terça-feira, 27 de setembro de 2022

 Marcos Vicente Joaquim: uma trajetória de alegria, perseverança e fé

Carlos Alberto dos Santos Dutra



 






Hoje ele estaria completando 58 anos de idade. Entretanto, há 15 anos, ainda jovem, ele partia. Ontem foi a dor. Hoje, a saudade. Amanhã, a esperança comum a todos nós.

Fim dos anos 1969 e início de 1970 e a família do senhor Vicente Joaquim e dona Luzia Cândida Joaquim chegavam a Brasilândia/MS para juntos construir uma nova etapa em suas vidas. Entre os cinco filhos que Deus brindara ao casal: Odenir, Sonia Maria, Neusa e Almir Antônio, lá se encontrava o caçula Marcos Vicente Joaquim que havia nascido no dia 27 de setembro de 1964 na cidade de Lagoa Azul/SP, chegando à Cidade Esperança com seis anos de idade.

Ele é o personagem de uma história contada cheia de ternura por Kênia Cristina de Azevedo Joaquim, a esposa que ele conheceu ainda moço e com ela se casou quando despontou a maturidade. História de alegria, realizações, dedicação e fé, protagonizada por um brasilandense de coração de ouro e que muitos pouco conheceram em sua rápida passagem entre nós. É a homenagem póstuma que prestamos para os anais da história desta cidade que o acolheu e contemplou seu despertar para o mundo e para fé.

Pois este jovem teve uma infância semelhante à de tantos outros que também aqui chegaram vindos de outras regiões. Estudou no antigo Grupo Escolar Arthur Höffig e depois de concluir o primário, prosseguiu seus estudos no chamado Ginásio, a Escola Estadual Adilson Alves da Silva.

A sua irmã Neusa Vicente Joaquim recorda que quando ele concluiu a 8ª série do ensino secundário foi fazer o curso técnico de Contabilidade na cidade de Valparaíso/SP. Depois de formado voltou a Brasilândia empregando-se na Destilaria Debrasa na área de contabilidade. Anos mais tarde trabalhou no escritório de contabilidade do sr. Celso Messias da Silva, sendo posteriormente convidado para trabalhar no escritório que este senhor mantinha em Três Lagoas, também na área de contabilidade, lá permanecendo até 1992.

Dinâmico e de vigor intelectual admirável, foi um dos primeiros jovens a manifestar-se publicamente através do Jornal de Brasilândia expondo suas ideias e ideais, entre elas, no ano de 1988, a bela e engajada poesia em homenagem aos indígenas Ofaié, que naquela época travavam luta ferrenha pelo reconhecimento como povo tradicional desta região.

Participou do grupo de jovens JUCEC – Juventude Unida com Esperança em Cristo -, na Paróquia Cristo Bom Pastor, da Igreja Católica, grupo criado em 1983 logo após a chegada do pároco padre Lauri Vital Bósio à Brasilândia/MS, chegando a ocupar a presidência da entidade.

Na cidade de Três Lagoas/MS, onde passou a residir, conheceu alguns jovens da Igreja Peniel e o trabalho por ela realizado, vindo a se interessar em trabalhar na obra de Deus. Sob o ímpeto da juventude e como que atendendo um chamado divino, ao ser convidado para ir para a Bahia deixou sua carreira profissional e partiu rumo à cidade de Dias D’Ávila/BA, onde iniciou sua caminhada fé, inicialmente como obreiro, auxiliando o pastor da Igreja daquela cidade. Depois de alguns anos foi para Belo Horizonte onde ingressou no Seminário da Igreja Peniel.

Foi nesta cidade de Dias D’Ávila/BA que Marcos iniciou sua preparação para o ministério pastoral na Igreja Peniel e o ministério Desafio Jovem Peniel, dedicando-se ao trabalho junto à Casa Terapêutica mantida pela Igreja para recuperação de dependentes químicos. Passado algum tempo seria enviado para o Seminário Teológico na base do Ministério, em Belo Horizonte/MG.

