quinta-feira, 26 de novembro de 2020


Marçal Tupã-i, o banguela dos lábios de mel.
Carlos Alberto dos Santos Dutra



No dia 2 de setembro de 2002, o Juiz Federal José Denílson
Branco, da 2ª Subseção Judiciária da 1ª Vara Criminal de Dourados
(MS) extinguiu o processo 2001.60.02.001890-6, o chamado Caso Marçal, líder guarani assassinado numa emboscada na Aldeia Campestre, no município de Antônio João (MS), no dia 25 de novembro de 1983
Hoje, passados 37 anos de sua morte, sob os benefícios escusos da lei, Justiça ainda não se fez e, nesses moldes,
jamais se fará. O que nos leva a cantar, com o poeta:

Adeus Marçal de guerra,
que lutava por terra, eram tempos difíceis.
Adeus Marçal de sonhos,
Guarani de fibra,
voz afiada em riste, a desafiar poderosos.

Adeus Marçal de Souza,
como tantos, silvas, pereiras, santos,
anônimos e esquecidos.

Adeus Marçal do Papa,
da mídia, e do mutirão,
da enfermaria, da tribuna e dos tribunais.

É, amigo Ñhandeva,
segura firme neste microfone e grita.
Brada aos ventos a injustiça que temos
e a que falta aos pequenos.
A terra que perdemos, o pão que não comemos.

É, amigo Kaiowá,
teus irmãos ainda lutam.
Paulito e Marta, ainda ontem partiram,
falaram que iam ao teu encontro.
Como outros que já se foram, antes do tempo e depois.

É, amigo Mbyá, irmão de longe,
que também se soma em coro na dor.
Ainda que as portas se fechem,
ainda que juízes te arquivem nos porões do esquecimento.
Yvy Maraney é blasfêmia
aos ouvidos do latifúndio.

Incomoda-lhes saber que tua memória vive,
que tuas ideias comovem.
Tua lembrança fere e questiona a nossa Ordem.
E desnuda a hipocrisia,
cultivada dia-a-dia, nos discursos, sem alarde.

Adeus Marçal desse mundo,
nem um julgamento decente te damos.
Adeus Marçal dessa terra, nem um monumento à tua altura fizemos.
Adeus Marçal Guarani, a espera é longa, mas não tarda.
Logo o ajuste te conta os espreita
na esquina senil da vida.

Donos do mundo e das coisas,
nos apossamos.
Donos das pessoas e da vida,
as compramos.
Donos da Lei, da Moral e da Justiça,
as decretamos para que outros a cumpram.

Adeus Marçal de Souza Tupã-i.
Podem extinguir e arquivar processos de nanquim e celulose.
Porém, não podem calar a carne e a verve do teu verbo.
Aquela que vem intestina, com o sabor das matas,
dos campos e das aldeias.

Do Pirakuá Guarani ao São Lourenço Guató,
Do Boa Esperança Ofaié à Aldeinha Terena,
Do Tarumã Kadiwéu ao Panambi Kaiowá.
E tantos tekoha, com suas lutas e suas changas
que se somam na esperança.

Adeus Marçal.
Reze por nós Pa-í Kaiowá
e Ñanderu Nhandeva
que em breve estaremos juntos.
Teu sonho, à semelhança de Sepé Tiarajú,
há de permanecer sendo a estrela de maior brilho.
Não mais como sonho,
mas realidade construída.

Não pelos homens,
ditos doutos e letrados,
mas pelas mãos de teus patrícios, parceiros.
Irmãos que manuseiam a terra desafiam a morte
e ousam cantar liberdades...

Brasilândia 25 de novembro de 2020.

Fonte: 1- Publicado originalmente no Diário MS, Dourados-MS, 24.Nov.2003; A Tribuna, Campo Grande-MS, 23.Nov.2003, e Jornal da Cidade, Brasilândia-MS, 21.Mar.2003. Publicado também em DUTRA, C.A.S. Uma flecha no coração de Hans Kelsen. Brasilândia-MS: Edição do Autor/Clube de Autores, 2009, p. 10-12.
Foto: Marçal de Souza Tupã-i (Deus  pequeno). Portal da Missões, 2019.

domingo, 22 de novembro de 2020

 

Emilly, esta menina tá virando moça.

Carlos Alberto dos Santos Dutra


 


 











Ah, como o tempo voa. Esta menina tá virando moça. Como não haveremos de envelhecer? Se quem nós carregamos no colo hoje nos dão bom dia e já estão mais altos que nós? Esta parece ser a sina dos mais velhos, sorrir, zelar, sonhar e chorar. Sorrir, quando eles nascem, filhos, sobrinhos, afilhados, amigos. Zelar, quando os ajudamos, os aconselhamos, os orientamos. Sonhar, quando os projetamos no futuro e os vemos realizados na vida, felizes. Chorar, quando já não podemos mais acompanhá-los em sua inexorável caminhada, que é só deles e de mais ninguém.

Hoje me sinto assim, entre um sorriso e uma lagrima, e por um motivo simples, banal, para alguns. Afinal, aniversários acontecem todos os dias, a cada hora, a cada minuto na nossa vida e círculo familiar de amigos. E lá está o Facebook para nos lembrar da data quando a memória nos falha e o coração reclama.

Só que alguns aniversários mexem com a gente, pois relembram passagens de nossas vidas, de tempos passados, que nos enchem de sentimentos, às vezes de alegria, às vezes de tristeza. Por isso essas datas são importantes por nos mostrarem o quão transitório somos e que não ficaremos por aqui para sempre. Por isso, deixemos que as lágrimas rolem pelo nosso rosto e o coração transborde de alegria e felicidade. Pois, afinal é Dia de Aniversário.

Tudo isso para dizer o quanto o aniversário de uma pessoinha querida é importante para todos nós. Aniversário, entretanto, ainda mais especial para sua família, seus parentes, e cá entre eles, este sonhador. Sem querer expô-la ao mundo, uma vez que isso sempre será uma decisão sua, a menciono nestas linhas de forma simbólica, para exaltar suas qualidades e virtudes de menina-moça.

Sim aquela menina que carreguei no colo lá no ano de 2007 está de aniversário. Não. Ela não era uma criança qualquer das tantas que abraçamos todos os dias e ficamos felizes por elas e seus pais. Tratava-se de minha afilhada. Pode parecer bobo destacar esse detalhe, porém, ele é fundamental para a sobrevivência de muitos velhos. Explico.

