A “síndrome
de Caim” no Brasil
Artigo do Padre Francisco
Aquino Júnior
É verdade que sempre houve divisões e inimizades entre pessoas, famílias e grupos, especialmente em períodos eleitorais. Mas isso alcançou nos últimos anos, com o crescimento da extrema direita e o uso das tecnologias digitais, dimensões e proporções assustadoras.
A criação do “gabinete do ódio”, a constituição de verdadeiras “milícias digitais” e a propagação de “movimentos digitais de ódio e destruição” criou um ambiente de intolerância, ódio, agressão, fake news e violência generalizados, onde os adversários e até os diferentes são transformados em inimigos a serem odiados e eliminados a todo preço.
Isso gerou
inimizade entre adversários, nas famílias, entre amigos e nas igrejas.
Disseminou a prática imoral do “tudo vale” e “tudo pode” contra o
adversário/inimigo: difamação, mentira, agressão verbal e até física. Despertou
e aguçou a intolerância e o desejo de eliminação do
diferente/adversário/inimigo: seja uma “eliminação virtual” (cancelamento), seja
uma “eliminação real” (homicídio). O Texto-Base da Campanha da Fraternidade
chega a falar de uma “cultura do cancelamento”.
Mas a consideração do ambiente de polarização, intransigência, ódio e violência não pode ofuscar nem relativizar a marca mais fundamental e trágica de nossa sociedade que é desigualdade social.
Primeiro, porque a desigualdade social no Brasil, não só não diminuiu, mas continua crescendo: um estudo apresentado no Fórum Econômico Mundial, em Davos (Suíça), revela que 1% da população concentra 60% da riqueza nacional; 4 dos 5 homens mais ricos do Brasil tiveram um aumento de 51% de sua riqueza em 2020 (em plena pandemia!), enquanto 129 milhões de brasileiros ficaram mais pobres; a pessoa mais rica tem uma fortuna equivalente a 107 milhões de brasileiros.
Segundo, porque a polarização do Brasil, em grande medida, foi provocada e/ou instrumentalizada pela extrema direita em função de um projeto político voltado para os interesses dos grandes grupos econômicos.
Não por acaso o discurso
“deus-pátria-família” sempre esteve associado ao desmonte de políticas públicas
e direitos trabalhistas, a aversão a direitos humanos e políticas ambientais,
ao ódio a tudo que tem a ver com justiça socioambiental e à defesa
intransigente do “teto de gastos” para políticas sociais (para pagamento de
juros não há teto de gastos nem responsabilidade fiscal!).
Essa desigualdade social chega ao extremo nos setores mais vulneráveis, produzindo verdadeira exclusão social. Segundo o IBGE, 67,8 milhões de pessoas vivem em situação de pobreza (com até 637 reais por mês) e 12,7 milhões de pessoas vivem em situação de extrema pobreza (com até 200 reais por mês).
Particularmente dramática é a condição da População em
Situação de Rua que “supera 281,4 mil pessoas no Brasil”. Sem falar da situação
da população carcerária que chega a 839.672 (dados de junho de 2023), formada
em sua imensa maioria por jovens pobres e pretos das periferias. E aqui se
conjugam pobreza/miséria, racismo, preconceitos, discriminação…
Procurando compreender o ambiente cultural em
que se produz e se reproduz uma sociedade dividida, desigual e excludente como
a nossa e perguntando sobre o “motivo pelo qual estamos vivenciando um tempo em
que a vida, as pessoas e as relações humanas experimentam tanta agressão,
tantas ameaças”, o Texto-Base da Campanha da Fraternidade fala de uma espécie
de “síndrome de Caim”, na qual, “não só não nos sentimos mais responsáveis uns
pelos outros como também, ainda que não expressemos desse modo, desejamos que
as pessoas que pensam diferentemente de nós desapareçam, isto é, sejam na
prática exterminadas”.
De fato, “chegamos a uma época em que a não
fraternidade, ou seja, a inimizade social se tornou o critério determinante
para boa parcela de pessoas, de grupos e da sociedade”. E é isso que justifica
e exige uma Campanha da Fraternidade que convoque, mobilize e promova a
“fraternidade e amizade social” em todos os âmbitos da sociedade. Essa
“pandemia sociocultural” (divisão, desigualdade, exclusão) “clama por
transformação e conversão à luz da fraternidade nascida do Evangelho”.
Reconciliai-vos com Deus. É agora o
momento favorável, é agora o dia da salvação. 2Cor 5,20; 6,2
Fonte: A “síndrome de Caim” no Brasil | Artigo de Pe. Francisco Aquino Júnior – Blog das Comunidades (wordpress.com); Colaborou: Portal das CEBs;
Imagem: Síndrome de Caim - SSVP | CMBH (ssvpcmbh.org.br)
Síndrome de Caim retrata o momento atual não só do nosso Brasil
ResponderExcluirMas do mundo em Geral...
A não fraternidade a nível global é cada vez mais assustador
Por isso digo que a salvação é individual onde cada um tem que fazer a sua parte sendo fraterno com seu irmão e fazer o bem sempre independente de quem seja...
Que bom mano que divulgasse a campanha da fraternidade pois ela aos poucos vem sendo esquecida...
Um abraço do teu mano...
Bj