A esposa Kênia Cristina lembra que em fevereiro de 1995 Marcos chegou à Belo Horizonte para cursar teologia na ESMI - Escola Superior de Missões -, que fica na sede da Igreja Peniel, onde dedicou-se durante seis anos à sua formação. Em 1996, com autorização de sua liderança convidou jovens da Escola Bíblica onde ministrava aulas para participarem de um grupo de teatro que faria apresentações na Igreja. Uma média de 40 jovens se apresentaram; tudo para sua surpresa, porque não esperava um número tão expressivo assim.

Sua paixão e dedicação ao teatro revelavam a sua alegria de viver. Sempre com muita disciplina e palavras de encorajamento, viu a vida de aqueles jovens aos poucos ir se transformando. Marcos era um líder, um pastor pela essência que o próprio Deus colocou nele, e sempre muito amado de todos. Os pais dos alunos, muitas vezes batiam na porta da sala conde aconteciam as reuniões todos os domingos à tarde para pedir ajuda na orientação dos filhos ou para agradecer a mudança que viam acontecer no comportamento deles em casa.  

Trabalho que se prolongou até 2001 e se tornou referência para os jovens da Igreja Peniel, transformou aqueles alunos em líderes em Igrejas, construíram família lindas, são homes bem-sucedido, tudo por um legado deixado pelo grande líder Marcos Vicente.

No ano de 1998 formou-se e passou a relacionar-se com Kênia Cristina que já a conhecia dos grupos de teatro que liderava e que mais tarde se tornou sua esposa. Em agosto daquele ano se apresentou à família da jovem Kênia expressando desejo de casamento.  Após a sua formatura ocorrida em dezembro e ter frequentado um curso transcultural, em agosto de 1999 tornou-se noivo de Kênia Cristina, para a alegria do pai, Vicente quando soube que o filho formaria uma família.

No ano de 2000 após ter se aperfeiçoado num curso de imersão na língua inglesa em Belo Horizonte numa agência missionária de respeito mundial e assumido a coordenação do grupo de teatro Desafio Jovem Peniel na capital do Estado, traduziu livro do inglês para o português, fez várias viagens missionárias pelo centro-oeste e nordeste do Brasil acompanhando missões estrangeiras como intérprete, sempre contando com o apoio de sua noiva.

Casou no dia 15 de setembro de 2001 na presença de muitos amigos e familiares, sob uma chuva torrencial que abençoou o casal que de forma simples. Por não disporem de salário eles viviam verdadeiro milagre de Deus. Entre os presentes recebidos, montam com carinho a mobília do apartamento financiado pela fé, fruto de uma pequena reserva dos tempos de contabilidade e muito amor envolvendo tudo isso, relembra a esposa.

Após o casamento encontramos o casal trabalhando juntos no campo missionário, na cidade de Dias D’Ávila/BA onde permaneceram até fevereiro de 2002 quando Marcos recebe oficialmente a notícia de que sua consagração pastoral e seu credenciamento ao ministério da Igreja Peniel havia sido marcada.

Seria uma grande festa, lamenta a esposa, mas foi um misto de tristeza e alegria, pois no meio das comemorações Marcos perde o seu pai o amado sr. Vicente. Um pouco desorientado, sem saber o que fazer direito, decide com o apoio de colegas de ministério, seguir até Brasilândia/MS, realiza o sepultamento de seu pai e retorna em seguida para a sua consagração. Deu tudo certo, mas foi muito marcante.

Neste mesmo ano o casal vive a expectativa de integrar um projeto missionário internacional que ocorreria na Rússia, pois entre os candidatos, o que mais se adequavam era Marcos e Kênia. Entretanto, durante o congresso missionário da Igreja tomam conhecimento de que, por problemas de logística, o Projeto Rússia se tornou inviável, e foi arquivado.

Em 2003 o casal seguiu para Rio Branco/AC onde iniciaram novo desafio numa terra estranha, num trabalho no campo missionário, terra que lhes deu de presente Rafael Azevedo Joaquim, verdadeiro bebê missionário nascido em 14 de maio de 2004 em terras acreanas, para a alegria dos pais.

Mas a vida tem seu curso e na maioria das vezes não dá muitas explicações. A partir de 2005, Marcos começou a apresentar um cansaço queixando-se de dores. Nunca gostou de consultas médicas, lembra a esposa, mesmo assim, ganhou algumas sessões de fisioterapia e foi fazer para aliviar as dores no corpo. Apresentava sinais de baixa imunidade, tinha uma rouquidão frequente e sempre associava ao ritmo frenético e estresse.