O coração dos mais velhos vive de recordações. Embora procurem se manter sarados e com boa aparência, entre um fio de cabelo branco aqui e outro acolá, sempre aquelas têmporas escondem lembranças de um tempo idílico, vivências que tiveram ao longo da vida e que nunca esqueceram. O abraço aos filhos, afilhados e netos deixam marcas para sempre. É isso que, nos aniversários, as lembranças nos pedem.

E a moça está lá, sentada no chão, acariciando uma euék e um kétot. Já não é segredo para ninguém de quem se trata – graças a mídia social todo o mundo virtual já está lhe dando os parabéns agora. Ela permanece ali, com seu sorriso encabulado, porém muito determinada na sua demonstração de afeto e respeito para com a natureza que a cerca, na aldeia onde vive.

Uma leve brisa a envolve vindo do interior do cerrado a sua volta e é como voltasse a ser criança de colo, quando as palavras ainda lhe faltavam para expressar o sentir. Sempre muito bem agasalhada pela mãe Kiní-i, parecia um totenzinho de pano deixando somente a cabeça de fora, muito ereta e olhinhos pretos bem espertos que a tudo observava.

A fotografia tirada no meu escritório no dia que recebi o convite para ser seu padrinho demonstra isso: seus olhinhos espreitam aquele homem de cabelos brancos que a toma nos braços. Quem seria? O que queria? Não sabia direito o que pensar naquela hora. Porém, poderia ela ter pensado: --o calor de seus braços me conforta, vou ficar quietinha, por ora.

Como todas as crianças indígenas, ela sempre foi uma criança silenciosa e comedida nos seus atos. Porém seus olhos nunca conseguiram esconder a grandeza de seu potencial: para ser uma grande líder, uma grande profissional, uma grande mulher, uma grande guerreira. Calma! O vovô se empolga com os encantos da afilhada e projeta nela todos os seus sonhos, sonhos de todos que a querem vê-la feliz.

Mas a estrada da vida possui muito caminhos e caberá a esta jovem que hoje completa aniversário decidir qual deles seguir. Um conselho o padrinho ainda insiste em dar: siga sempre o seu coração, depois de a todos ouvir e ponderar, em especial os mais antigos da aldeia. Podes errar, mas estarás em paz e com o apoio de muitos para se levantar...

Para orgulho de Kãi’rã, Ta’gué, To’tê, Hanto’grê, Xar’tâ, Xehit’ha, He’í, Hegue’í e tantos parentes que lá do alto te abençoam e torcem por você. E desejam Feliz Aniversário Emilly Ofaié!

Brasilândia/MS, 22 de novembro de 2020, Dia Mundial da Água.



sábado, 21 de novembro de 2020

 

Canga Zumba do Cabelo Bom.

Carlos Alberto dos Santos Dutra



Ontem foi o Dia da Consciência Negra e, para não passar em branco, revivo as palavras que escrevi há 14 anos. É um tema que permanece sempre atual e, a julgar pelos acontecimentos dos últimos dias e que se repetem o ano inteiro, republicá-lo se reveste de importância capital para cutucar a nódoa do racismo e preconceito que assombra a todos nós.

O texto de Jamile Chequer, sobre o cabelo ruim, publicado no antigo site do Ibase, em 17.Nov.2006 foi na veia. Impossível não comentar o texto que ilustra as comemorações do Dia da Consciência Negra que lembram Zumbi, aquele negro que teve a cabeça decepada e exposta nas ruas do Recife, em 20 de novembro de 1695, depois de comandar a maior rebelião contra o regime escravista no Brasil inspirado por seu tio Canga Zumba, o primeiro líder do Quilombo dos Palmares que o governou de 1670 a 1678.

Trezentos anos depois, a música fala de chapinha e o cantor MC Franc reforça no refrão: Ih, choveu, cabelo encolheu. A letra cantada não é só uma preferência musical. Faz parte de um ideal. A onda é ser mulher magra e homem sarado, escreve a jornalista. O cidadão se olha no espelho e pergunta: O que há de errado comigo? Mas será que adianta dizer: Não há nada errado com você?

Acontece que o mundo global vive uma corrida louca em busca da perfeição. A tal da qualidade. E aí, quando o cidadão não se encaixa no perfil perfeito, ainda tem que ouvir que seu cabelo não é bom. A cultura do tal cabelo bom tomou conta da sociedade de tal forma que o ideal, no imaginário, são melenas compridas, impecavelmente lisas e que deve balançar ao vento igual à moça da TV.

Uma remexida no baú da história de Canga Zumba, e logo percebemos que essa visão de beleza tem origem no passado escravista e nas relações de dominação que imperaram no decorrer dos séculos após o arrojo de Jorge Velho lá pelo distrito de Porto Calvo. O cabelo do negro, visto como ruim tornou-se a expressão velada do racismo e da desigualdade racial que recai todos os dias sobre os herdeiros de Palmares. É expressão do conflito racial vivido por negros e brancos que se digladiam na busca pelo ideal.

E entopem os salões de beleza; empanzinam-se de produtos químicos, expondo na vitrine do shopping, nas palavras da professora Nilma Lino Gomes, da UFMG, o suporte simbólico da identidade negra brasileira: o cabelo crespo cada vez mais longe do corpo da pele morena, por forma de um patrulhamento estético.

A chamada beleza negra é expressão que nasceu de uma construção social, cultural, política e ideológica criada no seio de uma comunidade. E para que se compreenda o que as pessoas negras pensam e sentem quando mudam os seus cabelos, é preciso conhecê-las e entender como se dá o processo de construção dessa identidade negra no Brasil.

Por outro lado, não se pode dizer que uma pessoa embranqueceu ou que tem consciência política só pelo fato de usar esse ou aquele tipo de penteado. Ainda mais quando se sabe que os efeitos do racismo recaem pesados sobre as mulheres, exigindo-lhe primor na aparência. Dificilmente negros e negras conseguem se expressar esteticamente livres do olhar severo e do julgamento intestino da sociedade que os cercam.

Por isso, mudar o cabelo pode ser entendido como uma tentativa de sair do lugar de inferioridade imposto pelo racismo, um sentimento de autonomia, expresso nas formas ousadas e criativas de usar o cabelo e a presença de uma identidade negra positiva, independente, alternativa.

Ângela Maria dos Santos, professora da UFMT, citada pela articulista, observa que nesse quadro, a escola tem sido outro palco de reprodução de racismo. A referência negativa ao cabelo afro é a marca fenotípica mais explicitamente mencionada nas situações de ofensas raciais nos corredores escolares, explica.

