sábado, 26 de novembro de 2022

 

Mulher Negra, Mãe, Escravizada, Advogada.

Conselho da OAB Nacional reconhece Esperança Garcia como primeira advogada do Brasil



 

O Conselho Pleno da OAB Nacional reconheceu, na manhã desta sexta-feira (25/11), Esperança Garcia como a primeira advogada brasileira. Ela foi uma mulher negra escravizada que lutou contra a situação a qual ela e outras pessoas foram submetidas. O presidente Beto Simonetti comunicou aos presentes que a direção nacional aprovou o reconhecimento e a construção de um busto em homenagem a ela a ser colocado na sede do Conselho Federal.

O tema foi abraçado pelo CFOAB pela então presidente da Comissão Nacional da Mulher Advogada (CNMA) e hoje presidente da OAB-BA, Daniela Borges, e a então presidente da Comissão Nacional de Promoção da Igualdade (CNPI) da OAB, hoje conselheira federal Silvia Cerqueira (BA). Ambas fizeram o requerimento em nome da história de Esperança Garcia ainda na gestão 2019-2022, que foi também encampado pelas atuais presidentes dos órgãos, Cristiane Damasceno, na CNMA, e Alessandra Benedito, na CNPI.

“Mulher negra e escravizada peticionou, com o pouco conhecimento que tinha, das letras da lei, ao governador da capitania do Piauí para denunciar as violências pelas quais ela, suas companheiras e seus filhos passavam. A decisão é absolutamente oportuna, especialmente pela simbologia do mês de novembro, em que se comemora no dia 20 o Dia da Consciência Negra”, disse o presidente. Ele reforçou, ainda, que a OAB promove a campanha Novembro Preto, com o objetivo de falar sobre os avanços e impactos das questões raciais. 

“Que Esperança Garcia seja reconhecida como a primeira advogada brasileira. Para homenagear a história de Esperança Garcia, nada mais justo que reconheçamos agora a importância e declarar que ela é, sim, a primeira advogada do Brasil”, disse Beto Simonetti, presidente do CFOAB. Os conselheiros federais e direção nacional da Ordem aplaudiram de pé o encaminhamento.


História de Esperança


Em 2017, Esperança Garcia foi reconhecida pela seccional da OAB de Piauí como a primeira advogada piauiense. Em 6 de setembro de 1770, ela escreveu uma petição ao governador da Capitania em que denunciava as situações de violências pelas quais crianças e mulheres passavam e pedia providências. 

A data foi instituída, também, como o Dia Estadual da Consciência Negra, em 1999. O documento histórico é uma das primeiras cartas de direito de que se tem notícia. A OAB-PI considerou a carta como o primeiro habeas corpus e, portanto, o encaminhou aos dois colegiados que passaram a também resgatar a história para valorizá-la, em âmbito nacional. 

“Resgatar a memória de Esperança Garcia no plenário desta Casa é algo que nos remete à filosofia do ubuntu, que diz que devemos viver a restauração e a justiça no sentido de ver o passado para que não venhamos a cometer novamente aquelas atrocidades. Isso faz com que hoje vossa excelência tome uma atitude histórica, dando sequência a todo o trabalho que o Conselho Federal tem feito sobre as ações afirmativas. Esperança é um marco. Construiu o documento com toda a forma, desde o cabeçalho até o argumento final. Estou extremamente feliz e emocionada”, afirmou Silvia Cerqueira. 

Silvia Souza, presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos, também ressaltou a importância do caminho trilhado pela OAB bem como registrou homenagens à colega Silvia Cerqueira, a primeira conselheira federal negra, aquela que assumiu o projeto de resgate da memória de Esperança Garcia no CFOAB e, também, como lembrou, fez a sustentação oral no Supremo Tribunal Federal (STF) na ação que declarou constitucionais as ações afirmativas no ensino superior, a ADPF 186. 

A ideia é que seja construído um busto em homenagem a Esperança Garcia e como forma de lembrança do papel que ela cumpriu com firmeza na defesa da comunidade em que vivia. “É muita honra para o Piauí ter a história de Esperança Garcia reconhecida pelo Conselho Federal, e especialmente para nós, mulheres. O Piauí e a advocacia feminina estão em festa”, disse a conselheira federal pelo estado Élida Machado Franklin. 

O membro honorário vitalício Cezar Britto celebrou o momento. “A história é a referência que devemos ter para saber os caminhos que devemos seguir ou não seguir. Hoje é um dia extremamente importante neste reconhecimento. São esses gestos, de ação, que acenam para o público que é importante persistir, resistir.”


Dossiê Esperança Garcia


O reconhecimento a Esperança Garcia ocorreu sob a liderança e o trabalho de pesquisa da saudosa professora e advogada piauiense, Maria Sueli Rodrigues de Sousa, que presidiu a Comissão da Verdade da Escravidão Negra da OAB/PI (2016-18), período em que coordenou a produção do "Dossiê Esperança Garcia”, estudo responsável por reconhecer o título a Esperança Garcia como a primeira advogada do estado do Piauí e por tornar conhecidos nacionalmente seu nome e sua história como símbolo de resistência para o Direito.

"Eu penso que a Esperança aprendeu a ler por outros meios (que não pelos jesuítas). Agora, a gente olhando as Ordenações Filipinas, a gente vê que culmina com uma petição. O endereçamento tá correto, porque era endereçado ao rei. A luta pra tomar água. Era endereçada ao rei. O governador da província era o representante do rei. Por isso, ela endereçou a ele. E ela começa se apresentando, dizendo que é casada e tem muitos elementos religiosos. Mas a gente não pode esquecer o que eram as Ordenações Filipinas. Então, ela ia atrás daquele que a protegesse", afirmou Maria Sueli, em entrevista à Revista Direito Público (confira aqui).


Em série de textos que homenagearam juristas que marcaram a história, publicada ao longo do mês de agosto, quando se celebra, no dia 11, o Dia do Advogado, Esperança Garcia teve sua história contada e registrada.

Confira aqui a íntegra. Confira o estudo sobre Esperança Garcia coordenado pela advogada Maria Sueli Rodrigues de Sousa

 

Fonte: https://www.oab.org.br/noticia/60503/esperanca-garcia-e-reconhecida-pelo-conselho-pleno-como-a-primeira-advogada-brasileira; Foto: Imagem de Esperança Garcia postada em https://esperancagarcia.org/esperanca-garcia/

Nenhum comentário:

Postar um comentário