O
losango da fé e a homenagem aos pioneiros da Paróquia Cristo Bom Pastor.
Carlos Alberto dos Santos Dutra
Homenagear é um gesto que poucos praticam. Ser homenageado, em consequência, é ainda mais raro. No campo das lembranças que passam céleres diante dos nossos olhos, ao historiador e seu olhar de biógrafo só resta percorrer amiúde a trilha dessas saudades e recolher as pétalas de flores, também os espinhos, daqueles que aqui pisaram e deixaram ao longo do caminho, a sua marca. Sobretudo o alvitre de realizações de homens e mulheres que se destacaram na comunidade prestando serviços relevantes para sua gente.
Quando o engenheiro de obras, Antônio Henrique Filho
começou a demarcar as ruas e praças da futura cidade de Brasilândia, o
patriarca Arthur Höffig já havia decidido que no ponto alto da cidade,
próximo ao Cruzeiro que fora implantado ainda nos idos 1957, seria assentada
ali uma praça. O mapa original da empresa Boa Esperança Comércio, Terras e
Pecuária S.A (COTERP), com a lavra do engenheiro Ídolo Guastaldi, assinala a Igreja Matriz plantada bem no centro da
praça, circundada por um losango, afetuosamente postado, como que olhando e
abençoando a cidade que nascia a seus pés.
A Igreja foi construída muito tempo depois, graças ao esforço da
comunidade e da perseverança pastoral das irmãs vigárias da Congregação das Missionárias
de Jesus Crucificado e os primeiros párocos que assumiram a incipiente Paróquia
Cristo Bom Pastor com afinco e dedicação nos anos que se seguiram.
Com o revigoramento da Praça da Matriz denominada pela Lei
2.440/2011 de Praça Anísio Gomes de Almeida, eis que o local se transformou
em um marco definitivo da história, onde a fé se encontrou com o turismo e a
cultura abraçou o esforço dos cidadãos e a administração pública.
É neste contexto que os projetos de lei apresentados pela
vereadora Márcia Regina do Amaral Schio, aprovados pela Câmara Municipal
de Brasilândia se inserem, quando buscam homenagear os quatro primeiros administradores paroquiais desta cidade que por aqui exerceram atividades religiosas e
humanitárias de relevo, e que
lutaram para ver concluído o sonho da construção de uma Igreja humana e celeste
que perdura até os dias atuais.
Ao conferir o nome destes administradores paroquiais – Padre
João Tomes, Irmã Abigail Dias Batista, Padre
Tadeu Kolodziejczyk e Padre Lauri Vital Bósio -- que foram os pioneiros na evangelização nesta
terra, se completa a constelação do losango ressignificando o entorno da Praça
da Matriz.
O reconhecimento público a estes quatro
ícones da evangelização, sem dúvida, é uma dessas agradáveis lembranças que deverão
permanecer na história desta terra. A despeito do tempo que passou, desde que
aqui chegaram e fincaram na terra os fundamentos do catolicismo, seus feitos
ainda hoje são guardados na memória e nas lembranças dos munícipes mais antigos.
Nominar as Travessas do entorno deste espaço simbólico conferindo
o nome de ruas a esses religiosos que muito fizeram pelo povo desta terra, é
mais do que um feito da política partidária, é colocar uma coroa de flores sobre
a memória da cidadania que enobrece as diagonais e travessas desta Praça enaltecendo
o seu valor histórico e cultural.
As Travessas A, B, C, e D que contornam a Praça da Matriz e
que recebem o nome de personalidades brasilandenses que já faleceram, como
exige a Lei Federal 6.454/77, e também em respeito à Lei Municipal 2.063/05 que
proíbe a mudança do nome de ruas e logradouros públicos nesta urbe, o gesto da
Casa do Povo local, agora sancionadas pelo prefeito municipal através das Leis
nº 3.038/2023; 3.039/2023; 3.040/2023; 3.041/2023, faz uma justa homenagem a
todos os cidadãos que por esses guardiões da fé foram beneficiados e, por
conseguinte, devem se sentir, aqueles, igualmente agradecidos e homenageados.
