O dia que o Povoado
de Brasilândia virou Distrito de Paz
Carlos Alberto dos
Santos Dutra
As ordens ainda vinham do Palácio Alencastro, de Cuiabá, capital do estado de Mato Grosso uno, sob as mãos do então governador da UDN, Fernando Correia da Costa. Corria o dia 12 de julho de 1961 e o prefeito de Três Lagoas era Francisco Leal Queiroz, do PSD. Neste dia através da Lei nº 1501/61, promulgada pelo então Presidente da Assembleia Legislativa daquele estado, Manoel de Oliveira Lima, um pequeno povoado em meio ao cerrado era elevado ao status de Distrito: Estava criado o Distrito de Paz de Brasilândia.
Tempos difíceis, diga-se de passagem, a considerar
que em menos de três anos depois o País entraria num regime de exceção onde as
liberdades democráticas foram restringidas e os chefes do Executivo de cidades
estratégicas, como Três Lagoas, passaram a ser nomeados pelo Governo Federal
que estendeu o seu mando até 1º de janeiro de 1986, quando Antônio João Campos de Carvalho foi eleito o primeiro prefeito da cidade das águas, já sob o novo regime de abertura política.
A criação do Distrito de Paz de Brasilândia e,
quatro anos depois, a sua emancipação como Município,
pode-se dizer vieram à lume sob o tom das cores verde oliva que governavam o
Brasil nesta época. No estado de Mato Grosso do Sul, que só viria a ser
desmembrado do antigo Mato Grosso em 1977, uma penca de municípios foi emancipada
neste período. Verdadeiros filhos da ditadura, viram no regime vertical uma forma de consolidar
os feitos e anseios do povo, sobretudo o povo simples e ordeiro, o brasilino desta terra.
Brasilândia assim, já não mais como Povoado idealizado pelo patriarca Arthur Höffig e
consolidada sua urbanidade pelo traçado de suas ruas projetadas pelo engenheiro
Ídolo Guastaldi sob os auspícios da empresa Companhia Boa Esperança de Terras -
COTERP, mas como Distrito, transformava o homem do campo em citadino da
urbe com acesso à energia elétrica, ao comércio e a escolaridade de nível
médio, enfim a civilização.
Sob o aspecto administrativo, entretanto, um fato curioso deste pedaço da história de Brasilândia é
importante destacar: o Distrito de Brasilândia não nasce do município de Três
Lagoas, mas sim do desmembramento do Distrito
de Xavantina. Quem nos revela esse fato é o ex-secretário de administração de
Brasilândia, Waldemar Firmino de Campos, 55 anos depois, ao confrontar a documentação
histórica que versa sobre a criação do município de Brasilândia.
A Lei nº 1501, de 12 de julho de 1961 que criou o
Distrito de Paz de Brasilândia, no município de Três Lagoas, deixa claro em seu
artigo 1º que esta instância administrativa fora criada a partir do
desmembramento do Distrito de Xavantina. Ao definir os limites do novo
Distrito, o artigo 3º da citada Lei enuncia: O Distrito terá por sede o povoado de Brasilândia, sito no divisor de
águas dos córregos Beleza, Jardim e Cabeceira Perdida.
Os limites do Distrito de Brasilândia - rezava a
Lei - partia da embocadura do rio Verde no rio Paraná, por aquele
acima até o ribeirão Água Limpa, seus afluentes da margem direita; subindo o
córrego Água Limpa, até a foz do córrego Pulador, seu tributário da margem
direita; subindo o Pulador, até a sua mais alta cabeceira; da cabeceira do
Pulador, por uma linha reta, até a extrema cabeceira do córrego Piruá, já do
sistema do Taquarussu; descendo o Piruá , até sua barra no rio Taquarussu;
descendo o Taquarussu, até a embocadura do ribeirão São Pedro, da sua margem direita; subindo o ribeirão São
Pedro, até o córrego Virginia, até sua mais alta cabeceira; daí, por uma linha
reta, até a extrema cabeceira do córrego Aldeia, afluente, pela margem
esquerda, do córrego Água Branca; pelo córrego Aldeia abaixo, até sua foz no
Água Branca; pelo Água Branca abaixo, até sua embocadura no rio Pardo abaixo,
até o rio paraná; pelo Paraná acima até a barra do rio Verde, ponto inicial.
Comemorar os 60 anos de elevação do Povoado de Brasilândia à condição de Distrito pode não dizer muito para os cidadãos de
hoje, mas para uma comunidade que, quatro anos depois, haveria de conquistar a
sua emancipação político administrativa, o que ocorreu em 25 de abril de 1965
com a eleição de seu primeiro prefeito e vice, e ter tomado posse a sua
primeira Câmara Municipal... Para aqueles que cruzaram os campos, sob a poeira
da estrada, em trilhas só frequentada por animais e carroções, quando ainda nem
estradas existiam, sob o sol escaldante, isso foi um grande feito.
Mais que isso, não fosse os ares de civilização e
progresso que vinham do Leste, varando as margens do rio Paraná, e que nutriram
a vida dos primeiro habitantes fornecendo o agasalho e o medicamento, o
utensílio e o fomento para o homem e suas criações, o povo que aqui vivia
seguiria pacholento sem notar o curso da história deste lugar.
Foi, portanto, o status de Distrito, o marco que levaria o Município
a encontrar o seu destino. Semeou os fundamentos para garantir aos que aqui
viviam a credibilidade e o respeito conferido aos feitos que realizavam, num
tempo cuja democracia ainda era uma palavra desconhecida e
distante para aqueles que já se acostumavam a obedecer e calar.
Este pequeno texto tem o condão de, apenas,
lembrar, os passos heroicos que os pioneiros que aqui viveram deram, num tempo
em que Brasilândia se resumia a meia dúzia de casas de tábua, um posto de
combustível e a famosa Três Placas, como que indicando que a única saída para este
lugar estava em deixá-lo: ou para Xavantina, ou para Três Lagoas, ou para
Bataguassu, como que se não houvesse qualquer chance deste povoado florescer.
Estava errado, entretanto, quem assim pensasse.
Aliada à força dos mais antigos que deitaram
o braço sobre o machado, a foice e a enxada formando fazendas e abrindo
estradas, lá estão eles apontando um rumo de esperança para o pequeno
patrimônio que emergia. Lá estavam João Dantas Filgueiras e Patrocínio de Souza Marinho, prefeitos de Três Lagoas nesta época, apostando
no progresso de Brasilândia.
No dia em que se comemora a elevação do Povoado de Brasilândia, que nos idos 1957 erigiu sua
Cruz fundante na parte mais alta de seu patrimônio, chegando à condição de Distrito, seus habitantes têm motivos de sobra para
comemorar este pequeno grande feito, ainda que pouco festejado e lembrado, mas
que sedimentou o caminho que viria depois ser trilhado com a emancipação do
Município e a posse do primeiro prefeito José Francisco Marques Neto. Mas essa já é uma outra história.
Brasilândia/MS, 08 de julho de 2023.
Foto: Marques Neto e trabalhadores de Brasilândia/MS em 1965 (Cortesia José Francisco Marques (in
memoriam), 2015.
Fonte: Publicado inicialmente em http://institutocisalpina.org/o_dia_que_o_povoado_de_brasilandia_virou_distrito.html
e em DUTRA, C.A.S. A emancipação político administrativa de Brasilândia In História
e memória de Brasilândia/MS, vol. I-Pioneiros, página 281s. Disponível em https://clubedeautores.com.br/livro/historia-e-memoria-de-brasilandia
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