O mestre, a música e as begônias.
Carlos Alberto dos Santos Dutra
Durante a vida cruzamos com pessoas de todo o tipo. Existem aquelas triviais que no corre-corre do dia a dia cumprimentamos no portão de nossa casa ou indo e voltando para o serviço. São pessoas que pouco sabemos e por educação as cumprimentamos desejando apenas um sonoro bom dia ou boa tarde. E só.
Do portão para dentro de nossas casas, ou na intimidade de nossos diálogos, muito pouco sabemos ou falamos sobre elas. E na maioria dos casos isso não é importante, pois a relação que travamos com elas são superficiais e não adentram a derme de nossas emoções e sentimentos. Não existem laços maiores que nos unem, a não ser o fato de serem nossos semelhantes, cristãos ou não, merecedores de nossa atenção e respeito.
Existem, entretanto, outras pessoas que pelo simples fato de vê-las, já nos toca o coração. Não, não estou falando de desvalidos, pedintes e excluídos que batem à nossa porta pedindo um pedaço de pão. Não, não estou falando daqueles vendedores de sonhos ou pregadores de produtos outros, para o estômago ou a alma, que insistem, nos finais de semana, em nos oferecer um agrado ou conforto, a custo de algum trocado ou minuto de atenção.
Falo daquelas pessoas que um dia marcaram nossas vidas, e ao vê-las, nos faz pulsar o peito. Às vezes, não foram uma, nem duas vezes, mas várias vezes, dias e anos, que se fizeram presentes e nos fizeram nutrir sobre elas especial respeito e carinho. Algo inexplicável, divino, talvez, que nos inspira naquele momento – ao vê-la --, e saudá-la, entusiasticamente.
Pois bem, com ele foi assim. E olha que nem bem o conhecia direito e eis que recebo a notícia que ele se vai, já se foi. Não, não falo de uma partida definitiva para o cosmo ou para além. Falo da distância física, de alguns quilômetros, entre uma cidade e outra, que passaram a nos separar de alguém muito especial e querido.
Nesta altura do texto, o leitor já está ansioso para saber quem é a pessoa. Pois bem, direi em seguida. Não sem antes falar de sua importância para nossa comunidade no tempo em que aqui esteve. O tempo que aqui ele também foi aluno e professor. O tempo que aqui plantou e floresceu também...
Sim, não sou sabedor de uma milésima parte de sua vida. Apenas meus olhos contemplavam sua passagem, suas ações e seu sentimento que transparecia nos gestos, num relance, instantâneo, quase imperceptíveis. Mas o suficiente para marcar presença e deixar plasmar a aura de luz que irradiava aos que se encontravam a sua volta.
Sim, pode ser que poucos percebessem isso, mas havia sim uma aura de luz a sua volta. Apesar de aparentar pouca idade, o tempo vivido mostrava o quanto aprendera com o passar dos anos, aqui e além mar. Por outras terras, por outros sois, nascentes e candentes com paz de espírito e meditação.
Tal qual um monge, lá está nossa personagem dedilhando liras. Dedos contorcidos. E não sem dor, fazem desprender do pinho a música celeste, sublime, que encanta a alma e alegra as molduras do universo.
Sim, lá está o nosso mestre com mãos de fada a promover a cura, espalmadas, silenciosas, profissionais e profundas, recompondo a vida, aliviando dores, cativando a saúde por vezes debilitada de quem o procurava. Verdadeiro maestro regendo a orquestra da natureza, saudando a flor, conclamando o amor, num simples gesto de um douto e modesto professor.
Sim. É este homem que nos acostumamos a vê-lo entoando e cantando salmos e canções que nos tocavam a alma, nas celebrações, nos eventos de toda a ordem que abrilhantou pelos quatro cantos da comarca. Muitas vezes escondidos nos planos e o brilho dos flashes e luzes artificiais. Sim, é este homem, de luz própria, que, hoje, queremos homenagear.
Mestre da medicina alternativa capaz de aliviar a dor e distorções da saúde de nossa gente. Mestre na música de sensibilidade capaz de alegrar os anjos do céu e da terra. Mestre da palavra que marcou presença e serviço nos cerimoniais da vida civil e particular. Mestre do comprometimento social ao engajar-se em prol da natureza, fundando e dirigindo entidades e associações.
Mestre da caligrafia, cuja suavidade e beleza das formas encantavam os olhos e a mente dos leitores, dando vida a trilha das letras, serelepes sobre o papel. Mestre da solidariedade ao dedicar-se, com altruísmo e modéstia, às entidades de filantropia e apoio à saúde e ao bem estar do cidadão a qualquer tempo.
Pois bem. Este é o cidadão que, para cumprimentá-lo pela manhã ou à tarde, agora, teremos que fazer uma pequena viagem de alguns quilômetros até o estado de São Paulo.
Mas, enquanto isso, se não for possível saudá-lo, ainda que pelo WhatsApp, podemos elevar a Deus uma prece de agradecimento a este senhor e sua esposa que conosco conviveram e nos brindaram com seus dons, espiritualidade, exemplo de vida e a riqueza de um jardim de begônias, cujo perfume ficou para trás, no coração de cada um de nós.
Assim como em outros tempos de partida e de chegada experimentado pelo mestre, ele sempre permanecerá por aqui, onde conquistou um rol de amigos e admiradores. Sei que vais, mas sei também que vais ficar, meu irmão.
Obrigado Mário Nelson da Silva pela amizade. Desejamos todo o sucesso neste seu sempre novo desafio como profissional, pai de família e cidadão. Temos certeza que tua trilha será coroada de êxito e bênção. Grande abraço.
Publicado originalmente em 24 de setembro de 2019.
Fonte: https://www.institutocisalpina.com/o_mestre_a_musica_e_as_begonias.html
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