A reprodução da expressão cabelo ruim, em qualquer meio – mas, sobretudo no ambiente escolar das séries iniciais --, tem trazido graves consequências para o futuro dos jovens. Porque nessa faixa etária existe uma forma naturalizada do racismo se apresentar. E a naturalização do preconceito racial alimenta relações de poder desigual entre alunos brancos e negros, afirma.

A cor, portanto, deixou de ser, em primeiro plano, a marca perceptível da aparência física utilizada pela pessoa que discrimina. Para a professora acima, o que aparece como uma característica física mais funcional para se discriminar racialmente passou, agora, a ser o cabelo. E tudo isso pelo fato de que no imaginário, desde pequenos, ouvimos dizer que alguém em nossa família tinha o cabelo ruim.

Isso demonstra que estereotipamos e fazemos comentários negativos acerca do cabelo, e achamos isso normal. Fazer menção ao cabelo parece não constituir uma forma aberta de racismo, nos desculpamos, diferentemente de quando nos referimos à cor da pele. Quando não nos referimos à cor, julgamos ficar isentos de um comportamento racista. É como se as pessoas ficassem mais à vontade, justifica a autora.

Outro dado assustador é que facilmente fazemos ligação entre negro e coisas. Quando você faz referência ao cabelo do negro comparando-o a uma planta espinhosa, por exemplo, está tirando a sua feição humana. O negro é coisa, e coisa feia. Para se ter uma ideia da força do racismo, observemos que hoje não encontramos facilmente teorias coisificando os negros, mas, no entanto, no discurso e nas falas de nosso cotidiano, elas estão presentes, principalmente na fala de crianças e adolescentes.

Portanto, é na escola que a criança negra sofre a maior carga do preconceito racial. Os apelidos, as comparações com animais (principalmente o macaco) e as referências ao cabelo crespo, como Bombril e outros nomes pejorativos, são comuns no ambiente escolar. No íntimo, muitas negras confessam que só foram usar tranças rastafári, depois de muito relutar consigo mesmo. Um antigo sonho que eu nunca tinha conseguido realizar, explica. E olha que isso, -- confessa uma adolescente--, causou em minha uma transformação autoimagem: um dia, resolvi usá-lo natural. Foi um momento de intenso crescimento pessoal.

Enquanto alguns professores preferem evitar o assunto, outros encaram a situação e estão dispostos a refletir com os estudantes sobre essas brincadeiras nada inocentes. Porque isso precisa ser desmascarado. Não basta a intervenção do tipo: não diga isso. A intervenção pela censura dificilmente leva o educando a refletir. É preciso aproveitar a situação para fazer uma boa discussão de conteúdo, recomendam os pedagogos.

E aí, rebentos de quilombos e palenques? Que tal, cantarolar para nossos filhos e alunos, a música do Max de Castro? Muita gente implica com meu pixaim. Mas o que me implica é que o cabelo é bom. E quando isso me irrita vai ter briga sim. Porque não aceito discriminação. Alisa ele não, você é meu nego do cabelo bom. 

 

Foto: Monica Cardim, 2018. Disponível em https://www.santos.sp.gov.br/?q=noticia/miss-recebe-a-exposicao-mulheres-negras-na-danca, acesso em 21.Nov.2020.

Texto: Publicada originalmente pelo jornal a Tribuna, de Três Lagoas na edição de 26 de novembro de 2006.


quarta-feira, 18 de novembro de 2020

Homenagem aos 100 anos do Vovô Lúcio.

Carlos Alberto dos Santos Dutra.


Homenagear em vida a pessoa que amamos conforta o coração de quem fica. E alegra o coração de quem parte.



Brasilândia/MS 17 de novembro de 2020.


terça-feira, 17 de novembro de 2020

Tire a sua raiva do caminho que eu quero passar... com meu amor.

Carlos Alberto dos Santos Dutra.



Durante o período eleitoral deste ano em Brasilândia foram postados 12 artigos de autoria deste escrevinhador redigidos especialmente para as eleições municipais locais. O quadro comparativo abaixo, nos mostra as visualizações que ocorreram tanto no Blog como no Face para cada artigo. Isso nos auxilia a entender o alcance dos enunciados e propósitos destes escritos.

Para quem escreve pelo simples prazer de escrever isso pode representar pouco, da mesma forma para quem lê. Mas, para quem escreve ou lê um artigo revestido de idealismo, preocupação social, com espírito formador e pedagógico, buscando ajudar o cidadão a pensar, esses números podem dizer muito. E auxiliar a ambos fazer uma releitura não somente dos textos, mas da realidade social e política que os envolve. 

No cálculo geral, a dúzia de textos produzidos e publicados nos 60 dias finais da campanha eleitoral foram acessados diretamente no Blog carlitodutra.blogspot.com 1.973 vezes, enquanto esses mesmo artigos foram curtidos ou receberam comentários e compartilhamentos, 647 vezes no Face facebook.com/carlito.dutra/ (32% em relação ao Blog). 

Uma das explicações para essa diferença no número de acessos entre os aplicativos pode estar ligada ao fato de que no Blog, o contador de acessos (que é automático e sem a interferência do titular da conta) ele não identifica o leitor, o que permite maior liberdade para quem acessa poder ler ou enviar (também via celular) para qualquer um. Ao passo que pelo Face, o aplicativo identifica quem curtiu, comentou ou compartilhou o artigo, tornando público a sua simpatia ou confronto como o que é apresentado. 













O quadro pode receber várias leituras, por profissionais especializados também. Porém, a mim cabe destacar, de forma singela os conteúdos acessados. Preliminarmente nota-se que o artigo O que a eleição de 2020 tem em comum com a eleição de 1988, redigido ainda em 28 de setembro, foi o que mais chamou a atenção do internauta (484 acessos no Blog). Atribuo esse interesse velado (pois o Face registrou somente 61 acessos) em razão do momento vivido, distante do pré-eleitoral, onde o cidadão ainda buscava algum referencial teórico para posicionar-se diante da política local.

O terceiro artigo mais acessado (com 338 acessos no Blog, e já com um número mais elevado de leitores que o acessaram via Face (134 registros), acontece trinta dias depois do primeiro colocado, e versava sobre Novas ideias, novos projetos e velhos paradigmas a superar, publicado em 29 de outubro. Aqui entendo que o leitor/eleitor comece a revelar seu interesse pelas propostas e projetos que os candidatos passam a divulgar, ainda que timidamente, pela mídia e redes sociais.

