segunda-feira, 14 de abril de 2025

 

O pedal da fé, nosso mensageiro Léo Uchoa

Carlos Alberto dos Santos Dutra


 









Olho a estrada e o que vejo?

Um menino sorridente

Cruza estradas reluzentes

Todo cheio de confiança

Leva na garupa, quase nada,

Água, mochila e esperança.

 

Mas qual será o motivo?

Daquele jovem intrépido

De sair de sua cidade

Mostrar força de vontade

E montar no seu pedal

Da fé, forte e esplendorosa

Sua devoção religiosa

Para encarar a estrada

Que lhe palpitava no peito.

 

É força que vem do alto

Que nem mesmo ele sabe

Dentro da alma não cabe

Explicar o que acontece

Mal o dia amanhece

Já lhe desce pelas mãos

Lhe ilumina as viseiras

Luvas, pernas, joelheiras

Voam asas coração.

 

Carrega desejos tantos

Dos muitos que nós queremos

Os sonhos que alimentamos

As promessas que fazemos

A gratidão que devemos

São tantas coisas, sabemos

Que tentamos realizar

Cedo ou tarde, nós podemos.

 

O vento acaricia o rosto

E o capacete brilha

A lembrança da família

Pelo trecho, a saudade

Gestos de fraternidade

Lhe animam no caminho

Mil KM, longa estrada

Por muitos acompanhada

Redes sociais, camaradas

Gente rezando e torcendo

Pra não ir esmorecendo.

 

E lá vai nosso guerreiro

Rumo à cidade da Santa

Aparecida que encanta

Mãe devota dos andantes

Que chegam a pé, confiantes

Ou em bike dos fundões

Caravanas, multidões

Todos querem abraçar

A Senhora Aparecida

Para lhe agradecer

Ter chegado ali e viver

De uma graça recebida.

 

Os 10 dias se passaram

Ei-lo aqui o viajante

Com o seu rosto marcante

Que valente suportou

A Chuva e o frio superou

Garantindo a vitória

A chegada é a glória

Óh! menino resiliente

Olha a cidade contente

Que te acolhe emocionada

Rompe a linha da chegada

E pelo amor que espalhou

A Santa Mãe o abençoou.

 

Brasilândia/MS, 14 de abril de 2025.

 

Fonte: De bike e com muita fé, ciclista de Brasilândia faz peregrinação até Santuário de Nossa Senhora Aparecida - Perfil News; (1) Facebook

 

 

 

 

 

sábado, 12 de abril de 2025

 

O sonho, a luta e o título da terra

Carlos Alberto dos Santos Dutra


 



 


A entrega do título que garante aos atuais moradores dos reassentamentos Santana e Santa Emília é um acontecimento que deve ser comemorado. Receber das mãos da atual Prefeita Márcia Amaral e seu vice Fábio Toledo, o documento que os torna definitivamente proprietários de seu pedaço de terra, sim, é digno de aplauso. 

É uma demonstração, não somente de respeito ao cidadão devolvendo-lhe o que lhe é de direito, mas uma demonstração de reconhecimento pelo esforço realizado por uma comunidade que permaneceu firme na caminhada não abdicando de seus sonhos, travando suas lutas e almejando direitos e conquistando a vitória. 

O gesto que ocorreu no dia 11 de abril de 2025 último, mês em que Brasilândia/MS comemora 60 anos de emancipação político administrativa, também tem o mérito de acontecer pelas mãos de uma das filhas da mulher que tudo fez por aqueles reassentamentos, entre outros, impulsionando-os para vê-los florescer: a saudosa Prefeita Marilza do Amaral. 

Realidade que ainda pulsa no coração de muitos, mas sobretudo no coração de uma mãe que, do alto, vê o que tudo acontece. Em especial, os eventos realizados nos primeiros 100 dias do primeiro mandato de sua filha guerreira e vitoriosa: Márcia Amaral. 

Alegra-se em ver a coragem desta menina capaz de revelar a todos para onde o seu olhar aponta e qual a intenção do seu coração: os braços do povo e o seu labor. 

Ah, como bem sabem e sentiram na carne os que hoje lá residem como é bom serem reconhecidos, ouvidos e atendidos pela administração pública. Egressos de lutas, contra a poderosa Cesp, inicialmente classificados como mão de obra atingida pela barragem de Porto Primavera que os arrancou das margens do rio Paraná, foram tratados como números em planilhas de custos. 