Biografias:
O Padre João Tomes é o primeiro (1). De origem tcheca, nascido em 20 de maio de 1918 na cidade de Frystak, Checoslováquia, era um educador e, ainda muito jovem, foi enviado pelos seus pais ao Colégio Salesiano de sua cidade natal. Ele chegou ao Brasil em 1936, com 18 anos de idade, tendo se fixado inicialmente em Cuiabá, onde deu continuidade a seus estudos e a vida sacerdotal sob a supervisão de Dom Aquino Correia. Em 1948 se transferiu para Três Lagoas, onde, em 1950, construiu a casa paroquial da futura diocese, inaugurando a tradição das grandes procissões religiosas, dos desfiles do patronato da Vila Vicentina e das festas do Bom Jesus da Lapa, com grandes leilões.
Considerada uma das mentes brilhantes da época, foi o responsável pela construção de inúmeros prédios, escola, salão paroquiais, capelas e igrejas, entre elas a primeira capela da antiga Xavantina e a primeira igreja matriz de Brasilândia. No dia 18 de junho de 1956, na sede da fazenda Boa Esperança realizou um dos primeiros casamentos que se tem notícia, e que teve por testemunhas Antenor Fonseca, um dos fundadores de Brasilândia que nesta época já trabalhava para o patriarca Arthur Höffig e Luiz Teixeira de Carvalho. Foi o Padre João Tomes que, no domingo de Páscoa do dia 21 de abril de 1957, celebrou a primeira missa campal no povoado, sendo ali encravado um Cruzeiro de madeira pelo fundador do patrimônio, que deu origem a cidade, sendo que o local se tornou, com o tempo, marco cultural da cidade. Ele faleceu em Três Lagoas, em 27 de maio de 1980.
Outra homenageada é a Irmã Abigail Dias Batista (2). Pertencente a Congregação das Irmãs Missionárias de Jesus Crucificado, a Irmã Abigail Dias Batista foi a primeira administradora paroquial a coordenar os trabalhos pastorais quando da criação da Paróquia Cristo Bom Pastor no dia 25 de junho de 1972, que foi desmembrada da Paróquia Santa Luzia, de Três Lagoas. Por dez anos, sob sua coordenação, a nova Paróquia, ainda ligada à Diocese de Campo Grande, foi uma das pioneiras nesta terra de Brasilândia e Xavantina.
Presentes na região de Três Lagoas, desde 1950, a Congregação das Irmãs Missionárias de Jesus Crucificado permaneceu coordenando a Paróquia Cristo Bom Pastor, de 1972 até 1982, quando da chegada do primeiro pároco de Brasilândia. Ao lado das irmãs Margarida, Zélia, Nair, Geralda e outras, a irmã Abigail desenvolveu todas as atividades pastorais e sacramentais durante os primeiros anos no povoado logo transformado em vila. Foi a irmã Abigail que realizou o primeiro batizado na Paróquia que ocorreu no dia 4 de junho de 1972, bem como o primeiro casamento, presidido por ela no dia 24 de julho de 1972. A irmã Abigail faleceu em 2019 aos 90 anos de vida dedicada a missão.
O terceiro homenageado é o Padre Tadeu Kolodziejczyk (3), que era membro da Congregação da Missão de São Vicente de Paulo, vindo do Estado do Paraná, e tomou posse na Paróquia Cristo Bom Pastor no dia 17 de janeiro de 1982 como primeiro pároco, e permaneceu em Brasilândia por dois anos.
Ele nasceu na Polônia no dia 27 de
agosto de 1932 e ordenou-se sacerdote em 24 de junho de 1956. Chegou ao Brasil
em 1957, tendo atuado em diversas paróquias do Sul e Centro Oeste brasileiro.
Por ocasião de sua posse em Brasilândia, consta que a irmã Missionária de Jesus Crucificado, Aparecida Guimarães, que havia sido transferida de Brasilândia para a Prelazia de Coxim, retornou à Paróquia Cristo Bom Pastor para auxiliar a irmã Geralda que coordenava os preparativos da recepção aos convidados juntamente com as irmãs Nair e Judith que aqui permaneciam.