No outro extremo da balança encontramos os dois artigos que foram menos acessados. A pouco mais de um mês das eleições era de se esperar que a temática abordada por estes artigos despertasse maior interesse. Engano nosso. O artigo A reeleição e os estreantes na política em Brasilândia, publicado em 11 de outubro teve apenas 49 acessos no Blog e 13 no Face, o que nos força a aprofundar a reflexão buscando uma causa provável para este comportamento.

O público permanecia o mesmo: era aquele que nos dias anteriores havia depositado suas curtidas e diversos comentários sobre os outros temas políticos já publicados. Portanto, não se tratava de uma rejeição ao autor ou ao instrumento virtual utilizado. Observando mais amiúde o texto em apreço, a reticência poderia estar relacionada ao tema propriamente dito. Posicionar-se contra a reeleição numa cidade pequena significa contrariar interesses, uma vez que todos são conhecidos e estreitam laços de compadrio.

O artigo O candidato ideal: ideologia ou amizade, publicado na semana seguinte, nos faz repensar o caso. Reforça o entendimento de que o texto discorre sobre uma realidade que a população geralmente lida com bastante dificuldade. Ao se identificar com quem esteja colocando este instituto em xeque (ainda que através de um texto),  estariam eles correndo o risco de romper com este liame amigável, de longa data, nutrido pelos favores de quem se assenta no poder e não mais quer dele sair. Tudo isso configura ameaça e risco de amargar possíveis desafetos.

É o que aconteceu com o artigo da reeleição. Embora ressalte o importante papel dos estreantes na política – o que de certa forma é bandeira da maioria --, o texto não teve a mesma aceitação. Mudar sempre é doloroso, causa desconforto e insegurança, porém, o bom senso, quase sempre demonstra que é caminhando que se abre caminho escreveu meu professor em ideias, do tempo da teologia na PUCRS, o missionário italiano Arturo Paoli.

Tal entendimento, entretanto, não é uniforme. É o que nos faz crer se perguntarmos por que o artigo As mulheres, a política e as eleições em Brasilândia obteve apenas 10 acessos no Blog e o dobro de curtidas no Face? Uma possível resposta para essa discrepância pode estar ligada ao conteúdo abordado: Ao denunciar a situação real vivida por cada uma das mulheres que sonham, por exemplo, um dia candidatar-se, o texto exerceu forte identificação sobre elas. 

Sobretudo quando descortinou: Todos sabem que a construção dos partidos políticos não é pensada para que as mulheres participem (...), a cada eleição, elas aparecem no final do rol de candidatos, tão somente para completar a chapa em cumprimento à exigência legal dos 30%(...),  poucas tiveram a oportunidade de opinar na elaboração das propostas defendidas pelos partidos aos quais estão concorrendo, reproduzido no texto.  

Observar a realidade quando se está próximo exige esforço redobrado, tempo disponível e discernimento acurado. Às vezes requer até um empurrãozinho para que o oprimido caia em si e decida mudar. O texto parece que exerceu este papel motivador: A democracia não pode abdicar da representatividade da mulher no cenário político. É através de sua voz na tribuna do Legislativo que a realidade pode mudar. Este é o caminho para (...) superar o patriarcalismo arraigado, onde a mulher foi submetida a uma posição de inferioridade em relação ao homem em todos os níveis sociais. 

Um longo caminho, entretanto, ainda precisa ser percorrido, para que se garantam espaços democráticos e de igualdade entre homens e mulheres. Romper com estruturas que no curso da historia política brasileira obstaculizaram a participação feminina nos espaços de poder é um imperativo. O que poderá ser conseguido garantindo-se o acesso das mulheres a este debate, alcançando-as em todos os lugares, em especial entre as mulheres negras, indígenas e extratos sociais mais excluídos, frisava o texto preterido.

No caso de Brasilândia, a resposta veio das urnas, em silêncio, com um laço de fita na cabeça, amor no coração e uma lança vitoriosa em riste na mão. A repercussão do artigo final A reeleição e a Supremacia feminina na Câmara de Brasilândia que recebeu, num só dia após as eleições, 367 acessos no Blog e 152 curtidas, comentários e compartilhamentos no Face é uma prova disso. E pode ser entendido como uma demonstração de amadurecimento político, tanto das candidatas como dos eleitores, sobremaneira das mulheres eleitas que deixam o anonimato – ainda não todas --, e assumem definitivamente em alto e bom tom o comando da Casa Legislativa de Brasilândia.

 

Brasilândia/MS, 17 de novembro de 2020.

 




Frase: Slogan utilizada pela candidata a prefeita de Porto Alegre, jornalista Manuela D'Ávila, do PC do B, nas eleições 2020. Foto: Imagem símbolo contra o racismo e xenofobia criada pelo artista espanhol Luiso García, a partir da fotografia da ativista sueca Tess Asplud em homenagem ao gesto icônico de desafio contra a marcha fascista em Borlange, no centro da Suécia. Disponível no site do Instituto da Mulher Negra, em https://www.geledes.org.br/tag/tess-asplund/ 12.Mai.2016., acesso em 17.Nov.2020. Gráfico: Elaborado pelo autor Carlito Dutra, em 17.Nov.2020. 

 

segunda-feira, 16 de novembro de 2020

 

A reeleição e a supremacia feminina na Câmara de Brasilândia/MS

Carlos Alberto dos Santos Dutra





O resultado das eleições municipais em Brasilândia/MS revelou o que já era aguardado para o cargo de prefeito com a vitória do candidato Dr. Antônio de Pádua Thiagodo MDB, que confirmou sua preferência para os 3.936 eleitores (64,61%) que lhe confiaram mais quatro anos de mandato. Drª Léa, do PSDB, com 1.899 votos, conquistou 31,17% dos eleitores e Oliveira Júnior, do PTB, apenas 257 votos (4,22%).

A maior novidade, entretanto, aconteceu na Câmara que passou por uma significativa renovação de nomes e de gênero. Agora o Legislativo terá cinco mulheres nos próximos quatro anos, sendo duas reeleitas e três novas vereadoras. 

A veterana Jô Silva, de 49 anos, que desde 2012 está na política e parte agora para o seu segundo mandato, obteve 225 votos, pela sigla do PSDB e foi a 6ª mais votada. E a vereadora Néia Assistente Social, de 41 anos, que foi reeleita para seu segundo mandato pela sigla do MDB, com 431 votos, a segunda mais votada nesta eleição de 2020.