Colocados em barracos de lona, acampados numa encruzilhada, em uma área prometida que depois foi loteada e transformada em reassentamento, recebem como prêmio uma casa provisórias, de madeirit, de somente um cômodo para sobreviverem. Somente depois de muitos protestos e reivindicações a voz destes pioneiros foi ouvida. 

E lá está a lembrança de seus primeiros nomes: Jaconias, José, Francisco, Domingos, Sebastião, Claudinei, Nilza, João, Fátima, Osvaldo, Pedro, Silvano, Raimundo, Benedito, Aparecido, Augusto, Sérgio, Mercedes, Laurindo, Manoel, Silvio, Júlio, Altair, Veridiano, Damiana, Gilberto, Antônio, Aparecido, Ademir, Andreia, Joel, Gersina, Édson, Sebastião, Lauro, Josielmo, Ismael, Anacleto, Durvalino, Rosalino, Luciano, Adriana, Roberto, João Brito, Nivaldo, Vandir, Jonas, Eurides, Altair, Aristide, e tantos outros pioneiros entre os que não soçobraram. 

Muitos deles perderam batalhas, sucumbiram, desistiram, foram enganados, e aos poucos, diante da falta de perspectivas para o lugar, foram entregando seus lotes acuados pelas dívidas acumuladas que os forçava a vende-los a preço venal. A infraestrutura prometida nunca lhes alcançou. O que era para ser desenvolvimento, só lhes trouxe desencantamento. 

Muitos deles, entretanto, resistiram e continuaram na luta sendo incentivados pelos novos moradores que foram se achegando com ideias novas e aptidão para o cultivo da terra, semeando alento ao lugar. 

E, assim como dizia minha mãe: ‘o que não tem remédio, remediado está’, o Reassentamento Santana e Santa Emília irmanou-se com os que foram adquirindo lotes unindo forças com o poder municipal solidário com seus sonhos e a influência do novo olhar e o novo tempo lhe se abria para todos eles. 

Hoje, passados 27 anos destes acontecimentos primeiros, pelas mãos de tantos filhos e herdeiros desta luta, cá estão estes pequenos proprietários de terra, revestidos do merecido manto de louvor que sobre seus ombros é colocado homenageando braços e mãos que venceram e têm razões de sobra para comemorar.  

Parabéns Reassentamento Santana e Santa Emília, e todos os que fizeram parte da história de luta e superação. Parabéns APASF e demais associações e entidades que sedimentaram este chão oportunizando a todos, com toda a sua dignidade, aqui chegar. Parabéns administração Márcia Amaral e sua equipe por tornar este sonho possível. 

Brasilândia/MS, 12 de abril de 2025.

 

Fonte e Fotos: Joana Nogueira in (2) Facebook; Dutra, C.A.S. História e Memória de Brasilândia/MS, volumes I-Pioneiros; II-Patrimônio; III-Cidadania; IV-desenvolvimento; e V-Poderes. Disponível para consulta na Biblioteca Pública Municipal de Brasilândia Professora Abadia dos Santos, e para aquisição no site: Carlos Alberto dos Santos Dutra - Clube de Autores

 

 

 Casal do Reassentamento Santana recebe mudas de seringueiras. (Foto: Jornal da Cidade, 2008).



O agricultor Vitalmiro Dias, do Reassentamento Santana e a abóbora gigante, de 33 kg, colhida em sua propriedade onde também planta milho, batata, feijão, jaca, caju, abacate, coco entre outros (Foto: Cidade Morena, 18. Fev.2009).

 





 No Reassentamento Santana, o agricultor João Brito de Souza prepara em seu viveiro mudas de plantas nativas para o reflorestamento de áreas degradadas e frutíferas em sua propriedade (Foto: João Brito de Souza, 2009).

 


João Brito de Souza e o Acampamento da Mão de Obra Atingida. (Foto: Arquivo João Brito de Souza, 1999).



Reunião com os moradores do Assentamento Santana e Santa Emília discutindo o Estatuto Social da APASF (Foto: Dutra, 2004).



Moradores do Assentamento Santana e Santa Emília vão ao Fórum da Comarca a procura de seus direitos (Foto: Independente Notícias, 2004).



Oleiros da Barranca do Porto João André reunidos com a Administração Municipal de Brasilândia (Foto: Jornal Dia a Dia, 1998).  



Reunião dos ribeirinhos da Mão de Obra Atingida pela barragem da hidrelétrica de Porto Primavera (Foto: Jair Bezerra Xavier/Jornal da Cidade, 2000).



