Rosivaldo Nascimento, há 4 anos o Cabelo nos deixou
Carlos Alberto dos Santos Dutra
Alguém me perguntou por que eu iria escrever umas palavras em homenagem ao senhor Cabelo que acabara de falecer. Isto em 2019. Sinceramente, naquela hora, eu não soube responder. Mas uma coisa lá dentro me dizia que devia fazê-lo, mesmo não sendo amigo íntimo ou membro da família.
Isso porque tem pessoas que passam pela nossa vida e não colocamos o
devido reparo, não lhes damos a devida atenção. Quando não, deixamos de lhes
agradecer o bem que elas praticaram uma, duas, três vezes ao nosso lado e não
percebemos.
Foi isso que me motivou a escrever sobre este cidadão cuja notícia de
sua morte causou a todos espanto, morte repentina e precoce, deixando um rastro
de surpresa e dor, sentimento de remorso e lágrimas, de modo especial naqueles
que lhe eram mais íntimos.
A imagem que tenho de Rosivaldo
Nascimento, o popular Cabelo, entretanto, tinha a ver com sua
humanidade. Via através de seus olhos, muito escuros e sorriso franco que
irradiava o rosto, tratar-se de um homem que ocultava o sofrimento por uma aura
de luz, revelando a quem se aproximava somente a alma boa e dedicada, fiel e
trabalhadora que comunicava.
Servidor público da Prefeitura há um bom tempo, este brasilandense de 49
anos de idade vai deixar saudade. Não talvez pelas suas poucas palavras e olhar
maroto que revelava saber tantas coisas que não ousava contar, mas sobretudo
pelo desprendimento, abnegação e préstimos da profissão de eletricista, como era
conhecido, e que exercia na municipalidade.
Mais que isso, Cabelo era, como se diz: pau para
toda obra. Homem talhado para todo o tipo de serviço, em especial aquele que
poucos se dispõem a fazer. E lá estava ele, obediente, fazendo das tripas
coração para não decepcionar seus superiores, resolvendo o problema,
seja qual fosse.
Mesmo que para isso devesse fazer a maior das gambiarras,
tão comuns no serviço público dado às dificuldades de se conseguir materiais de
qualidade para a realização dos serviços.
Sobrevivente de uma vida familiar austera e duramente provada pela dor
da doença, da separação e a distância dos seus, vivia desprendido, como se um
errante fosse, praticamente de favor, realizando-se tão somente no exercício de
sua atividade – o ofício de resolver problemas dos outros – e fazer a todos
felizes, parecendo-nos estar ele sempre em último lugar.
Era ar condicionado, torneiras, bombas, lâmpadas, motores, veículos,
portas, vidraças, alarmes, escadas, forros, fios, telhas, antenas, telefones,
enfim, um mundo de coisas para serem consertadas. Tudo lhe era confiado e, uma
vez ao alcance de suas hábeis e pacientes mãos, podia se confiar numa solução.
Até zelador de patrimônio público e privado constava no rol de suas
atividades profissionais, sempre pouco ou quase nada remunerado.
A despedida do Cabelo, mais que espanto e surpresa pela
perda do amigo (que há poucos dias esteve trocando uma lâmpada no setor onde eu
trabalho na secretaria de saúde), nos leva a pensar nestes profissionais assim
chamado serviços gerais, aparentemente tranquilos e prestativos.
Não raro eles vivem sob pressão, muitas vezes obrigados a fazer milagres para
atender às solicitações, com os parcos instrumentos e materiais que lhes são
oferecidos para o exercício de suas funções, e que ao final do dia não recebem
sequer um muito obrigado pelo êxito alcançado.
Pelos postes que instalaste e lâmpadas que voltaram a brilhar; pelos
canos de águas que consertaste e que voltaram a jorrar; pela força dos motores
que fizeste funcionar e voltaram a rodar; pelos abraços dos filhos que gerastes
e o jardim de flores e amores que plantastes, lá atrás, ao longo do caminho, e
por todo o bem que fizeste e desejaste, Deus o acolha, operário Cabelo,
merecidamente no Céu. Pelo tanto realizado, muitíssimo obrigado Cabelo.
Amém.
Fonte: Dutra, C.A.S. Quando eu me chamar Saudade, Brasilândia, MS: Edição do
Autor, 2021, pág. 143s, disponível em https://clubedeautores.com.br/livro/quando-eu-me-chamar-saudade
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