Sem dúvida, isso já era esperado, uma vez que em seus mandatos essas vereadoras haviam se destacado, cada uma no seu campo ideológico, levando a diante com afinco seus projetos e propostas. Como presidente da Câmara, na atual legislatura, a vereadora Jô Silva enfrentou grandes desafios na condução dos trabalhos do Legislativo frente a denúncias em face do Executivo, o que foi sempre rebatido, como era de se esperar, pela vereadora Néia Assistente Social, desempenhando a risca o papel de paladino e líder do Prefeito na Câmara.

Entre as novatas eleitas para o cargo de vereador pela primeira vez, encontra-se a experiente Márcia Amaral, assistente social, de 51 anos, pela sigla do PSDB, que arrebanhou 457 votos nestas eleições. Para quem já foi vice-prefeita e candidata a prefeita de Brasilândia, era de se esperar que ela fosse a mais votada, o que lhe confere responsabilidade e um referencial promissor à frente do Legislativo brasilandense.

As outras duas mulheres, estreantes na política, ambas pelo MDB completam o quadro que irá conferir maior empoderamento feminino à edilidade local. Patrícia do Banco, que surpreendeu pela firmeza de suas convicções e poder de convencimento pelas mídias sociais, conseguiu arregimentar 235 votos, o que lhe garantiu a 4ª colocação entre os vereadores mais votados. 

E a candidata Selma Alquaz, de 43 anos, que conquistou a confiança de 178 eleitores e também pelo trabalho junto ao Conselho Tutelar, o que lhe garantiu ser eleita como o 8º vereador mais votado nestas eleições.

Uma lástima não ter sido eleita, para completar este quadro combativo a suplente Juliane do Porto, do DEM, que conquistou com garra e determinação 178 votos, perdendo a posição, por uma diferença mínima de 10 votos, para o companheiro de partido, o experiente Quinca da Fenix, de 62 anos, reeleito pela 4ª vez com 187 votos. Ele confirmou sua trajetória de vitórias iniciada em 2008 quando obteve 343 votos; em 2012 quando obteve 282 votos, e na última eleição de 2016 quando conquistou 331 votos.

Entre os candidatos masculinos, o pleito ainda reservou outra surpresa entre os novatos: Nivaldo Polícia, de 53 anos, pelo PSD, que foi eleito com 172 votos, deixando para trás, por uma diferença de apenas 10 votos, o jovem idealista Prof. Deley, do mesmo partido, que obteve 162 votos. Embora o policial fosse apresentado como estreante na política, nas eleições de 2000 ele já havia concorrido a vereador conquistando 132 votos, que foram insuficientes na época para elegê-lo.

Outro nome eleito foi o brasilandense Quintino do Agro, de 57 anos, o 3º mais votado que somou 260 votos pela sigla do DEM. Com esse feito ele viu coroada uma brilhante caminhada iniciada em 1988 quando concorreu pela 1ª vez e conquistou 78 votos; depois em 1992, obteve 115 votos, e na eleição passada, em 2016, quando colecionou 204 votos. Sua presença na Câmara deverá representar significativa mudança influenciando no jeito de olhar e atuar dos vereadores.

A renovação só não foi completa em razão da reeleição de outro candidato, o Edinho do Master, de 45 anos, ex-PT, vinculado agora ao partido PODE, que foi o 4º mais votado, com 227 votos. De certa forma ele confirmou sua trajetória política iniciada em 2012, quando obteve 162 votos, e em 2016, quando obteve 216 votos. Não fosse a expressiva votação que lhe garantiu a reeleição, a vaga estaria garantida, com grande proveito para a comunidade, ao atuante José Henrique que concorria pelo mesmo partido e obteve 157 votos.

De um total de 9.324 eleitores inscritos em Brasilândia, compareceram às urnas 6.392 eleitores, deixando de comparecer 2.932 eleitores, ou seja, 31,44% dos eleitores deixaram de votar. Este alto índice de abstenção que, por um lado fez falta aos candidatos para mudar o rumo das eleições no município, por outro, revelou que o isolamento social e o desencanto do cidadão em relação à política em geral, contribuiu para reduzir a participação do povo nas eleições.

Os novos nomes eleitos, em síntese, revelam mudanças na correlação de forças no cenário ideológico da Câmara a partir de 2021. Com um staff de seis representantes a situação, agora obtém, em tese, a força política que o Executivo necessita para fazer frente a oposição e colocar em prática os projetos que almeja para a Brasilândia que todos amam desenvolver-se e que a partir do ano que vem deve se portar de maneira muito mais coesa e menos polarizada.

Orquestra que as cinco mulheres eleitas podem reger com maestria, graças à sensibilidade de gênero que as torna maioria no Legislativo contra o bloco minoritário formado por quatro homens, o que deverá garantir novas pautas e supremacia da inteligência feminina nas votações e decisões. 

Mas isso, só tempo dirá. Por ora, resta parabenizar aos eleitos pela vitória desejando-lhe um frutuoso e democrático mandato. E também aos demais candidatos que não alcançaram o numero de votos necessários para se elegerem, a despeito de terem apresentado brilhantes projetos e propostas de trabalho. 

Brasilândia/MS. 16 de novembro de 2020.



sexta-feira, 13 de novembro de 2020

 

Edmilson Martins Rosa: Bugão e seu singelo coração.

Carlos Alberto dos Santos Dutra


 

A despedida de um amigo sempre é dolorosa, sobretudo quando este amigo tem laços de sangue, tem família, tem uma história de vida para ser contada, para ser lembrada.

Com certeza a pessoa de Edmilson Martins Rosa deixa muitas lembranças no coração daqueles que estavam a sua volta e também dos que se encontravam distantes.

A legião de amigos que possuía, sim, tem um motivo muito simples para dele lembrar. Aliás, simplicidade era a sua marca registrada.

Nascido e criado em Brasilândia, fazia parte do cenário natural e bucólico desta cidade, com todos os seus nuances, virtudes e limites.

Filho do senhor José Pedro Rosa e dona Adila Martins Rosa, o pequeno Edmilson Martins Rosa nasceu no dia 10 de setembro de 1976, e muito cedo, à medida que foi se tornando homem, ganhou o apelido de Bugão, passando a ser conhecido de todos.

Todos que o conheceram testemunham que ele tinha um coração enorme, talvez por isso ele ostentasse aquele corpo generoso para guardar tão preciosa relíquia de onde transbordava gentileza e generosidade.

Sempre muito dedicado e prestativo, frequentou a Escola Estadual Adilson Alves da Silva, depois trabalhou por muitos anos do comércio local, na Conveniência 24 horas do Fita.