Líder dos ribeirinhos do rio Verde e Paraná, João Brito de Souza, acampado na entrada da fazenda Santana exige da CESP a criação do Reassentamento Santana. (Foto: Jornal Dia a Dia, 2000).

 



Reunião dos Oleiros, pescadores, comerciantes e comunidade do Porto João André com a CESP, autoridades do município e lideranças do Estado (Foto: Miesceslau Kudlavicz, 1998).


quarta-feira, 2 de abril de 2025

  

Roni Eliandes Avá Verá está em Ñhanderu.

Carlos Alberto dos Santos Dutra.


 

Dia 2 de abril de 2019 foi o dia que o nosso irmão indígena Roni Eliandes, o Avá Verá, da nação Guarani, partiu para os braços de Ñhanderu, deus da natureza e dos guerreiros que acolhe aqueles que pisam a Terra Sem Males e partilham sob empréstimo a sua posse entre seus patrícios e também nós.

Falar de Roni Eliandes é como falar do tempo. Sempre infinito enquanto dura. Mas sempre presente nas ações e nos acontecimentos. Ele era assim, desde pequeno interessado nas coisas do seu povo, suas lutas e suas esperanças.

Guarani por excelência, tanto os Ñhandeva como os Kaiowá da região de Dourados/MS, todos se sentiam representados pela sua liderança, desde os tempos de Marçal de Souza Tupã-i, o Deus pequeno, que era seu tio e que sempre lhe serviu de inspiração.

Como a vida de todo grande líder, sua trilha foi penosa. Filho de Vicente e Odete, assim que nasceu Roni foi separado de seus pais, sendo levado para uma aldeia na cidade de Amambay, para morar com uma tia e os avós maternos. Aos três anos de idade voltou a morar com seus pais que se mudaram da fazenda para a aldeia.

Em sua casa todos eram bilíngues: falavam a língua Guarani e o Português. Aprendeu a falar ambas as línguas com sua avó paterna de nome Maria, que dominava este idioma e instantaneamente já traduzia para o Português. Falar na língua nativa de seu povo para ele sempre foi motivo de orgulho e de um profunda inspiração histórica.

Morava em casa de sapê, e nunca teve muito tempo para brincadeiras: sua única ocupação era ajudar nos trabalhos de casa e na lida no campo. Frequentou a escola da Aldeia por apenas uma semana, quando tinha nove anos. Isso porque ele brigou com a professora que lhe aplicou um corretivo de palmatória.

Ele mesmo, anos mais tarde numa entrevista confirmou isso: derrubou a professora e saiu em disparada com seu cavalo. Chegando em casa, deixou o cavalo amarrado na cerca e fugiu para a estrada, onde encontrou um fazendeiro que passava e ia pra região de Campo Grande. O fazendeiro perguntou-lhe o que ele estava fazendo ali naquela estrada, e ele disse estar procurando alguém que lhe desse trabalho.

Roni então foi embora com esse fazendeiro, sem avisar ninguém de sua família, deixando todos preocupados, que passaram dias procurando o rapaz, depois desistiram. Um ano depois ele retornou à sua casa, com alguns trocados no bolso, e foi uma alegria para sua família. Estava cumprido o rito de passagem. Ele agora era um homem.

Quando falou que iria retornar para a fazenda para poder dar continuidade ao seu trabalho, o pai o seguiu, e trabalhou por algum tempo com seu filho na mesma fazenda. Trabalhou lá até os doze anos. Exemplo assim, não se verifica mais nos dias de hoje.

Depois da morte do pai, saiu da aldeia e foi para o Paraguai morando em várias fazendas por lá. Aos 17 anos retornou para a aldeia e ingressou no Exército, do qual desertou por medo da guerra, voltando então para os trabalhos em fazendas, até retornar para a aldeia aos 22 anos.

Roda o moinho do tempo e Roni Eliandes, homem feito, e experiente da vida e maduro, assume a condição de líder para o seu povo. E como toda a liderança combativa, logo entrou em conflito com os poderosos. Também sofreu a oposição de alguns patrícios simpáticos ao lucro fácil e seus próprios interesses. Mas nunca virou as costas para o seu povo.

Nunca se sentiu um vencido, nunca desanimou. Manteve-se firme na luta em defesa daqueles que mais precisavam. E olha lá ele novamente com o pé na estrada acompanhando uma réstia de patrícios retirados do Rancho Jacaré e aldeia Guaimbê, todos largados junto dos Ofaié no fundão da serra da Bodoquena, em Porto Murtinho, na Reserva Kadiwéu.