Durante o apostolado do Padre Tadeu em Brasilândia ele se revelou um fiel e bom amigo da comunidade, participando ativamente da vida religiosa da igreja, celebrando em fazendas e sítios, tornando-se muito amigo da família do sr. José Ferreira da Silva, onde sempre foi muito bem recebido celebrando ali por diversas vezes. Da mesma forma participava das festas comunitárias e atividades do cotidiano que envolviam a pequena vila que emergia.
Homem alegre e amante de pescarias, seguidamente era convidado por moradores para acampar na beira dos rios da região, o que sempre aceitava com a satisfação de um bom apreciador da atividade, lamentando muito quando voltava para casa sem trazer um bom pescado. Padre Tadeu faleceu no dia 30 de janeiro de 1996, sendo sepultado em São Miguel Tomás Coelho, na cidade de Araucária/PR. Após sua morte, foi homenageado tendo seu nome conferido a ruas nas cidades de Santa Rita do Pardo/MS, Campo Largo/PR, e Araucária/PR.
O triangulo da fé, formado pelas travessas que circundam a Praça da Matriz não estaria completo sem o nome do Padre Lauri Vital Bósio (4), que é o quarto nome homenageado. Vinculado à Congregação da Missão São Vicente de Paulo, ele foi o segundo pároco nomeado para Brasilândia, tendo permanecido em Brasilândia por 26 anos, até 8 de março de 2010, animando e consolidando a presença da hierarquia da Igreja junto à comunidade católica local.
Detentor do título de Cidadão Brasilandense, concedido pela Câmara Municipal em 1999, era natural de Campo Mourão, Paraná, tendo nascido no dia 21 de fevereiro de 1955. Filho do casal Artemiro e Nair tinha como irmãos: Laurice, Artenor, Luiz, Narte José, Marco Antônio, Márcia Aparecida e Clistenes Natal, que também é padre vicentino.
Seus estudos tiveram início no Grupo Escolar Marechal Cândido Rondon e Colégio Santa Cruz, em Campo Mourão/PR. Ingressou no Seminário Menor São Vicente de Paulo em Araucária/PR em agosto de 1968, onde estudou até o ano de 1976, concluindo o 2º grau e a Filosofia.
Em 1977 entrou para a Congregação da Missão de São Vicente de Paulo, cursando a teologia no Studium Theologicum, em Curitiba, até o ano de 1980. Enquanto estudante, ao fazer exames médicos, foi constatado que era portador de uma doença rara na época: distrofia muscular, tendo dificuldade no andar, subir escadas, etc. E para ser ordenado sacerdote, precisou de uma licença especial do Santo Padre, o papa João Paulo II, e que foi concedida.
Depois de ordenado, atendendo ao
convite do bispo Diocesano de Três Lagoas, Dom
Izidoro Kosinski, que foi seu superior no tempo de seminário, veio para
Brasilândia chegando aqui no dia 5 de fevereiro de 1984, quando tomou posse
como pároco, sendo no mesmo ano nomeado pelo bispo como Vigário Geral da
Diocese, cargo que ocupou enquanto permaneceu na diocese. Padre Lauri afastou-se da Paróquia por motivo
de saúde, em abril de 2010, vindo a falecer 8 anos depois, em 8 de setembro de
2018, tendo sido enterrado na cidade de Capitão Leônidas Marques, no Paraná.
(2) Lei 3.039/2023, de 04 de setembro de 2023, que “Dispõe sobre a
denominação da Travessa B, localizada no entorno da Paróquia Cristo Bom Pastor,
no centro de Brasilândia-MS de Rua Irmã
Abigail Dias Batista, e dá outras providências”.
(3) Lei 3.040/2023, de 04 de setembro de 2023, que “Dispõe sobre a
denominação da Travessa C, localizada no entorno da Paróquia Cristo Bom Pastor,
no centro de Brasilândia-MS de Rua Padre
Tadeu, e dá outras providências”.
(4) Lei 3.041/2023, de 04 de setembro de 2023, que “Dispõe sobre a denominação da Travessa D, localizada no entorno da Paróquia Cristo Bom Pastor, no centro de Brasilândia-MS de Rua Padre Lauri Vital Bósio, e dá outras providências”
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