De formação e profissão eletricista transparecia ao andar pelas ruas felicidade e contentamento; sentia satisfação viver e mostrar seu trabalho a qualquer um, por mais simples que sua obra fosse.

Quando jovem, um dia sonhou dedicar sua vida a Deus. Pensou em ser padre, chegando a frequentar por algum tempo um seminário no Sul do país dirigido para jovens que quisessem abraçar a vocação sacerdotal. Mas o chamado que Deus o havia reservado para permanecer aqui, e servir Brasilândia com o seu dom.

Para as camadas sociais mais abastadas, talvez o Bugão passasse despercebido, um transeunte qualquer. Poucos percebiam sua camaradagem ou lhe davam o devido valor.

Somente quem lhe dedicasse um minuto de atenção poderia perceber que ali, sob aquela pele cor de jambo e olhar de gratidão, se encontrava um jovem cidadão, alegre e descontraído, simples demais para ser bem compreendido.

Ainda aluninho na escola, nos primeiros anos de colégio, lembra a professora Jucli Stefanello Peruzo, sempre foi muito querido; uma criança dócil e amorosa. E assim se tornou rapaz, um cidadão trabalhador, escreveu ela nas redes sociais.

A professora Maria Rita Santini também partilha deste sentimento exaltando agradecida a alma profundamente humana de Bugão e seu dedicado pai Zico a quem presta suas condolências. 

Quando menino, lembra, auxiliava o seu pai em um serviço na minha casa. Sempre muito sorridente ele colocava na carriola a minha filha ainda pequena e dava voltas no quintal, correndo. E ela sorria a valer, feliz. Depois de adulto, continuou sempre muito atencioso com todos, recorda com saudade.

E é esse menino jovem de 44 anos de idade que hoje se aparta de todos nós. Deixa a cidade, os amigos e os familiares. E nesta partida deixa também lembranças, saudade e oportunidade para que lhe possamos agradecer e dizer: até breve, amigo Bugão, amigo de um singelo e generoso coração. 

Descanse em paz irmão.

Brasilândia/MS, 13 de novembro de 2020.


sexta-feira, 6 de novembro de 2020

 

As flores e o encantamento de dona Ignes.

Carlos Alberto dos Santos Dutra 


 



O corpo levemente inclinado para trás se apoia nos braços de quem confia. 

O olhar para alto vai ao encontro do rosto de quem a abraça. 

O homem gentil a toma pelo braço enquanto a envolve numa aura de ternura e alegria. 

A mulher, ao reclinar, suas mãos postas figuram como se uma prece de agradecimento e júbilo por estar ali fizesse, naquele momento mágico.

Ele é só encantamento. Parece estar diante do melhor momento de sua vida, o mais importante. E sorri. Assim como sua amada, que estampa no rosto largo olhar de felicidade. 

O azul do vestido, de corte bem talhado revela elegância e bom gosto. Cor que contrasta com a delicada correntinha que ostenta no pescoço deixando cair sobre o peito a medalha que acompanha a expressão de sua fé.

O momento de rara beleza captado pela lente do fotógrafo há de se eternizar no tempo, atravessar gerações inteiras motivadas por este gesto de grandeza antológica, despertando para a sedução e o encanto que o quadro inspira. 

No contorno e estampa deste quadro real, é possível sentir a força e a emoção que a mensagem e suas cores transmitem. Sentimento que fulmina em cheio nossos corações.

Um casal assim é coisa rara, coisa de cinema. Ainda mais quando viveram juntos 70 anos, trilhando lado a lado uma longa e linda história de amor. 

História cheia de alegria e testemunho de vida, cultivada num jardim repleto de flores, frutos e rebentos que continuam sempre a florir.

Para quem veio ao mundo, passou a infância, cresceu e casou numa cidade de nome Paraíso, é razão suficiente para explicar o longevo percurso de vida feliz que trilhou.

Anos cheios de graça e abundância vividos por dona Ignes da Costa Souza ao lado do esposo Joaquim Ferreira de Souza, aquele que, mesmo nas horas difíceis enfrentadas pelo casal, o sorriso e o abraço de confiança nunca lhe faltou.

Ela manteve o afeto demonstrado até o final de seus dias, quando a doença a impediu de sorrir e abraçar aquele que há 15 dias, o Céu lhe roubou primeiro. 

Ah, esse amor verdadeiro, liame de companheirismo e respeito, alegria e perfume, que aos poucos foi se esvaindo. Ah, aquela saudade tamanha de sair correndo ao encontro daquele que o olhar se acostumou...

Mas, eis que lá, no horizonte florido, em outro lugar Paraíso, acenando entre as flores, ela vislumbra um ramalhete abraçado, embalado pelo vento, saudando sua chegada. 

E lá vai a noiva Ignes, cheia de graça, radiante, percorrendo entre as flores, sem dores, toda vestida de azul, olhando para o alto sorrindo. E agradecendo a Deus pelo feliz encontro com seu amor encantado, juntinhos na eternidade.

Brasilândia/MS, 6 de novembro de 2020.

terça-feira, 3 de novembro de 2020

 

Quem são e o que pensam os candidatos a prefeito de Brasilândia?

Carlos Alberto dos Santos Dutra

 

Estamos a doze dias das eleições e os candidatos entram na reta final da campanha neste tumultuado ano de pandemia. O eleitor já definiu o nome de sua preferência para candidato a vereador. Entre os 67 concorrentes (depois de duas renúncias), todos já disseram que desejam o melhor para Brasilândia. Eis que agora o cidadão tem outro desafio: escolher o melhor nome para prefeito de sua cidade.


Acima de todas as paixões movidas mais pelo afeto do que pela razão, instala-se agora o dever de passar a limpo os três nomes que se propõem a sentar na cadeira de prefeito da cidade e governá-la por quatro anos. O ideal teria sido a promoção de um debate público entre os candidatos para que eles pudessem expor suas ideias ao vivo confrontando-as com os demais.


O isolamento social e os cuidados preventivos em relação à Covid-19 impediu isso, dificultando a exposição e acesso ao grande público, o que só foi rompido pelas mensagens, lives e vídeos postados nas redes sociais, onde o cidadão teve escassa chance de interagir com os candidatos.


Para o Executivo local concorrem três nomes: dois novos e um veterano na política. Da parte dos novatos, o candidato do PTB aventura-se heroica e quixotescamente com chapa completa, não se coligando a nenhuma outra sigla. Legenda, aliás, que traz consigo no seu histórico de vida, um rol de vitórias expressivas nos pleitos municipais em datas passadas.