Foi lá que ele conheceu os Ofaié, integrando-se à luta desse povo desconhecido e minúsculo. Laços de solidariedade e compromisso os uniram a ponto dele se tornar um membro da família Ofaié, ao casar com Marilda, nossa professora e mestra maior e ter com elas os filhos Gilmar, Elizângela, Léia e o pequeno Josimar que o céu muito cedo levou.

De lá para cá, após o desterro de oito anos na Bodoquena, os passos que se seguiram só sedimentaram a amizade e o respeito entre duas culturas diferente, rompendo com a lógica verificada no passado eivada de brigas e ataques havidos entre os Guarani e os Ofaié, chamados Chavante naqueles tempos primeiros.

Logo seus outros filhos, Agenor, Laureano e Miguel vieram para Brasilândia e, definitivamente integrado aos Ofaié, constituíram suas famílias, fortalecendo os laços étnicos que caracterizam o povo Ofaié e o povo Guarani fazendo renascer a esperança desta nação ressurgida.

Hábil artesão fez questão de ensinar aos filhos o artesanato indígena, como arcos, flechas, penachos, maracás, com a preocupação de, algumas vezes, imitar o artesanato Ofaié, valendo-se dos mesmos materiais que utilizava nas peças de sua própria cultura material. Ensinou o Guarani para os filhos e a esposas. Fez isso por achar importante preservar o idioma nativo que aos poucos vai se acabando.

Quando perguntado certa vez por Márcio de Souza Sicílio, promotor cultural de Brasilândia, qual era o seu maior sonho, Roni respondeu: “Que haja mais união entre os índios da comunidade onde vivo, e que todos recebam tudo em partes iguais”. Ele concebia o poder como um serviço para garantir a partilha dos benefícios sem excluir ninguém. Era um sábio.

Nesta data a lembrança do nosso patrício, Roni Eliandes, se esvai, há poucos dias de completar 86 anos de idade ele se despediu de nós. E levou consigo uma boa parte da história e lembranças do povo Ofaié que conviveu por quatro décadas ao seu lado.

História que ele mesmo, sentado em sua cadeira de roda, gostava de contar aos visitantes que recebia, sempre sorrindo e gesticulando, como se desenhasse as cenas vividas no ar. Um verdadeiro poço da sabedoria indígena, coisas que somente os velhos e anciões dos povos mais antigos do Brasil sabem fazer e muito pouco valorizamos.

A ponto do Museu da Pessoa, da UNESCO, recolher o seu testemunho de vida e registrá-lo num vídeo que se encontra no youtube (cf. abaixo o vídeo) a disposição de todos que queiram entrar em contato com esse saber indígena que não morre e vai viver através das palavras e imagens que esse ancião Guarani deixou para os anais da história.

Quando ainda possuía força e saúde, mesmo de muletas, lá estava ela à beira da estrada empoeirada pedindo carona para ir até a cidade fazer suas compras e negócios. Pouco dependia dos outros. Havia certa dignidade no seu olhar e gestos, sem nunca deixar de ser prático nas exigências do cotidiano.

Rodeado de alunos e pesquisadores acadêmicos prendia a atenção de todos contando a história de luta do povo Ofaié, sendo às vezes confundido com se um deles fosse. Durante sua vida aprendeu a defender e respeitar a comunidade que o acolheu, desde os tristes dias de sofrimento na Reserva Kadiwéu, passando depois pela barranca do rio Paraná e por fim instalando-se no território tradicional Ofaié, na Aldeia Anodhi, em Brasilândia/MS, onde constituiu família, teve uma nova vida e onde deixou saudade. Descanse em paz Roni Eliandes, Avá Verá, nos braços de Ñhanderu.

 

Brasilândia/MS, 2 de abril de 2025. 

Publicado originalmente em 2 de abril de 2019 em http://www.institutocisalpina/roni_eliandes_ava_vera_esta_em_nhanderu.html






 

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domingo, 30 de março de 2025

 

Como vim parar aqui: a história de uma imagem.

Carlos Alberto dos Santos Dutra


 

Vejo a fotografia de fiéis da Paróquia Cristo Bom Pastor, de Brasilândia/MS postados ao lado de seu pároco, diante da imagem de Nossa Senhora Aparecida, lá no Centro Diocesano de Pastoral de Três Lagoas, durante o Encontro Foranial do último final de semana. 

Entre os presentes é possível observar um rostinho negro que se encontra entre eles e que, com certeza, os motiva a congregar e louvar. Rosto capaz de recordar em nós o que a imagem desta santa nos faz lembrar. 