Depois de passar por exames de laringoscopia, pneumologista e uma tomografia do tórax, no ano de 2006, para a tristeza de todos foi diagnosticado com câncer na parte externa do pulmão, com metástase em estágio avançado.

Foi muito difícil, explica a esposa, mas apesar do diagnostico, a fé e a esperança em Deus o impulsionou e o sustentou. Foi indicado tratamento de quimioterapia e radioterapia. Muitas orações, muita fé, muito apoio e cuidado dos amigos que conquistou ao longo do tempo até ali, gente de longe e de perto, a família apoiando. Mas infelizmente o tratamento não apresentou resultados.

Em 26 de fevereiro de 2007 no ambulatório de quimioterapia do hospital Felício Roxo, em Belo Horizonte, Marcos Vicente Joaquim veio a óbito segurando a mão de sua esposa, três meses antes de seu filho completar três anos de idade. Foi como se uma brisa suave tocasse o rosto daqueles jovens e amigos ao vê-lo despedir-se assim, tão repentinamente. Devolver a esperança de dias melhores para pacientes que se submetem a tratamento fora do domicílio, que se encontram na Casa de Passagem que recebeu o nome de Pastor Marcos Vicente Joaquim, no bairro Universitário, em Rio Branco/AC, é a imagem e mensagem que permanece.

O lugar é simples e aconchegante. As mesas de refeição são grandes e ficam no saguão. Do lado de fora se sente o cheirinho bom vindo da cozinha. De frente umas para as outras, as pessoas se olham, conversam, compartilham experiências. Lá todo mundo é um pouco responsável pelo filho do outro quando alguém vai ao hospital. Algumas crianças brincam pelo pátio, outras passam de um colo para outro. Observados de longe, todos parecem uma família (...). 

Marcos Vicente Joaquim, com certeza, permanece por ali e em muitos outros jardins que plantou e fez florescer por onde passou. 

Brasilândia-MS, 27 de setembro de 2022.

 

Fonte: Depoimento fornecido pela irmã de Marcos, Srª Neusa Vicente Joaquim e pela esposa de Marcos, Srª Kênia Cristina Azevedo Joaquim em 04.Jul.2020. A poesia de Marcos Vicente Joaquim se encontra publicada no Capítulo I, Volume II – Patrimônio, da coleção História e Memória de Brasilândia, página 73. A Igreja Peniel foi fundada em 6 de fevereiro de 1972 com sede em Belo Horizonte e originou-se com a característica de assistir espiritualmente e permanentemente os internos do Desafio Jovem Peniel, bem como os seus familiares após o término do programa de recuperação. O senhor Vicente Joaquim, pai de Marcos, faleceu em Brasilândia no dia 22 de fevereiro de 2002. Pacientes do TFD são acolhidos por Casa de Passagem no Universitário, In. Notícias do Acre, Rio Branco/AC, 18.Nov.2014. Cf. também Dutra, CAS História e Memória de Brasilândia, volume III - Cidadania, pág. 432-434. 

https://www.dropbox.com/s/9mm6dkp6sbp0c2c/Hist%C3%B3ria%20e%20Mem%C3%B3ria%20de%20Brasil%C3%A2ndia-MS%20V2-Patrim%C3%B4nio.pdf?dl=0;

https://www.dropbox.com/s/y5wz3mtdlndjttf/Hist%C3%B3ria%20e%20Mem%C3%B3ria%20de%20Brasil%C3%A2ndia-MS%20V3-Cidadania.pdf?dl=0 



Um comentário:

  1. Eu agradeço à tecnologia e ao tempo por me proporcionar ler este post em seu blog, Carlito. Sou sobrinho do Marcos, filho de Sônia Maria. Estava perambulando pela internet procurando informações sobre minha família e meus antepassados e me deparo com este belíssimo texto. Obrigado por isso! Eu adorei ler informações que nem me lembrava sobre a história de meu tio, coisas que hoje, como adulto, vejo com olhos de muito mais carinho e simpatia.
    Um grande abraço.

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