Há de se lembrar dos nomes do professor José Cândido da Silva, eleito prefeito em 1988 e candidato não eleito em 1996; a professora Sandra Aparecida Louzada da Costa, candidata a prefeito, não eleita em 1992 e o médico Dr. Flávio Ercio Coelho de Vasconcelos, candidato a prefeito, não eleito em 2004.


Marco na luta trabalhista no Brasil, este partido fundado por Getúlio Vargas em 1945 detém conquistas que perduram até hoje, apesar das investidas neoliberais para destruí-las. Até a eleição passada o PTB tinha em Brasilândia 130 filiados que continuaram levando adiante o ideário do partido, entre eles o nome da saudosa prefeita Marilza Maria Rodrigues do Amaral, uma das pioneiras, que figurava em 2004 a frente da legenda.


Este é o legado que o cidadão Nilson de Oliveira (1) carrega como candidato a prefeito. Conhecido pelo epíteto Ninja, é servidor público, preside o Sindicato dos Servidores do município, tem 61 anos, nasceu em Rio Preto/SP e residente em Brasilândia há 31 anos. Politicamente, sua candidatura é uma espécie de volta ao passado quando a política era confiada àqueles que, por fazerem parte das classes populares, entendia que por elas a administração devia ser manejada. 


Distante do olhar ideológico, a roupagem nova de suas palavras alcançam os eleitores sobretudo pela emoção. De forte identificação com o povo, ele e seus 13 candidatos a vereador falam da vida cotidiana, demandas existenciais e carências que emanam da própria condição excluída da maioria do eleitorado que busca espaço no poder para ascender e fazer valer suas ideias e reivindicações.


O antigo artesão, radialista, fundador da extinta Guarda Mirim e animador da Fanfarra municipal, já foi candidato a vereador pelo PSDB em 2012 e obteve 97 votos. Não obstante, é potencialmente um dos concorrentes que mais se amolda àqueles que buscam um contato íntimo com o governante e confiam que poder de decisão que precisam dele possa emanar.


Quem o auxilia para superar os limites de seus propósitos, sem dúvida, é o candidato a vice-prefeito escolhido: o jovem Marcos Rodrigues Teodoro, de 39 anos, nascido em Panorama/SP, com instrução superiora e formação técnica industrial. Um idealista, estreante na política que, em tese, deve acrescentar com sua capacidade profissional total credibilidade e confiança de um filho da terra à candidatura do PTB ao governo de Brasilândia.


A partir dos vídeos postados nas redes sociais é possível descrever o perfil popular de Oliveira Júnior quando ele enfatiza o desejo de governar com simplicidade e transparência, com alegria e humildade, propondo uma política nova com projetos novos. Com a ressalva de que não precisa de porta-voz, não tem o rabo preso, e não vai [permitir ninguém] mamar na teta, deixa escapar seu descontentamento em face de sua antiga legenda mãe, queixando-se ainda de que muitos de seus projetos estão sendo copiados pelos demais candidatos.


Na lista de projetos que, segundo ele, são todos ótimos, estão: farmácia do povo nos bairros e distritos; retornar o esgoto urbano para a gerência do município, retirando-o da SANESUL; a construção de um balneário municipal; garantir o projeto do jovem aprendiz, em parceria com o SEBRAE, comércio e empresas. 


Enfim, defende uma administração voltada para a obra humana, conclamando a sociedade como um todo, com um detalhe surreal: a união das igrejas cristãs para, através da evangelização, abraçar e corroborar para resolver as questões sociais do município, afirmou ele em um de seus vídeos.


Sua candidatura, sob o aspecto da estratégia eleitoral pode ser entendida como um equívoco: desprezou a possibilidade de compor numa coligação com siglas que historicamente foram aliadas, e assim, participar de um projeto maior de poder. Perde, assim, o PTB, a possibilidade de aumentar suas chances de mudar o cenário da política local imprimindo, quiçá, o viés popular que seu discurso defende. 


Outro candidato que concorre ao Executivo brasilandense vem das fileiras históricas do PSDB que nestas eleições aliou-se ao novo partido PODE. A chapa tem como cabeça a candidata nascida em Três Lagoas, Léa Karla de Moura Dias (2), médica de 40 anos, e que escolheu para sua coligação o slogan Por uma Brasilândia com oportunidades justa e humana.


Sua legenda em nível nacional nasceu após a abertura política no ano de 1988 pelas mãos de Mário Covas e Fernando Henrique Cardoso, dissidentes do PMDB, na época. Aqui em Brasilândia o partido tucano detém nomes conhecidos de eleições passadas: Marilza Maria Rodrigues do Amaral, candidata eleita prefeita em 2000; Messias Pereira dos Santos, candidato a vice-prefeito, não eleito em 2008; Márcia Regina do Amaral Schio, eleita vice-prefeita em 2012 e candidata a prefeita, não eleita em 2016, entre outros.


Drª. Lea tem como candidato a vice Thiago da Silva Gonçalves, jovem de 27 anos, natural de Panorama/SP, que é estreante na política. Seu nome reforça as ideias do partido que em 2016 possuía 284 filiados e era o 2º maior partido político de Brasilândia. Está coligada ao partido PODE, nova denominação do antigo Partido Trabalhista Nacional-PTN obtida a partir de uma frase de Barack Obama: Yes, we can (Sim, nós podemos) adotada pelo partido.


A legenda do PODE, sem dúvida, agrega valor à candidatura do PSDB por se tratar de um partido que, em nível nacional, defende mecanismos de democracia direta, para a gestão pública: plebiscitos, referendos, veto popular e o direito de revogação. Renata Abreu e Álvaro Dias são líderes deste partido e propõem, entre outras coisas, que o cidadão tenha o direito de vetar leis já aprovadas, participando de todo o processo democrático.


Drª Léa, que adotou Brasilândia como sua cidade, iniciou seu trabalho como médica em 2007 prestando atendimento inicialmente no Posto de Saúde do Reassentamento Novo Porto João André, passando pela Aldeia Ofaié, Estratégia da Saúde da Família-ESF-1 no bairro Mão Amiga e também no Hospital Municipal Dr. Júlio César Paulino Maia, durante quase 12 anos.


Foram muitos anos de dedicação, acolhimento, atendimento humanizado, visitas domiciliares, correria contra o tempo em transporte para salvar vidas, foram anos de troca de experiência, aprendizado e trabalho em equipe, declarou ela em outubro de 2018 quando deixou (3) o Hospital de Brasilândia.