A história desta imagem começa com a história de outra imagem semelhante a ela, quando o caudal do rio Verde corria livre e forte, e se encontrava com a fartura das águas do rio Paraná cuja margem direita banhava as terras do Porto João André, no município de Brasilândia. 

E lá estava ela olhando para aquelas estradas que contornavam as curvas dos rios e varjões de cisalpina, irrigadas pelas águas que garantiam o sustento das famílias que lá viviam, o lazer dos turistas e o cultivo da fé. 

Doada pela família de seu Luiz Bolognesi,  proprietário do Iate Clube Rio Verde, a imagem imponente e majestosa que media mais de 1,5 metros, conferia àquele lugar a expressão da religiosidade que emanava de uma comunidade de moradores ribeirinhos, oleiros e agricultores, pescadores e visitantes que depositavam suas preces e ação de graça na capela ali erigida. 

Padre Lauri Vital Bósio e seu ministro da comunhão, Carlito, por muitos anos, presidiram missas e celebrações naquela capela e também no interior do iate em ritos campais, sempre dando graças e rogando a bênção daquela santa protetora sobre os pescadores e ribeirinhos das águas conferindo-lhes coragem e sorte. 

Com a aproximação das águas da destruição, como foi classificado o enchimento do lago da hidrelétrica de Porto Primavera que represou as águas do rio Paraná e Verde, as propriedades de suas margens foram indenizadas, os posseiros foram alojados em reassentamentos e olarias e comerciantes do Porto João André, transferidos para longe do rio que lhes dava força e vida, pela concessionária elétrica Companhia Energética de São Paulo-CESP. 

Foi nessa, época que a imagem de Nossa Senhora Aparecida que se encontrava no Iate Clube Rio Verde foi doada à Paróquia Cristo Bom Pastor e trazida pelo pároco local para o recinto da igreja matriz de Brasilândia.

Por um longo período (10 anos), a bela imagem da Padroeira do Brasil permaneceu no Salão Paroquial, para visitação dos fiéis, sendo sobre ela depositadas flores e preces por graças e intenções alcançadas pelos paroquianos devotos locais. 

No ano de 2007, entretanto, o pároco de Brasilândia, de comum acordo com o bispo diocesano Dom Izidoro Kosinski e o padre Rogério Gomes, doou a imagem à igreja matriz da paróquia Nossa Senhora Aparecida de Três Lagoas, sendo lá recebida no dia 24 de agosto daquele ano, e colocada num distinto local de acesso àquele templo dedicado à padroeira dos pescadores, dos negros e os mais humildes entre os brasileiros. 

A antiga imagem, também imponente mas de confecção mais rústica, que se encontrava na matriz da Paróquia Nossa Senhora Aparecida foi transferida para o Centro Diocesano de Pastoral, onde se encontra até os dias atuais, entronizada no pátio central daquele local de encontro e oração de Três Lagoas. 

É ali que seus filhos fiéis se encontram e se reúnem a sua volta para expressar sua fé e devoção à Mãe morena que os brasileiros receberam a graça de resgatá-las das águas e, na sua humildade, elevá-la à condição sublime de venerada Mãe. 

Brasilândia/MS, 30 de março de 2025.

Dias Mundial da Juventude







 

 





















Fonte: Dutra, C.A.S. História e Memória de Brasilândia/MS, Volume V-Poderes, 2022, pág. 234-235, e 

Revista comemorativa aos 50 anos da Paróquia Cristo Bom Pastor -Diocese de Três Lagoas/MS, 2022, pág. 37.

sábado, 29 de março de 2025

 

O mundo mágico possível e o 1º Gabinete Itinerante no Mutum

Carlos Alberto dos Santos Dutra


 



O brilho no olhar e o rosa estampado na face das crianças, no contexto de uma multicolorida gincana cultural, acolheu a todos que lá chegaram naquela manhã de outono no longínquo Assentamento Mutum. 

Distante da sede do município de Brasilândia/MS, cerca de 200 km pelo trajeto percorrido, a escola daquele lugar revestiu-se de uma contagiante alegria transformando alunos e professores, pais e colaboradores, em personagens de um verdadeiro conto de fadas, com direito à criativos adornos que desciam da cabeça aos pés fazendo-os flutuar na magia que inspiravam. 

A comitiva itinerante da Prefeitura Municipal de Brasilândia visitou a comunidade neste dia 29 de março de 2025 com o objetivo de apresentar a nova administração, seus secretários e servidores externando aos presentes a sua saudação de acolhida e também falar da disposição e empenho da prefeita Márcia Regina do Amaral Schio e sua equipe, de dar o melhor de si. 

