A dengue, a
máquina e o homem.
Carlos Alberto dos Santos Dutra
Já estamos quase nos acostumando com aquele zunido pelas ruas da
cidade.
Logo ao cair da tarde ou altas horas da manhã, lá está o fumacê da Secretaria Municipal de
Saúde aplicando o inseticida contra o mosquito aedes agypti, transmissor da dengue.
A máquina é potente e o jato de fumaça atinge a vegetação e espaço
compreendido entre o meio fio da calçada e o muro ou cerca das casas.
Busca, assim, eliminar o mosquito instantaneamente sem colocar em risco
a saúde humana.
É um rito que quase nem percebemos. Afinal, estamos tão ocupados com o banho das
crianças, colocando a rotina da casa em ordem, depois de mais um dia
de trabalho, enquanto a noite chega. Ou, já levantando atrasado para mais um dia de labuta, para o corre-corre da vida, e
nem colocamos reparo naquele som que passa em frente da nossa casa.
Mas eles estão lá. Após o horário comercial, à noite; ou muito cedo,
junto com o sol que começa a iluminar a cidade, lá estão eles ajustando
o equipamento (UBV-Ultra Baixo Volume) instalado sobre o veículo da
Vigilância em Saúde, e dando partida para mais um dia de prevenção.
Afinal, no ano que findou foram mais de 400 casos confirmados de Dengue,
segundo dados do Núcleo de Endemias de Brasilândia. Ao lado das visitas
realizadas pelos Agentes de Combate às Endemias nas residências, alertando
a população sobre as maneiras de evitar a proliferação do vetor, o
combate ao mosquito com o fumacê foi intensificado sobretudo neste período de
chuvas.
De distintos pontos da cidade, igualmente, outros profissionais e voluntários
iniciam também a sua faina revisitando cada bairro e cada rua da cidade em busca de pesados tambores que carregam no ventre o
que restou do consumo: ora aproveitável, reciclável; ora desprezado,
rejeitado.
São servidores anônimos, como tantos outros, cuja presença só nos damos
conta quando ouvimos o som daquele equipamento que passa, a música da Assobraa que cantarolamos, ou o
ruído seco do caminhão da coleta do lixo orgânico da prefeitura.
Achamos
isso tão natural que esquecemos que dentro da máquina, dirigindo o
veículo ou correndo com fôlego de guepardo, de um lado para o outro, pelas ruas da cidade,
seguindo aquele caminhão, existem pessoas, verdadeiros heróis sem rosto.
A crise de humanidade que nos acomete, instigada pela rapidez e frieza
da técnica, cada dez mais nos afasta uns dos outros e nos nutre de
ingratidão. O distanciamento social e as medidas sanitárias que nos
obrigam a esconder o rosto e o sorriso, se tornou o maior desafio para
que não nos tornemos de vez mais autômatos.
Isso porque a automação, a tecnologia e o aparato dos equipamentos que
nos rodeia: celulares, computadores, controles remotos, mídias sociais,
web sites e aplicativos, tudo conspira contra o que ainda nos resta de
humanidade, cultura e respeito ao próximo.
Perdemos a capacidade de reconhecer o esforço e resiliência de quem
está a nossa volta. E tudo em troca da informação e novidade que nos é
enviada por um desconhecido que está do outro lado do mundo. O som do fumacê, do caminhão da Assobraa e a
alegria de quem coleta o lixo orgânico, como um estampido no asfalto, nos faz
acordar deste delírio.
Obrigado Agentes de Combate às Endemias. Obrigado Agentes Ambientais da Assobraa, pela coleta semanal de
matérias recicláveis e que nos ensinam a construirmos um mundo menos egoísta e mais
sustentável. Obrigado Motorista do caminhão da coleta de lixo e seu sorriso; obrigado aos valorosos
Servidores que cumprem com dedicação e afinco, suando a camisa, a
tarefa cuja percepção e gratidão quase sempre nos escapa.
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