A política, a mordaça e os intocáveis
Carlos Alberto dos Santos Dutra
E isso tem razão de ser. Numa rápida digressão
histórica, recapitulemos que ONTEM, após os anos de ditadura militar, através
da via política e sindical, o país avançou nas garantias individuais e direitos
trabalhistas, organizações sociais e dignidade humana.
Período em que houve consideráveis avanços nos
benefícios e na segurança jurídica alcançada neste período, sobretudo com a
promulgação da CF/88. Grande parte da população, antes excluída e invisível aos
olhos das políticas públicas passaram a ser respeitadas e consideradas pelas administrações.
Porém, para outra parcela da população, economicamente
mais abastada em sua redoma, esses avanços nunca foram bem-vistos e bem-vindos.
Através de seus representantes e capital político sempre alimentaram a tentativa
de inverter a ordem dessa pirâmide, subvertendo-a ainda mais para seu
benefício.
HOJE, ainda que por curto período, após o país ter
vivido e sentido na pele o viés ditatorial, fascista, obscurantistas e misógino
da política que tomou de assalto o comando maior da nação, eis que a sociedade
respira mais aliviada os ares de democracia que voltam a nortear o rumo dos
muitos brasis que aqui convivem.
Não era de se estranhar que tirassem proveito também
os políticos de todos esses avanços, sobretudo os relacionados às garantias
individuais, direitos e vantagens conquistadas, uma vez que a legislação
(criada por eles mesmos) já lhes garantem privilégios institucionais
incomensuráveis como:
Salário maior do que o Presidente; duas ajudas de custo, uma no início e outra no final
do mandato, no mesmo valor do salário; auxílio-moradia ou uso de apartamento
funcional; atendimento médico e odontológico particular; cota parlamentar; serviço
gráfico da Câmara; verba de gabinete, além de poder contratar funcionários para
trabalhar em seu gabinete, em Brasília ou no seu estado de origem. O que totaliza R$
168.600,00 mensais para cada deputado e R$ 1 bilhão por ano só para manter a
Câmara Federal.
Agora a Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei (de autoria da filha do ex-deputado Eduardo Cunha, deputada Dani Cunha, do União Brasil, do Rio de Janeiro) que propõe tornar crime a discriminação de pessoas que exerçam cargos políticos, ministros do Poder Judiciário e detentores de cargos comissionados.
Trata-se de uma medida onde o corporativismo, sem dúvida, falou mais alto, quando 252 deputados (contra 163) no plenário ampliaram suas garantias para o terreno pessoal, benefício que traz reflexo no exercício do múnus público que exercem.
Na verdade, a proposta é uma capa de proteção para políticos, parlamentares e magistrados. Criminaliza quem afrontar ou denunciar suas mazelas impondo uma mordaça na democracia. São pessoas que já são ultraprotegidas na sociedade, já têm segurança própria, já têm série de benefícios e privilégios – foi dito, e agora recebem o beneplácito legal que os torna intocáveis. Benesse que protege não somente os altos cargos, mas também os cargos subalternos comissionados.
Como escreveu o jornalista Mauro Paulino:
Todos foram pegos de surpresa,
foi feito na surdina, por trás dos panos e colocado em votação dessa forma que
vimos. Então, é algo a ser muito bem analisado pelo Senado e que demonstra,
mais uma vez, como esse Congresso tenta se auto proteger o tempo todo, completa.
A pena prevê de 2 a 4 anos de prisão e multa para quem discriminar pessoas consideradas politicamente expostas em virtude do cargo e do trabalho que desempenham. Pela lei, estarão acima da lei: ministros de Estado; presidentes, vices e diretores de autarquias da administração pública indireta; indicados para cargos de Direção e Assessoramento Superior; ministros do Supremo Tribunal Federal e de outros tribunais superiores; o procurador-geral da República; integrantes do Tribunal de Contas da União (TCU); presidentes e tesoureiros de partidos políticos; governadores e vice-governadores; prefeitos, vice-prefeitos e vereadores.
Para confirmar se uma pessoa se enquadra ou não nas hipóteses do
projeto, o texto diz que deverá ser
consultado o Cadastro Nacional de Pessoas Expostas Politicamente (CNPEP),
disponibilizado pelo portal da transparência. O projeto também alcança
pessoas jurídicas das quais participam pessoas politicamente expostas, além de familiares e estreitos colaboradores. Pelo texto, os familiares são os parentes, na linha direta, até o segundo
grau, o cônjuge, o companheiro, a companheira, o enteado e a enteada.
Foto: https://sismmar.com.br/site/justica-suspende-votacao-da-lei-da-mordaca-em-curitiba/;
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