sexta-feira, 2 de outubro de 2020

 As palavras, as eleições e os incêndios

Carlos Alberto dos Santos Dutra




Antes foi o Pantanal e a Amazônia que ganharam as páginas dos telejornais e mídias sociais denunciando os incêndios, tanto os naturais como os criminosamente provocados. Realidade distante do eleitor de Brasilândia/MS, localizada na região Leste do Estado, sentia-se relativamente segura das chamas devastadoras da fauna e flora. Imagens que davam consternação, mas que nem de longe provocava no espectador o pavor mortal que as vítimas (animais silvestres e semoventes, matas nativas e plantações) se submetiam.

Os ventos mudam, entretanto. E aquilo que parecia tão distante, hoje se avizinha do chamado bolsão Sul-mato-grossense, no entorno da cidade polo de uma das maiores áreas de floresta plantada do país. A fumaça e a fuligem suspensa no ar já provoca elevação da temperatura a níveis nunca vistos. E a roupa no varal da gentil senhora que vive nos arredores já mostra os sinais desta desolação. São gritos de advertência na ordem do dia.

A vida, porém, continua e só nos damos conta do caos quando as labaredas atinge a pista e a calota do carro que dirigimos. A floresta está em chamas. A marginal da rodovia está enfumaçada. Os caminhos estão interditados, os animais silvestres esturricados, em meio à azáfama das autoridades que, impotentes, tudo assistem, perplexas. Os pecuaristas, agricultores e empresários das grandes empresas, e lá estão eles envidando redobrados esforços para apagar o incêndio e minimizar os prejuízos.

No calor destas chamas, as eleições municipais seguem. E começam também esquentar a verve apontando suas espingardinhas de rolha uns contra os outros, prenunciando o embate que ora inicia. 

As propostas dos candidatos ainda nem foram apresentadas aos eleitores, mas uma urgência se faz necessária: --que eles digam o que pretendem fazer para prevenir os incêndios e garantir a segurança da natureza e do cidadão desta cidade!

Surge assim, uma triste, porém oportuna ocasião para os candidatos, tanto ao Executivo como ao Legislativo dizer o que irão propor para preservar os incêndios no município. Falo de projetos que disciplinem e proíbam o plantio de eucalipto no entorno da cidade: proposição de vereador que um dia – que traz saudade -, apresentou e foi rejeitada.

Ao eleitor preocupado com o futuro e a sobrevivência das espécies nativas e vida de seus filhos e netos é um imperativo que ele exija de seu candidato um posicionamento responsável acerca do assunto. Quando a RPPN de Brasilândia sofreu um grave incêndio no ano passado e o Instituto Cisalpina promoveu um debate na Câmara Municipal, um rol de sugestões foi encaminhado à empresas, entidades e instituições governamentais. Eis aí uma boa oportunidade para os candidatos se inteirarem sobre o assunto e incluir em seus programas de governo compromisso com algumas das propostas ali apresentadas.

Alguém poderá dizer que tais propostas podem ser apresentadas somente por candidatos a Prefeito. Ledo engano: Vereadores também podem e devem apresentar projetos de leis propositivos ao Executivo para tais temas. Isso demonstra o quanto o edil está atento aos sinais dos tempos que exige seriedade e envolvimento integral do agente político nas questões sociais e ambientais de seu município. Eleição não é um concurso de miss simpatia, disse um candidato certa vez.

A apresentação de propostas e compromissos assumidos pelos candidatos, além de ser cartão de visita que inspira a confiabilidade do eleitor é uma excelente forma de descolar o discurso de enfrentamento pessoal desmedido e provocado pelo calor do debate irascível.  Conduta que só tende a incendiar as relações entre as pessoas, famílias e amigos, causando estragos, queimaduras e cicatrizes que marcam para sempre a vida de cada um.

Sinal de maturidade política é um atributo que deve ser exigido não somente dos candidatos, mas também deve ser manifestado pelo eleitor criterioso e ajuizado que deverá ter sabedoria para relevar as ofensas e apostar no futuro fazendo a escolha mais acertada. Nunca o papel de bombeiro, no combate ao fogo e na promoção da paz foi tão necessário aos candidatos como nestes tempos de promessas e palavras em combustão.


Brasilândia/MS, 2 de outubro de 2020.


[Foto] Rádio Caçula, Três Lagoas/MS, 1º de Outubro de 2020







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