quinta-feira, 3 de junho de 2021

 

Corpus Christi, o tapete e as almofadas.

Carlos Alberto dos Santos Dutra


 









Os alimentos iam sendo colocados um a um, cuidadosamente. Mãos voluntárias norteadas por vários rostos iam dando asas a imaginação e colocando-os de tal forma que configuravam figuras geométricas, símbolos e sinais que comunicavam.

Impossível não deitar os olhos sobre aquela estrada, verdadeiro tapete multicolorido, repleto não de rosas e flores, mas de algo mais existencial e profundo. Pacotes de arroz, feijão, macarrão, sal, açúcar, farinha, café, óleo, bolachas, doces, material de limpeza, roupas, agasalhos, tudo disposto, ora em formato de cruz, ora em formato de lua, ora em formato de coração, ora em formato de cálice, a ponto de encantar a todos.

Foram mãos que, na véspera, desprenderam-se dos desejos do corpo e de seus nomes, posições econômica ou lugar social e dedicaram-se a promover solidariedade. Donas de casas, jovens, crianças, homens e mulheres, batizados ou não, frequentadores de igreja ou não. Naquela hora todos o que mais queriam era participar e colaborar.

Cada um dando o que possuía. Desde aquele que, olhando para a dispensa tão carente de alimentos, com generosidade, doou tudo o que tinha, até o último pacote de fubá que possuía; até aquele que, com a mesma generosidade pode ir até o mercado e comprar um pacote de farinha de trigo ou de óleo para depositar sobre aquele tapete em construção.

E foi assim que o tapete solidário de Corpus Christi, da Paróquia Cristo Bom Pastor de Brasilândia foi aos poucos sendo construído, dele participando todos os integrantes de suas pastorais, serviços e movimentos. Uns mais, outros menos. Mas cada um com muita dedicação. Cada um que lá esteve sabe do que estou falando: mencionar seus nomes se torna desnecessário.

E lá estavam aquelas mãos, cujos rostos somente o Pai do Céus observou, regendo aquela orquestra laboral fazendo-a brilhar ainda mais quando olhavam para onde aquela estrada iria terminar: os braços de quem precisava. Isso os fazia alegrarem-se: poder saudar e louvar Aquele objeto de todas as atenções e homenagens. Ajoelhados, decorando a nave central da igreja matriz, entoavam a prece mais fervorosa com sabor do Maná do Céu de quem derramou seu sangue para salvar a todos.

No dia, seguinte, na cerimônia de Corpus Christi, a leitura do Evangelho, de Marcos (14,15), viria a coroar a todos pelo trabalho realizado. Em especial quando Jesus Cristo disse na sequencia aos apóstolos que um homem vos mostrará, no andar de cima, uma grande sala, arrumada com almofadas. Aí fareis os preparativos (da Páscoa) para nós.

Almofadas. Quem não gosta de sentar e deitar sobre elas?  Espalhadas pelo chão daquela grande sala mencionada por Jesus, elas criavam o ambiente propício para o reencontro de Cristo com seus discípulos. Uma sala reservada, no andar de cima, num lugar onde as preocupações do mundo não alcançam, ali era o lócus da fé. Ali encontravam conforto e tranquilidade para um encontro íntimo e existencial com o Filho de Deus.

Os discípulos sentem-se felizes por estar ali, no andar de cima. Isso porque já estiveram no andar de baixo e sofreram na carne, assim como Jesus, as durezas e carências do mundo. Sentiram fome e sede de justiça; profetizaram e lutaram para mudar aquele estado de coisa. Deram testemunho de consolo, confiança e libertação ao povo em sua missão. Por isso sentia-se em estado de graça por ali estar, ao lado do Mestre.

Aquela comunidade paroquial, igualmente assim também se sentia. Aqueles operários do Reino deram ali seu testemunho de fé, partilhando o que tinham na medida de seu coração, dividindo o alimento e o trabalho com os irmãos. Aquele tapete solidário se transformou no itinerário da fé, e seus adornos – Cruzes, Corações, Terços e Anjos --, no amplo espaço daquela sala e suas almofadas reconfortantes de acolhida a seus construtores.

Ao adorar o Corpo de Cristo e seu múnus que nos é dado com o propósito de nutrir e salvar cada um dos que n’Ele crer, perceberam os operários desta obra singular, seus joelhos não doíam, pois lá estavam almofadas suportando seus pesos, suas preces, suas esperanças e agradecimento por estarem ali e poderem dar graças por isso.

Após a celebração de Corpus Christi, o tapete aos poucos foi sendo desfeito e os alimentos colocados em bolsas para serem entregues às famílias carentes da comunidade. Durante a celebração outras doações chegavam a cada momento. Missão cumprida para aqueles que ajudavam construir solidariedade e partilha para com os que sofrem devido à fome neste tempo pandemia.

Sobre as almofadas, aquelas celestes, lá da passagem bíblica do Evangelho, e que cada um dos fiéis que lá se encontravam pode sentir sob seus joelhos por algum momento, hoje, é como se cada um, trilhando o tapete da vida, no caminho de volta, as levassem para casa, para colocá-las no centro da ampla sala que cada um possui num lugar reservado de sua casa chamado átrio do Sagrado Coração de Jesus.

Brasilândia/MS, 3 de junho de 2021. Festa de Corpus Christi.














2 comentários:

  1. Obrigado mana. Deus a abençoe. Saudade.

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  2. Muito lindo esse gesto solidário parabéns Diácono Carlito isso é uma benção divina colocar as palavras de Jesus Cristo em ação.

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