segunda-feira, 11 de janeiro de 2021

Pequena História de Brasilândia

Carlos Alberto dos Santos Dutra (1)




Tudo começou quando a estrada de ferro Noroeste do Brasil-NOB adentrou o solo sul-mato-grossense em 1914, e o povoado ainda era apenas uma ideia, um sentimento que pulsava cheio de vida no coração do cerrado. As croas de mata e o cerradão eram habitados somente pelos indígenas Ofaié, chamados de Xavante pelos primeiros colonizadores. Segundo narram equivocadamente os livros de história, esses indígenas, juntamente com os Kayapó que dominavam ambas as margens do rio Sucuriú, em Três Lagoas, atemorizavam os viajantes e exploradores que, desde 1710, faziam o percurso pelos rios Tietê-Paraná-Pardo em direção às minas auríferas de Cuiabá. Nessa época, este território pertencia ainda ao município de Santana do Paranaíba, do qual Três Lagoas era apenas um distrito.

Em 1919, a empresa norte-americana Brazil Land Cattle and Packing Company, conhecida como firma inglesa da marca Argola, de propriedade do empresário Percival Farquhar (1864-1953), adquiriu 800 mil hectares de terras na margem direita do rio Paraná, passando a dedicar-se a criação de gado bovino do tipo hereford e shourton, importado dos EUA e da Europa. Segundo consta, este gado não teria se adaptado ao clima e a rusticidade do cerrado. Mais tarde, estes animais foram substituídos pelo gado da raça zebu, trazido da região sudeste da Índia (Nelore), que era de porte mais robusto e mais resistente à intempérie e às doenças.

Na década de 1940, quando o mundo agitava-se em guerra mundial contra Adolf Hitler, as empresas estrangeiras que haviam sido implantadas no Brasil passaram a sofrer dura ação do Estado Novo, de Getúlio Vargas, que nacionalizou as propriedades de muitos estrangeiros que viviam no Brasil. Vastos territórios são encampados pela Superintendência das Empresas Incorporadas ao Patrimônio Nacional-SEIPN, que se encarrega de promover, a partir de 1949, já no governo do general Eurico Gaspar Dutra, a distribuição de terras não exploradas economicamente, através de programas de colonização, a quem se interessasse explorá-las. Para aplacar a especulação imobiliária que campeava no Estado, tendo a frente o governador Dr. Arnaldo Estevão Figueiredo, diversas firmas particulares de colonização foram criadas, entre elas a Companhia Boa Esperança Comércio de Terras e Pecuária S.A. (COTERP), de propriedade do Sr. Arthur Höffig (1912-1983) e seu sócio Alberto Amin Madi, que a partir de 1952, semeou alento a esta terra através da fundação do município de Brasilândia.

O rio Paraná sempre foi a via de navegação utilizada pelas monções, antigas expedições que desciam e subiam os rios levando progresso aos habitantes de suas margens. A partir de 1905, utiliza-se desta via fluvial também a Companhia de Viação São Paulo-Mato Grosso, que dá suporte comercial às principais cidades ribeirinhas do lado paulista através dos portos de Santo Anastácio, Porto Tibiriçá e Porto XV. O surgimento do povoado de Porto João André, na margem direita do rio Paraná se dá nessa época, configurando-se a única via de acesso ao que viria a ser o futuro município de Brasilândia. O Censo de 1940 acusava neste povoado, célula-mater de Brasilândia, uma população de apenas 147 pessoas na zona urbana.

O sonho e ousadia do patriarca e professor Arthur Höffig, escreveu José Cândido da Silva, materializou-se em 1957, quando o pequeno patrimônio composto de poucas ruas e uma praça central, viu erguer na região mais alta da cidade, uma cruz, doada pelo fundador Arthur Hoffig, que passou a ser conhecida como o Cruzeiro, simbolizando o marco da presença e da religiosidade dos que aqui aportaram. A primeira missa realizada no município, e que contou com a presença do fundador da cidade, autoridades e o povo em geral, foi celebrada pelo padre tchecoslovaco João Thomes. Produto da aglutinação das palavras do nome da antiga firma Brazil Land Cattle (Brazil=Brasil, Land=Terra, Cattle = Gado), BRASIL + LÂNDIA, foi elevada à condição de Distrito em 12 de julho de 1961, através da Lei 1.501/61.

Recebendo migrantes de várias partes do país em função de sua atividade econômica predominante, as fazendas de gado, em pouco tempo Brasilândia vê seu perfil transformado em uma verdadeira cidade, fato este que começa a despertar interesse administrativo na matriz Três Lagoas. Dois anos depois, é apresentado um Projeto de Lei na Assembleia Legislativa do Estado visando à criação do município de Brasilândia. Em 14 de novembro de 1963, através da Lei nº 1.790/63, é criado oficialmente o município de Brasilândia, sendo logo batizada com o codinome Cidade Esperança.

A instalação do município de Brasilândia deu-se oficialmente no dia 25 de abril de 1965 quando as ordens ainda vinham do Palácio Alencastro, na distante Cuiabá. Neste dia, às 10 horas da manhã, foi instalada a primeira Câmara de Vereadores. Ao tempo dessa emancipação houve quem resistisse em aceitar o seu desmembramento por se tratar da melhor parte das terras do município de Três Lagoas que perdia 11.082 Km² de sua área. Com este ato Brasilândia, através de seu primeiro prefeito, José Francisco Marques Neto, vê empossado Luiz Eugênio Primo, Manoel Ciríaco Neto, Paulo Simões Braga, Wilson de Arruda e João Carlos da Silva, seus primeiros vereadores.

No ano de 1978 Brasilândia já possuía um banco, o Banco Financial, um Cartório de Paz, tinha 46 casas comerciais, 30 escolas, sendo 26 na zona rural e teve até um cinema. A vila Debrasa tornou-se distrito e logo se transformou num grande centro produtor a gerar divisas e empregos para o município. A criação da Comarca de Brasilândia deu-se em 18 de setembro de 1986, pela Lei nº 664/86 e sua instalação deu-se em 11 de março de 1987. O distrito de Xavantina emancipou-se e foi desmembrado de Brasilândia em 1987, reduzindo a área do município para 5.806,6 km².

Hoje, a cidade respira com folga o ar do progresso. Seu orçamento, no decorrer dos anos mais que quadriplicou e os prêmios conquistados por excelência de suas administrações são reveladores do acertado caminho percorrido não somente na economia e finanças públicas, mas também no grau de maturidade e profissionalismo do corpo de servidores, diligentemente motivados e instruídos na perspectiva e horizontes largos e seus cidadãos. Sim, o tempo é o senhor da história e os desafios de ontem foram transformados em sábias e novas lições para o sucesso que hoje experimentamos. Por isso há sobejas razões para se amar e respeitar a cidade que acolheu a todos, como eternizou o nosso hino oficial.


(1) Especialista e Mestre em História pela UFMS. 

Para mais informações sobre Brasilândia acesse: https://institutocisalpina.org/executivo.html. Também em https://www.institutocisalpina.org/Historia-e-Memoria-de-Brasilandia-V1-2Edicao2020.pdf



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