Cada secretaria se dispôs a ouvir as demandas da população e também lhes oferecer alguns serviços que foram colocados ao alcance da comunidade, tais como atendimentos na área médica, odontológica, assistência social, defesa de direitos, emissão de documentos, informações jurídicas e apoio aos produtores, associações e empresários do lugar, entre outros. 

Foi o primeiro gabinete itinerante da nova administração e teve uma ótima aceitação pela comunidade. Uma demonstração de que o Assentamento Mutum não ficará invisível no campo das políticas públicas, fará parte de Brasilândia, apesar da distância, devendo participar da governança, através de suas instâncias organizadas e representativas, incluindo esta agrovila na rota do desenvolvimento. 

Enquanto as secretarias mais antigas que já se propuseram a oferecer serviços e soluções para algumas reivindicações da comunidade, a neófita secretaria de Meio Ambiente e Turismo, também ali esteve presente, e ouviu de integrantes do lugar as demandas referentes ao tema da ecologia. 

Visto ainda como um tema geralmente distante da preocupação dos moradores da zona rural, os olhos do secretário Carlito e secretário adjunto Pedrinho, lá presentes, durante o percurso de chegada ao lugar, puderam contemplar com satisfação extensas área preservadas por matas nativas no entorno e poucas áreas degradadas. 

As apresentações culturais e o saboroso almoço, com direito a doce de sobremesa servido a todos os presentes coroou o evento. E a tarde foi chegando em meio o brilho da decoração artesanal espalhada pelos corredores e jardins que enchiam de beleza o lugar. 

Os servidores agora recolhem seus pertences, fichas de atendimento, confeccionam seus relatórios e acenam em despedida aos últimos munícipes que permanecem no lugar após terem sido atendidos. 

O lugar aos poucos esvazia-se das folhas coloridas e os adereços festivos que mãos delicadas se esmeraram para construir. Mãe e filhos, diretora, coordenadoras, professoras e alunos se entreolham e sentem que algo importante fizeram e isso os enche de satisfação. 

Os carros e os ônibus se afastam levando servidores e profissionais consciente do trabalho que ali realizaram. Da próxima vez, muito ainda poderá ser melhorado. 

Enquanto a paisagem começa a deslizar diante de seus olhos, percebem que levam de volta para casa também um pouquinho do colorido mágico na lembrança do que representou este dia para aquele lugar. 


Brasilândia/MS, 29 de março de 2025.



Trajeto utilizado pelo Gabinete Itinerante:211 km




terça-feira, 25 de março de 2025

 

O sonhador

e sua carta para a Prefeita.

Carlos Alberto dos Santos Dutra



 


A ideia de enviar cartas soa hoje como algo antigo e fora de moda. A tecnologia digital e a tela dos celulares sepultaram de vez o recurso do papel e até o uso comum do Personal Computer, o PC de mesa e o e-mail.

Mas a carta resiste, mesmo valendo-se desta forma de transmissão viajando em fibra ótica no tempo de maneira célere e com a vantagem de não extraviar e o remetente poder ficar sabendo se sua mensagem chegou no destino, se foi lida ou não.

A carta que me refiro aqui, assim sonhou o sonhador, não tem a forma de ofício, pois não é oficial; não tem número de protocolo e sequer regularidade na entrega. Apenas é uma carta, a primeira, quiçá, prenúncio de outras que poderão vir. Carta destinada a uma autoridade, sim, mas que parte de um olhar de uma pessoa comum, o cidadão.

O autor da missiva é o cidadão, o jovem, o estudante, a criança. Cidadão que passa pela rua e vê. Vê e comenta. Indaga e pergunta. Ousa refletir sobre o que vê e ouve. E decide conferir a possibilidade de ser ouvido e sugerir.

Parece um sonho, mas estamos desacostumados a acompanhar os atos das administrações públicas ao longo do tempo. Quando nos levamos pelo sabor das paixões político-partidárias, por vezes, nos perdemos acolhendo e acatando tudo o que nossas preferências e simpatias políticas nos propõem e que, depois de eleitos, pouco a pouco vão perdendo o vigor e sendo esquecidas.

Assim tem sido durante anos e achamos que assim deva continuar sendo. Só que o tempo não para e a realidade muda a cada instante. Aliás, a realidade, como a cultura, ela está sempre em movimento. Também o pensamento e a percepção das pessoas sobre o entorno onde vivem, sua comunidade, seus empregos, seu meio ambiente, enfim a percepção da vida.