Suas propostas têm ressonância nas apresentações dos 25 candidatos a vereador de sua coligação, onde manifestam todo o seu empenho e interesse em contribuir para o desenvolvimento da cidade. 
Para isso elenca alternativas em favor da segurança pública querendo implantar um sistema de vídeo monitoramento para inibir a criminalidade; solicitando aumento de efetivo e viaturas para as polícias civil e militar; instalando uma unidade do Corpo de Bombeiros no município.


No campo da produção defende o apoio efetivo a projetos de piscicultura. Inova com a implantação do Gabinete Popular que cria um canal de diálogo direto com a população. No esporte, informa que irá readequar e reestruturar as áreas para a prática de esportes, tanto na cidade como no interior do município, bem como ativar a piscina do Parque Akira Otsubo. No campo da cultura se compromete reestruturar e dar maior apoio aos integrantes da Fanfarra Municipal, entre outras propostas.


A candidata recebe apoio dos deputados estaduais Mara Caseiro, presidente do PSDB Mulher do Estado, e Paulo Correia, presidente da Assembleia Legislativa; e dos deputados federais Rose Modesto e Beto Pereira que prometem dar-lhe o suporte necessário em nível estadual e federal ao seu mandato. Staff político que dá garantia de amplos canais para a viabilização de recursos para seus projetos.


Ela defende ainda no campo da Educação: escola em período integral; adequação nas creches municipais; melhorar as rotas do transporte escolar; informatizar a biblioteca municipal; implantação do programa de psicossupervisão pedagógica a alunos e professores em todas as escolas; garantir bolsas de estudos para os alunos universitários.


Já no campo da Saúde, sua área de maior conhecimento, propõe melhorar e aprimorar o que já existe acrescentando: contratação de mais médicos especialistas; descentralização da farmácia municipal; construção de um centro de fisioterapia; centro de atendimento domiciliar; Plano de Cargos e Carreiras para os servidores da Saúde, entre outras iniciativas.


A fala é comedida, a voz é do coração, e o rosto transparece beleza e sinceridade. Suas apresentações em vídeo, ao observador mais atento, o faz voltar no tempo diante de alguém tão cheia de boa vontade e idealismo que acredita ser capaz de levar amor e bem estar ao cidadão esquecido. Intenção que contrasta com a dureza do mundo atual e a astuta militância dos oponentes de menor penhor.


O terceiro candidato concorrente é Antônio de Pádua Thiago, popular Dr. Antônio (4), um veterano que está na política local há 28 anos. Concorre pela coligação MDB, DEM e PSD, com o slogan Brasilândia que eu amo. Médico de profissão, tem 60 anos e nasceu em Três Lagoas. Concorre a reeleição tendo como vice, Gabriel Baez Gonçalves, popular Dr. Gabriel, igualmente médico, 40 anos, nascido em Bela Vista.


O candidato estreou na política no ano de 1992 através da sigla do PTB, elegendo-se o 6º vereador mais votado entre os 46 que disputaram as eleições naquele ano, obtendo 178 votos. A partir de 1995, já pela legenda do antigo PMDB, ajudou a escrever a história deste partido do qual jamais arredou o pé. 


Depois de candidatar-se a prefeito em 1996 não elegendo-se, Dr. Antônio concorreu nos quadriênios seguintes elegendo-se prefeito nos anos de 2004, 2008 e 2016. Em 2012 o PMDB lançou a prefeito o nome da Profª Eurides Palharis Lins, que não elegeu-se.


Nestas eleições de 2020, valendo-se também de vídeos postados no facebook, o candidato se comunica com os eleitores apresentando o que chamou de minissérie dividida em 15 capítulos para informar e relembrar o que realizou nos três mandatos que esteve à frente da prefeitura local. No entendimento dos analistas expert em marketing ele está correto: quem busca reeleição deve falar o que fez; os novatos, falam do que se propõem fazer.


E assim tem sido o roteiro de suas lives e apresentações. Vale-se do farto rol de obras que suas exitosas administrações realizaram ao longo dos anos para mostrar a todos a marca pessoal que imprimiu nestes feitos e dividendos políticos que acumulou durante 12 anos. Sem dúvida, tal volume de brilhantes conquistas configura visível vantagem sobre os demais concorrentes, tornando-o preferido da maioria dos eleitores.


Como se não bastasse, vale-se de vasta gama de novos projetos e propostas apresentados pelos 29 candidatos a vereador que compõem sua coligação, sendo que somente três deles buscam a reeleição. Lacunas existentes na atual administração, no campo do relacionamento com a sociedade, confiam seus eleitores, caberá a ele equacioná-las.


Há, entretanto, aqueles mais exigentes que preferem, não somente relembrar as obras do passado, úteis, necessárias e aplaudidas por todos, mas também cotejá-las com o presente, alinhando-as com o futuro. Até mesmo por dever de isonomia e simetria na disputa com os demais candidatos. A correlação de forças seria explicitada e os pesos e as medidas poderiam ser mais bem avaliados na balança do entendimento que dá sustentação ao voto do eleitor.


Sua candidatura, entretanto, renova o inestimável apoio de nomes de expressões na política estadual e nacional. Demonstra o quão bem relacionado ele é na esfera de seu partido e aliados. É o que confirmam as declarações do deputado federal Fábio Trad; do ex-governador André Puccinelli; do senador Nelsinho Trad; da ministra da Agricultura, Tereza Cristina; da senadora Simone Tebet, entre outros, que manifestaram apoio à candidatura de Dr. Antônio.


Situação que lhe confere tranquilidade e conforto eleitoral, arrisco dizer. Dá-lhe quase uma garantia de vitória no dia 15 de novembro. Vitória, entretanto, que está sendo conquistada com os olhos no retrovisor da história. Realidade que mostra um consistente e progressista percurso, mas que reclama atenção ao para-brisa de um veículo social --nestes tempos líquidos, diria Zygmunt Bauman (5)--, em constante movimento.


A cada trecho da estrada, diz a canção de Belchior imortalizada pela gaúcha Elis Regina, há sempre o alerta a ser dado: cuidado meu bem, há perigo na esquina (6).

 
Aos três candidatos, portanto, cabe lembrar do risco de se menosprezar a aparente fragilidade do outro, descuidando ou subestimando suas virtudes. Pois uma coisa é certa: a decisão não está nas mãos dos candidatos e sim nas mãos daqueles eleitores que se sentirem melhor representados e respeitados a cada eleição.





Brasilândia/MS, 03 de novembro de 2020.