Dona Antônia Pereira da Costa, uma lembrança, uma história.
Carlos Alberto dos Santos Dutra
O dia corria calmo. O telefone toca. É uma senhora
de voz grave que me dirige a palavra pela primeira vez. Falava-me que queria
agradecer as palavras de consolo e alento dirigidas à família por ocasião do
falecimento de seu esposo, Hélio Katsumi
Kobayashi falecido no dia 21 de março de 2019.
Falava que minhas palavras haviam tocado o seu
coração e que queria me conhecer, pois, segundo ela, eu deveria ser uma pessoa
especial com quem teria o máximo prazer em conversar.
Minha esposa já tinha me falado desta gentil senhora
que, certa vez, dedicou-lhe um bom par de horas para contar-lhe os segredos da
vida, sua história e seus sonhos. Tratava-se, sim, de uma pessoa onde nossos
ouvidos podiam descansar como se numa rede estivesse, ao som dos pássaros no
fim de uma tarde outonal.
Pois essa senhora, no dia de ontem, deixou a cidade
de Brasilândia para sempre. Dona Antônia
Pereira da Costa, conhecida pelos mais íntimos como Tonica, não resistiu à investida cruel da Covid-19 e rapidamente partiu,
sem mesmo poder se despedir da família e dos amigos.
Aquela foi a ultima vez que ouvi sua voz e suas palavras,
e lembro que havia lhe prometido visitá-la. Não o fiz. E como lamento não ter
podido vê-la. Não para receber suas homenagens pela admiração que todos nós
dispensávamos ao seu amado Hélio Kobayashi, mas para poder igualmente beber na fonte de sua sabedoria, bom
gosto e simplicidade.
Nascida na cidade de Paranaíba no dia 15 de setembro
de 1932, seu pai chamava-se Antônio Rangel Gusmão
e sobre sua mãe, que morreu de parto após ela
nascer, só sabia que se chamava Maria. Era uma família de quatro irmãos,
dois meninos e duas meninas; ela era a caçula, lembra a neta Michelle.
E a menina cresceu, cheia de sonhos e encantos com a
vida que despertava. A infância passou-a na cidade natal, e desde
cedo mostrou gosto pela Educação, passando a dar aulas para as crianças nas
fazendas com apenas 15 anos de idade.
Muito determinada, demonstrando traços de uma
natural elegância e fina formação, associada à vocação para o magistério como professora
de alfabetização rural, também ensinava etiqueta e crochê para filhas de fazendeiros que eram preparadas para se casar.
O sonho de ser professora só se realizou quando ela
deixou Paranaíba e foi morar com seus padrinhos em São José do Rio Preto, onde
iniciou e concluiu seus estudos formando-se professora.
Conheceu seu Hélio Kobayashi quando foi morar em Andradina para ensinar a filha mais velha do ‘Rei do gado’ , Antônio Joaquim de Moura Andrade, contava ela com muito orgulho.
Quando a jovem Tonica colocou os olhos sobre aquele
jovem balconista que trabalhava na farmácia do irmão mais velho, Hydetian Kobayashi, um novo tempo para
ela abria-lhe as portas da felicidade.
A vida dá muitas voltas na caminhada que empreendemos. No seu caso o sonho mais antigo era abrir uma butique. Já tinha experiência, pois havia trabalhado vendendo roupas e atendendo mulheres em casa quando se mudou para Três Lagoas.
Nesta época, recorda a neta Michelle,
quando meu avô foi se aventurar como garimpeiro no Amazonas e passava meses
sem vir pra casa, minha avó teve que sustentar a casa e os dois filhos, Alberto e Theotonio,
um estudando para engenharia e outro para concurso público do Estado.
Esta guerreira, desde que chegou a
Brasilândia na década de 1990, também foi uma engajada cidadã. Fotografias antigas
revelam seu rosto presente desde a fundação Rotary Club local ao lado do
esposo, participando e depois assumindo a presidência da Casa da Amizade em
1999 tornando-se presidente de honra da entidade por muitos anos.
No foro íntimo, dona Antônia era uma legítima matriarca e gostava de ser informada sobre tudo que ocorria a sua volta, sobretudo no âmbito da família, onde ela era a senhora do lar. Segundo a neta Michelle, em todas as situações, mesmo quando nós fingíamos fazer o que ela determinava, a palavra final sempre era dela.
Sempre foi uma lady, desde a juventude, até para cozinhar. A neta relembra
que morou com seus avós dos seis aos
trinta e três anos e confessa: só vi
minha avó parar de cozinhar de calçado de salto, quando suas pernas já não a
obedeciam mais por causa da osteoporose e descalcificação adquirida com os anos
e as longas jornadas carregando pesadas malas de roupas para vender.
Guerreira de coroa, minha avó era uma muralha que estava sempre ao lado do meu avô em tudo; mestre zelosa criou os filhos e os netos ensinando-lhes a serem firmes e honestos. Também foi sempre muito caridosa.
Deixam saudade os aniversários e festas comemorativas, cujas
mesas estavam sempre cheias de coisas
gostosas, um carneiro recheado assado inteiro com o melhor tempero do mundo, as
quatro saladas, duas refrescantes e duas cremosas, o Gohan (arroz japonês) que não podia faltar...
Ah. Vó Antônia, mãe Antônia, tia Antônia, amiga
Antônia. É só saudade nesse vazio que você deixou.
E essa doença maldita que nos tirou o direito de consolar e ser consolados, sem o direito de nos despedir, tudo tão frio e solitário. Doença que nos roubou o bem mais precioso e acabou inclusive com os planos que todos temos em relação à morte, queixa-se a família.
Sem
dignidade alguma, enrolada em um plástico impermeável foi colocada em um buraco: ‘área dos mortos por Covid19’. Nem o direito de repousar ao lado do marido e do filho no túmulo ela teve...
Por aqui a dor vai permanecer por muito tempo. Embora isso não seja mais importante.
Porque sua alma, temos convicção, descansa nos braços do Pai e sob os cuidados
da Mãe Celeste. Fique em Paz dona Antônia
Pereira da Costa.
...
Como bem nos confidenciou o querido amigo e mestre Mário Nelson da Silva numa síntese perfeita do que foi e representou esta senhora para Brasilândia: Dona Antônia, a Grande Dama foi reunir-se com o Esposo Dr. Hélio Kobayashi, e o Filho Alberto ‘Koba’ na Casa Celestial. A Elegância e a Inteligência da Senhora Antônia, lhe conferia o ar e postura de Nobreza que marcou o seu tempo na Sociedade brasilandense. Deus a tenha!
Brasilândia/MS, 16 de abril de 2021.
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