Antônio Brand: Ele está em Nhanderu.
Carlos Alberto dos Santos Dutra
Noutra dimensão, outros chegaram mais cedo nesta terra sem males sonhada e que foi conquistada com suor e sangue pelos patrícios Lázaro, do Pirakuá; o xamã Paulito, do Panambi; Marta Guarani, do Kaguateca; Marçal Tupã-I, do Campestre; Marcos Verón, da Takuara; Nisio Gomes, de Guaiviry, e tantos outros.
Neste dia, a comunidade celeste volta a estar em festa com a chegada de mais um ilustre convidado.
Ainda mais que novo morador é um antigo companheiro de caminhada e de luta.
A chegada de Antônio Jacob Brand por aquelas verdes campinas, de todo ainda não é entendida e tão-pouco esperada, pois muitos patrícios ainda se valiam da força deste professor e parceiro de luta para redobrarem sua atenção na conquista de seus antigos territórios e direitos negados neste lugar distante chamado Mato Grosso do Sul.
De igual sorte, aqui, nosotros, desde a pampa e o cerrado à dentro, pelas matas e pantanais afora, sua partida tão cedo nos enche de perplexidade e dor. Não tem como não chorar a perda –para nós que aqui ficamos--, desse, que se fez sempre igual, amigo e companheiro, cheio de ardor missionário, que nunca desanimou ou deixou de acreditar na capacidade do indígena de superar os desafios impostos a cada momento, e sempre colocado sobre seus ombros.
Conheci Antônio em 1985 e devo a ele minha militância indigenista.
Mais do que me estender a mão, trazendo-me lá do Rio Grande para o Centro-Oeste, coube a ele apresentar-me aos Ofaié e a partir daí deles nunca mais me separei, acompanhando-os no curso da história, pelos caminhos da vida e da morte.
Assim também foi com o amigo Antônio: celebrou um pacto de vida com os povos indígenas, especialmente com o povo Guarani, depois de mais de vinte anos de CIMI, secretário zeloso e construtor de pontes do saber, permitindo emergir os que viviam na margem, deu visibilidade a uma luta de povos esquecidos pela história e negados pela política dos homens.
Ah, Antônio Brand, quanta falta você nos faz.
Mesmo agora, quando, nos últimos anos, contribuías para a academia, na UCDB, ainda assim semeavas luzes aos professores da vida, aos dirigentes das nações, aos administradores das coisas e das políticas, abrindo clareiras em meio ao agronegócio em defesa do direito a vida do homem de rosto e coração indígenas desta terra Guarani e Ofaié, Kadiwéu e Terena, Guató e Kinikinau.
Imprescindível.
O indigenismo no Brasil, desde 2 de julho de 2012, está de luto.
Não tem como não deitar lágrimas pela perda deste doutor historiador de envergadura impar que construiu sua história juntando os pedaços da história dos outros, dos esquecidos, sempre pelas bordas das aldeias enfumaçadas, trazendo-as,como sujeito, para o centro do debate.
Mais um pouco e lá o encontramos pela poeira das estradas, no fundão das fazendas Dourados adentro, lugar onde o indígena encontrava guarida da pólvora, na fuga do latifúndio e pretório de todas as ordens que lhes são adversas.
A nação Guarani celeste que soçobrou desses embates há de saudar Antônio Brand com as honras que merece, pois ele trilhou o caminho do bem na busca da Justiça e travou o bom combate. Assim, também, o atleta não recebe o prêmio, a não ser que tenha lutado segundo as regras, é ao agricultor que trabalha duramente, que cabem em primeiro lugar, os frutos da colheita (2Tm 2,5-6).
Irmãos Guarani, acolham bem o nosso irmão Antônio, e que neste guaxiré eterno não falte a chicha da redenção para que ele recupere o fôlego da caminhada (para outras campereadas) nos braços de Nhanderu.
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