Por isso, ao caminhar pela rua, o cidadão e a cidadã sentem que ali é o seu chão; se sentem seguros na sua terra querida e por isso se interessam por ela; percebem que dela brota-lhes a vida e todos querem vê-la cada vez melhor; para si e para os moradores que ali vivem. 

Por isso ao contemplar a realidade cotidiana, os acontecimentos, os rumos e as opções que, às vezes, a administração faz, se lhe interessam ou não, alimentam-lhe a vontade de manifestar-se. Na verdade, tudo lhe interessa saber e sente-se no dever-poder de externar o seu pensamento, a sua opinião.

Há quem possa dizer que isso é utopia, coisas de um cidadão sonhador e que essa avaliação e fiscalização dos atos da administração é tarefa do Legislativo eleito para isso, o que nós todos concordamos, porém, o cidadão também tem o seu papel social de fiscalizador e propositor de políticas públicas porque ele está na ponta do processo onde se encontra a atividade fim de toda a ação pública, impactando sua vida positiva ou negativamente.

Ainda que o cidadão e a cidadã tenha a sua disposição outros instrumentos para colaborar, contribuir e fiscalizar a atuação do Executivo e do Legislativo -- conselhos de direitos municipais, sindicatos de classe, associações de bairro, ouvidorias públicas, ministério público, tribuna livre e o direito constitucional de peticionar --, eles sentem o dever cívico de também contribuir subsidiariamente com o múnus público.

As redes sociais, hoje, todos sabemos, ela são as vitrines do mundo, o grande canal de exposição da vida privada e também tela para as mazelas pessoais, sociais e ideológicas que envolvem os escaninhos da política local, regional e nacional.

Nem todos porém são afeitos a ver seus nomes expostos manifestando uma crítica aberta ao público à administração de sua cidade, de seu estado ou país. Nem todos alimentam o desejo de, pela crítica pura e simples, denegrir ou ofender o agente político que administra o município onde vive.

Por outro lado, há cidadãos e cidadã que se sentem comprometidos com sua cidade a ponto de querer desinteressadamente lutar por ela, buscando o melhor para ela. Manifestam-se, assim, somente com a intenção de contribuir com ideias para o incremento de seu progresso e seu bem estar social. 

Neste gesto, de natureza, privada, através de uma carta, sentir-se-iam, portanto, amparados, respeitados, e considerados. Assim espera.

As cartas, por fim, guardam uma singela pretensão: a de contribuir com a formação e a cidadania dos moradores do lugar, independente de idade, estabelecendo um canal de participação, de fidelidade e de diálogo sincero entre o coração do município e o coração da Prefeita.

As cartas, consideradas de natureza pessoal, espera o sonhador, só seriam lidas pela Prefeita. Portanto, seus nomes não seriam divulgados; somente o conteúdo de suas reivindicações e sugestões viriam à público. E isso a administração municipal buscaria apreciar, atender e agradecer. 

Que tal colocar em prática essa ideia e despertar este sonho juvenil?

 

Brasilândia/MS, 25 de março de 2025


Dia Nacional da Carta Constitucional (25 de março de 1824, promulgação da 1ª Constituição Brasileira).

Foto: Instagran; https://m.media-amazon.com/images/I/61RTI4Djo-L.jpg; e Profª. Leonice e alunos do 3° ano da Escola Estadual Adilson Alves da Silva em 1999, Foto: Jornal de Brasilândia, 2000. In História e Memória da Brasilândia, Vol. 3-Cidadania, pág. 345.


Título inspirado no livro Carta à Prefeita (Campanha da Fraternidade Infantil), de autoria de Fernando Carraro, Editoras FTD, 2018. 

O livro conta a história de Juninho. Ele tem 10 anos e vive com sua família numa cidade pequena. Num dia chuvoso, a caminho da escola, ele se dá conta de que um dos semáforos na rua não funciona. Ao chegar à escola, Juninho conta a todos sobre esse problema. A professora Zelina, então, percebe que é hora de falar sobre os problemas da cidade e, portanto, decide dar aos alunos aulas sobre políticas públicas. Depois da primeira aula, os alunos têm uma ideia para tornar a cidade um lugar melhor para todos. Assim, nasce a carta com uma série de ações sociais endereçada à prefeita Mariana, que se envolve no projeto de uma maneira especial. (Carta à Prefeita (Campanha da Fraternidade Infantil) : Carraro, Fernando: Amazon.com.br: Livros).


