se descuido o paisano
Com seu aspecto de santo
Não estranhe o espanto
Pois este índio é gaudério
E sabe sair do sério
Quando a coisa fica feia
Também entra na peleia
Discute com autoridade
Defende a diversidade
Agita bandeira e luta
Semeia, questiona, refuta
Estuda, palestra e orienta
Não liga prá vestimenta
O que importa é a pessoa
A dignidade que voa
A reta intenção que ostenta.

6- Pois esse cuera agora
Depois desta caminhada
Trilha uma nova empreitada
Fôlego novo e trabalho
Cabelos brancos, grisalhos
E enfrenta a academia:
Desafio  novo assumia
O geógrafo, professor
Respeitado pesquisador
Trabalhos, Destilarias
Secretário, Agricultura
A pesca, Aquicultura
Aprofundou seus estudos
Fez brilhar o seu canudo
Além da universidade
Foi angariando amizade
Militância, acampados
Desafiou o Bispado
O latifúndio e a direita
Que quase nunca respeita
Por isso não foi poupado.

7- Ao lado dos professores
Mié estudou, foi estudado
Seus textos articulados
Falam coisas pequeninas
Ocultas das disciplinas
Rios, terra, e cheiro de gente
Lutas, conquistas, irreverente
Distantes das rodas sociais
Consideradas banais
Foram causas que abraçou
E o respeito conquistou
Do cinturão verde às sementes
Não colocou panos quentes
Na critica ao desenvolvimento
Sempre com discernimento
Defensor da ecologia
Vai o mestre em geografia
Animador do CEBI
E lá vai nosso guri
Merecedor de honraria.

8- Pro arremate desejo
Ao nosso Mié cidadão
Que para além do Bolsão
O esforço valeu a pena
Tantos amigos te acenam
De norte a sul do país
E com o amor da Belkiss
Família que a Deus pediu
E a sorte lhe sorriu
Te abraçando neste dia:
Que não te falte alegria
Para celebrar a vida
Deus do Céu te dê guarida
Ilumine teus caminhos
Fique livre dos espinhos
Curta o vigor da idade
Longa vida, felicidade
Saiba que não estás sozinho!

Parabéns Mié
Parabéns Professor da Terra.



Carlito Dutra
Pajada declamada em Três Lagoa/MS em 21 de junho de 2019 por ocasião dos 70 anos de idade do Prof. Me. Mieceslau Kudlavicz.
Música: Glênio Fagundes - Hino ao Sol.




terça-feira, 20 de junho de 2023

 

Feliz Aniversário, Cunhataí do cerrado.

Carlos Alberto dos Santos Dutra


 

Era uma vez uma menina. Ela nasceu no município de Três Lagoas, mas muito cedo, em janeiro 1992, com 5 anos de idade, mudou-se para Brasilândia. Em 1995, aos 9 anos, já era vencedora do primeiro Concurso Literário em Brasilândia, no qual produziu um poema sobre a cidade. Em 1998 mudou-se para Dracena onde atuou como bailarina por dois anos. Em 2001 retorna a Brasilândia e em 2002 conquista novamente o prêmio do Concurso Literário.

Apaixonada pela escrita, a jovem decidiu estudar jornalismo, nas Faculdades Integradas de Três Lagoas-AEMS. Atuou como repórter correspondente do jornal Hoje MS, de Três Lagoas, Jornal da Cidade e prestou assessoria de imprensa à prefeitura de Brasilândia durante alguns anos, voltando anos depois, e onde permanece até os dias atuais. 

Foi aos 23 anos que esta jovem jornalista foi contempladas pelo Fundo de Investimentos Culturais de Mato Grosso do Sul (FIC/MS), tendo a oportunidade de lançar seu primeiro livro, chamado Conhecendo a minha rua.

Nesta altura do texto, o leitor já sabe de quem estamos falando. Pois hoje, nos lembra as redes sociais, é o dia do aniversário desta jovem escritora e jornalista Patrícia Luciana Paulino Acunha, a estimada amiga de todos Pati. 

E para comemorar este aniversário, recuperamos aqui um texto em sua homenagem que foi proclamado por ocasião do lançamento do livro Conhecendo a minha rua, dessa nossa escritora, em cerimônia que aconteceu no ano de 2009, há 13 anos, portanto, nas dependências da Câmara Municipal de Brasilândia.

Naquele momento dissemos:

"Érico Veríssimo, renomado escritor gaúcho, escreveu em seu livro Solo de Clarineta o seguinte texto: Desde que, adulto, comecei a escrever romances, tem-me animado até hoje a ideia de que o menos que um escritor pode fazer, numa época de atrocidades e injustiças como a nossa, é acender a sua lâmpada, fazer luz sobre a realidade de seu mundo, evitando que sobre ele caia a escuridão, propícia aos ladrões, aos assassinos e aos tiranos. Sim, segurar a lâmpada, a despeito da náusea e do horror. Se não tivermos uma lâmpada elétrica, acendamos o nosso toco de vela ou, em último caso, risquemos fósforo repetidamente, como um sinal de que não desertamos nosso posto.

"É esse o espírito dessa noite. De alguém tão jovem e que está disposta a semear luz. E romper com o obscurantismo à sua volta. Transformando-se logo em exemplo e orgulho para todos. Falo, pois, da escritora desta noite. Para alegria de Brasilândia. Para honra dessa terra. E para o engrandecimento de nossa gente: 

Patrícia Acunha menina

Nossa Cunhataí do cerrado

Vive esse dia encantado

Escritora desta terra

Toda alegria encerra

Traçou largos horizontes

Vieste beber na fonte

Com teu olhar sempre atento

Faz notícia o pensamento

E a alegria do pai

Temor a Deus Adonai

E da mãe educadora

Foi a melhor professora

Sábias mãos, sopa de letras

Trouxe pro lar o planeta

Para este fruto colher

Ver o dia amanhecer

E, ei-la, menina graça

Que agora, para o mundo passa

Na condição de escritora

Mestre das letras, autora

Dá a cidade um presente

Que deixa todos contentes

Este livro, esta história

Que narra os tempos de glória

Dos primeiros que chegaram

Um a um, que aqui cruzaram

Pelas ruas da cidade

Tamanha felicidade

Só de lembrar, dá alegria

A suave melodia

É Brasilândia que canta

É o grito na garganta

Dos que saúdam Patrícia

Que deu vida a notícia

Por isso te respeitamos

Mais que isso, admiramos

Tua obstinação

Humildade, coração

Levantaste a lamparina

Lançaste uma obra-prima

Para lembrar amanhã

Com gosto de hortelã

Dos saudosos que partiram

Do jardim que construíram

Estão todos lá lembrados

Na memória, cultuados

Graças a essa menina

E a sua lamparina

Cheia de brilho e coragem

Deixa a mais bela mensagem

Tu és luz pra juventude

Demonstração de virtude

Respeito e maturidade

Pelas ruas da cidade

Corre solto o pensamento

Corre solto o encantamento

Patrícia Acunha, verdade".


Feliz aniversário Patrícia Acunha!

 

Fonte: História e Memória de Brasilândia/MS - Volume II – Patrimônio, Capítulo 1 Patrimônio Cultural de Brasilândia, Página 57-59

Disponível para leitura na Biblioteca Municipal Professora Abadia dos Santos, e rede de ensino municipal e estadual de ensino, de Brasilândia/MS.

Para aquisição, pelo site: História e Memória de Brasilândia/MS - Patrimônio, por Carlos Alberto dos Santos Dutra - Clube de Autores