domingo, 2 de dezembro de 2018

A Educação sobre rodas: Motorista Professor.


Carlos Alberto dos Santos Dutra


Corria o ano de 1996 e a Educação garantida aos filhos de Brasilândia neste tempo que hoje é só lembrança, acontecia pelos desvãos das empoeiradas estradas que ligavam o campo à cidade e nele o progresso que aos poucos a todos foi alcançando.

No distrito Debrasa, sacolejando lá vai um ônibus mercedes-benz de cor bege arrebanhando alunos, entre porteiras e cercas, gado e seriemas, adentrando o coração das fazendas que vão surgindo entre ipês, pequis e carandás.

Fátima, Jesuíta, Córrego Azul, Modelo, Miracema e arredores da Debrasa uma a uma vão acolhendo o frescor da juventude e inocência pelas mãos dos motoristas até chegar à Escola para beber do saber e o desafio do amanhã.

Heráclito Luiz da Silva era o professor da estrada. Assim como outros, na pessoa de Alessandro Gonçalves da Cruz e seu mercedes-benz de cor verde, ou os proprietários das famosas peruas Kombi encarregadas de transportar docente e discente por caminhos nativos, do conhecimento de muitos, em especial dos alunos que por lá trilharam essa educação sobre rodas.

E lá estão, muito cedo, aquelas meninas brancas, de rodas, céleres, cortando o município rumo ao Porto João André, fazendas Modelo, Córrego Azul, Antares, Boa Esperança e Vista Alegre, pelas mãos prestativas do Sr. Auri Vieira dos Santos recolhendo o bem mais precioso -- os filhos --, de pais que fitam de longe, vê-los transformados em cidadãos de bem.

Enquanto isso, esses pupilos aguardam, pacientes, junto à porteira ou sob uma árvore, protegendo-se do frio ou do sol, que nasce muito cedo para os que precisam vencer distâncias no tempo da discórdia e na história das injustiças.

Nos trajetos mais longínquos, o dia parece noite e a linha da Fazenda Pontal, feito pela Kombi do Sr. Jesumiro Olimpio de Lima, ou a linha da Barra Bonita, realizada pela Kombi de propriedade da Srª Silvana Alves, é trajeto seguro para o aluno aplicado mesmo que retorne sonolento e cansado para os braços da família.

Alunos e pais permanecem olhando para o amanhã, entre o cerrado e a estrada, enquanto o veículo se esconde no bambusal do caminho. Sentem conforto e confiança em saber que há um futuro para seus pequenos e frágeis tesouros.

Quanto aos professores, que também viajam no itinerário deste aprendizado, por dever e cotidiano de luta, sonham em ver aqueles rebentos, que também são seus, formados, colocados no mundo das realizações e das oportunidades que todos desejam.

O amanhã logo chegará. Mais uma parada, mais uma porteira a ser aberta, mais um viagem cumprida, rompendo o silêncio, mesmo que o gado estoure e o vento balance com força o junco da cana que a cada ano parece mais viçosa. E lá vai ficando para trás as fazendas Jatiúca, Pioneira, Gameleira, Santana e tantas outras...

Um pouco mais adiante, e o pipilar estudantil chega à escola da Fazenda Araponga. Ah, que saudade. O veículo-escola do Sr. Alcides Raimundo abre a porta e os sonhos, a passos largos, saem todos correndo, enquanto uma brisa de esperança e futuro dá sinal de querer entrar.

É fim de aula, é fim de um ciclo. Um novo amanhã que chega. Os motoristas do transporte escolar, que foram e muitos deles ainda permanecem, eles continuam sua missão. Vinte e dois anos se passaram. Mas a lembrança dos mestres da estrada permanecem. Obrigado motorista-professor... Parece que foi ontem. 



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