 



sábado, 22 de março de 2025

 

A figueira, o vinhateiro e os frutos agradáveis a Deus

Carlos Alberto dos Santos Dutra


 




O 3º Domingo da Quaresma nos apresenta a passagem de Lucas 13,1-9 que nos fala da figueira estéril. Em síntese, Jesus nos diz que, assim como a figueira criada por Deus, nós também devemos produzir frutos; somos convidados em nossa vida a produzir bons frutos e obras. Não quaisquer frutos ou obras, mas frutos e obras especiais, personalizadas, com nome e sobrenome de Jesus Cristo. Ou seja, frutos de santidade, de amor e de salvação.

Sim, frutos de amor ao próximo, amor à vida, amor à família, à comunidade, ao meio ambiente, enfim, frutos traduzidos em obras que revelem o amor grandioso de Deus e que sentimos por tudo aquilo que Ele criou, revelador de seu infinito amor pela humanidade e por nós mesmos.

Mas por que produzir tais frutos de amor e santidade? Por que não somente gozar a vida, aproveitá-la ao máximo, explorar os seus limites, seus recursos naturais e desfrutar da felicidade e vantagens que está ao alcance na medida certa para cada um?

Devemos produzir frutos de amor e santidade porque assim deseja o Senhor, autor da vida. O mesmo Senhor que nos dirige as palavras: “Já faz três anos que venho procurando figos e não encontro”, e que nos fala hoje ao coração.

Já faz três anos, dez anos, cinquenta anos, uma vida inteira que Ele vem procurando encontrar frutos na nossa vida e não encontra. Que tristeza se Jesus pensasse assim de todos nós.

Porque o desejo de Jesus é encontrar fartura de frutos e bênçãos em nós. Seu desejo é que produzamos frutos saborosos, cheios de graça e que alimentem a vida que segue o seu curso. Não frutos somente para o mundo, mas também para Deus, frutos que nos levem ao Reino de Deus.

Mas, a que frutos Jesus se refere? A julgar pela parábola, Jesus fala de frutos doces, saborosos, à semelhança da uva, que mostre que aquela planta, que também é sua obra, a figueira, não é estéril. Jesus quer nos mostrar que a obra do Pai é perfeita e maravilhosa, que é fértil e capaz de produzir as melhores bênçãos em nossa vida.

Só que o nosso Deus não é imediatista e tampouco rancoroso. Ele é paciente. Neste tempo propício onde experimentamos a via crucis da Quaresma, o Senhor Jesus acata o sugestão do vinhateiro que deseja adubar a figueira, acreditando que pode recuperá-la, acredita que ela vai ser capaz de superar e vencer o desafio da morte.

Ainda que seja uma figueira plantada no meio de uma vinha, ela não foi excluída e banida do lugar. Seu lugar foi preservado. O vinhateiro deu-lhe uma oportunidade. 

Assim Deus. Mesmo que estejamos em meio a uma realidade adversa e sombria, sempre há uma chance e uma esperança para todos que acreditam nos frutos da santidade e do amor que é capaz de produzir. 

Deus está sempre atento àqueles que acreditam no milagre da Salvação que passa irremediavelmente pelo perdão e a conversão. “Se vós não vos converterdes, ireis morrer todos do mesmo modo”, disse Jesus.

Que Jesus nunca nos diga, como disse para à figueira: “Por que está ela inutilizando a terra?” Ó que palavras duras. Não frutificar, não fazer o bem é um mal insuportável para Deus. 

Mas sempre há a providência de Deus na nossa vida: “Vou cavar em volta dela e colocar adubo”. Deus sempre dá um jeito de colocar pessoas-anjos junto de nós que nos ajudam a cavar em volta, fazer a coroa ao redor da planta, removendo as ervas daninhas, os maus pensamentos, más influências e amizades que não promovem o bem, a justiça e a paz que Jesus nos pede.

Deus coloca adubo, ideias novas, luz, esperança e fé em nossos corações, que brotam do Verbo de Deus, de seu Filho e de seu Santo Espírito para que a vida em nós renasça. Sim, a nossa salvação passa pelo perdão, pelos frutos e a conversão. 

Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo. Para sempre seja Louvado.

Brasilândia/MS, 23 de março de 2025.

Fonte: Deus Conosco, Dia a Dia, Ano Litúrgico C, março de 2025, Dia 23, 3º Domingo da Quaresma; Liturgia Diária, 23 de março, 3º Domingo da Quaresma, Homilia, Pe. Edison Oliveira.

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