Zé são-paulino: a alegria
e o adeus
Carlos Alberto dos Santos Dutra
Tem pessoas que passam pela vida da gente; outras ficam guardadas no fundo do
coração. São imagens, gestos e sons, frutos de nossos encontros e que
absorvemos no cotidiano das relações com os amigos e parentes, e até de nossos
desafetos que, nem sabemos o porquê, vão se aninhando e se aquerenciando em
nosso peito e acabam posseiros para sempre, nutrindo nosso carinho, respeito e
bem querer.
José Sebastião Sobrinho era uma dessas pessoas. Conhecido como Zé
são-paulino, por razões óbvias, o conheci logo que aqui cheguei, no ano de
1986. Homem honrado, à moda antiga, de palavra e que primava pela honestidade,
era querido por todos. A família que o perdeu naquela sexta feira, dia 15 de
fevereiro de 2014, de triste memória, só tem de se orgulhar deste patriarca
cujo trabalho e a alegria sempre foram a sua maior virtude. É exemplo para
todos.
No campo das ideias, por ser petista de carteirinha, foi um dos fundadores do
Partido dos Trabalhadores, ao lado de Irineu de Souza Brito. Entusiasta
das reuniões e militância daqueles bons tempos, quando a estrela ainda defendia
com bravura os pequenos em face da ditadura, quando a frestinha da liberdade e
da justiça recém começava a aparecer, mesmo aqui, na longínqua Brasilândia-MS.
Eta! militância de garra, quanta saudade!
Particularmente travei com ele amizade desprendida e, ao mesmo tempo, engajada.
De aparência juvenil e de falar fluente, sob a aba do chapéu, poucos lhe davam
valor à distância. Mas, depois de conhecê-lo e ouvir de perto sua voz,
descobriam que ali, atrás daquelas feições frágeis, se escondia um grande homem
e um coração imenso. Sobretudo para os que mais precisavam e os que buscavam a
ajuda que nunca faltava.
Certa feita, no auge da luta dos índios Ofaié com a poderosa CESP e uma
enchente que inundou as margens do rio Verde e Paraná, em 1999, foi Zé
São-paulino que abriu os braços para colher o desterro dos primi
ocupandi desta comunidade. E lá estava ele, zeloso, abrindo uma exceção
junto ao seu patrão, na fazenda Santa Cecília, lá para os lados da Três
Morrinhos, cedendo uma área para alojar os índios, mesmo que tivéssemos à época
de lavrar um contrato de arrendamento para a exploração agrícola, para que os
indígenas pudessem plantar arroz, diga-se de passagem, uma das melhores
colheitas que os Ofaié tiveram naquele ano.
Homem disposto e desprendido nos seus negócios e sábio na lida e a vida no
campo, foi o orgulho e a alegria de sua família. Mesmo depois do infortúnio
daquele acidente que marcou seu coração com uma cicatriz e lhe tirou o brilho
da vida, preocupação e arrependimento que carregou até seus últimos dias. Fica
a saudade e a alegria para aqueles que o viram sempre solícito, otimista e
esperançoso; sempre buscando inteirar-se das notícias e dos acontecimentos
ligados às lutas do povo e às conquistas do partido dos trabalhadores,
demonstrando ser um cidadão engajado, desses que já não se fazem mais.
Passados 11 anos de sua partida, há de descansar em paz o amigo Zé
são-paulino. Com as condolências e sentimentos daqueles que o conheceram à
seus familiares. Partiu, com certeza, sereno e confiante esse nosso militante,
de lutas e de sonhos, levando consigo a nossa dor e saudade, para a querência
do Céu. Amém.
Brasilândia/MS, 17 de fevereiro de 2025.
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