terça-feira, 10 de agosto de 2021

Eva Freitas e Milton Ducatti: um casamento para toda a vida.

Carlos Alberto dos Santos Dutra







Eu tinha a 4ª série quando fui convidada para dar aula como professora leiga na escola rural. A história de uma filha de Brasilândia, como a de tantas outras mulheres que aqui nasceram e cresceram, muito trabalharam e tiveram seus filhos, pode ser vista como aqueles contos de fada real, de nostalgia e beleza que enlevam sempre o coração das pessoas.

Mais que isso. Histórias que nos remetem aos braços e corações daqueles que amam viver e descobrir por entre as flores e as pedras do caminho o significado e importância do sorrir, sonhar e viver. Êxitos e vitórias, percalços e lágrimas suportados; garra e força no frescor da juventude para levantar e continuar caminhando. Até que o sol finalmente lhes ilumine a estrada.

Era o casamento da filha do seu Manuel Moreno. Porque o seu Manoel Moreno era muito amigo daquele que veio depois a ser o meu companheiro. E lá estava a menina com 17 anos de idade convidada pela amiga, também professora, naquele acontecimento social que modificaria para sempre sua vida. Na companhia do pai e da mãe, a jovem adentrou naquela festa rural confiante e de cabeça erguida.

Trazia nos braços um pequeno volume enrolado em cueiros de flanela que ainda guardava o perfume e lembrança do enxoval que ganhara após seu enlace. E lá se encontrava dentro, protegido em seus braços, um par de olhos verdes brilhantes e pele rosada: um coração cheio de vida, abanando as mãozinhas, com apenas seis meses de idade.    

Os passos decididos da jovem senhora pisaram firmes sem temor algum naquele espaço de glamour e atenção que toda noiva sonha. Para trás deixara os sonhos que a separação a fez despertar deixando nos seus braços o fruto inocente de um amor que lhe foi fugaz.

E ai passou aquele senhor, ele muito simpático, tinha quarenta e poucos anos, eu acredito. Aí eu olhei. Nossa, eu vi que era uma pessoa assim, que chamava a atenção, diferente. Era tudo que o coração daquela jovem merecia apreciar naquele momento de congraçamento. E ele estava ali, a poucos passos de sua felicidade. Olhou para ele dos pés a cabeça e seu coração dele se afeiçoou. Afinal, ela tinha os seus predicados e não era uma jovem de se jogar fora.

E ele deu uma olhada pra mim. Eu também não era assim... Eu era uma morena, tinha um cabelão comprido. Aí ele me olhou, eu olhei para ele... E aconteceu. O amor nasce assim: primeiros são os olhares, depois os detalhes, e por fim as informações, antes da decisão final. Naquela festa o casamento era da amiga, mas para a jovem Eva, o enlace se deu ali, e se estendeu até ela. Foi a moça mais feliz naquele dia. Alegria que irradiou para toda a Xavantina onde ela morava com seus pais.

Aí, eu percebi: ele foi pedir informação. Quem era aquela morena? Aí a pessoa que me conhecia falou sobre mim: que eu era separada, que era uma pessoa muito trabalhadora. Falou que eu dava aula como professora e que tinha um filhinho, e era muito responsável.

Foi quando o quarentão Milton, que em suas andanças entre Xavantina, Brasilândia e Dracena, sempre varando estradas por estes sertões com caminhões transportando sacas de arroz, café, amendoim, mamona, e algodão, puxou o freio de mão da vida, e deixou-se ser cativado pelos encantos da jovem Eva.

Se para o lado da jovem o mundo tinha se transformado num mar de rosas, para o futuro esposo, o caminho foi um pouco mais longo e desafiador. E aí eu descobri e ele me contou que era desquitado e que sua filha caçula, dos quatro filhos que tinha com a primeira esposa (José Milton, Jair, Lucas e Fátima), ela era quase da minha idade, observa.

Outro desafio foi ter de conviver com a mentalidade tradicional dos futuros sogros, sendo o pai de ascendência italiana, que colocavam óbices à união do casal. A mãe dele, tadinha, que era uma pessoa super  conservadora, reservada, na época, ela falou: --filho você tá louco, ela [a Eva] é uma criança. Eu tinha 17 anos na época, ia fazer 18 anos. A mãe dele ficou desesperada, porque ela achou que não estava certo.

Mas o que tem que ser acontece e o amor falou mais alto e forte. Aí a gente se conheceu durante mais ou menos uns 10 meses. E resolvemos juntar nossas vidas e estamos juntos até hoje. Ele criou meu filho Edmilson igual ao filho que tivemos juntos, o Rodrigo.

O quadro da família feliz estava concluído e se encaixava perfeito nos contorno da felicidade e da graça. Um lar onde o respeito e o carinho venceu as torrentes do tempo sob a poeira das estradas do velho caminhoneiro e sua jovem e fiel companheira que juntos continuaram lado a lado. Ele, Milton Ducatti, nascido no dia 12 de maio de 1931, hoje com 90 anos, e ela, Eva Freitas, nascida no dia 19 de julho de 1957, hoje com 64 anos de idade.

Mas ela continua vendo todas as manhãs - quando se encontrava em frente ao espelho -, aquela jovem com os mesmos olhos do coração, e sonhos que embalou quando moça, desde aquele dia, há 46 anos, quando tudo começou, numa festa de casamento que abençoou sua vida.

Brasilândia/MS, 10 de agosto de 2021.

 


 

2 comentários:

  1. Uau fiquei emocionada reviver essa trajetória muito muito agradecida a Deus e a vc Dr Carlito Dutra obrigada Deus continua Abençoando Vc e todos q o ama🙏😇

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  2. Seu Milton,uma lenda viva da nossa cidade. Em suas andanças transportando produção,com sua experiência já levava em separado saco de amendoim pra sgradara molecada que o rodeava quando chegava na máquina de beneficiamento. Pois era garantia que sua carga não seria remexida,sua bondade sem tamanho. Eu e muitos outros meninos que morava ao redor já esperava pelo Mirto Ducatti.
    Hoje minha gratidão pela família. Naqueles tempos,era pra matar fome de muitos moleques que contava com sua generosidade e muito carinho.

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