A fumaça e a morte lenta que nos espera
Carlos Alberto dos Santos
Dutra
A morte, com o passar dos
anos, nos acostumamos com ela. Sobretudo a morte dos outros. Ainda que sejam
nossos parentes e amigos, a idade e o tempo nos torna indiferentes diante dela.
Passado o elemento surpresa, secundado pelo sentimento de dor, pela perda do
ente querido, em menos de uma semana, já estamos tocando a vida em frente,
pois, afinal, existe muita coisa que precisamos fazer ainda enquanto estamos
vivos.
A mãe-terra há tempo vem
dando sinais de que o mundo não é mais o mesmo. Os anos também passaram para ela, e como nós, ela também envelheceu.
Mais que isso, por força das mudanças climáticas, vê exaurida sua força e sua capacidade
de renovar-se, lançando sobre a crosta terrestre, sinais de alerta a seus
habitantes. Pois já não é mais possível responder os apelos, cada vez mais
exigentes dos padrões de vida requeridos por todos em todos os cantos do
planeta.
Assim como acontece com nossos
familiares e amigos, que todos os dias estão se despedindo de nós,
desencarnando da condição humana ressurgindo para outro plano, quiçá mais espiritual que
este em que vivemos, a mãe-terra e a força de seu ventre e braços dão sinais
visíveis a olho nu, de seu cansaço e nos joga na cara intempérie e gestos de adeus. Como
um viandante que, depois de uma longa jornada, sente o fôlego lhe faltar,
externando um grito silencioso de alerta e despedida.
A fumaça que está cobrindo
as cidades do Brasil e do mundo é fruto e consequência da ação desesperada dessa mãe-terra, cujo vagido em favor de seus rebentos, percebe que seu ventre, em agonia, está
estéril e ela impedida de procriar. Deu seus ramos e sua sombra; deu seus
frutos e raízes na intenção de ver seus filhos alimentados e protegidos.
Águas correntes, límpidas e abundantes, para a dessedentação da fauna e flora
exuberantes. E ainda assim, não contentou a todos.
A fumaça está carregada de
partículas que desprendem dos filhos-árvores, esturricados pelas labaredas do
fogo e a crueldade das chamas que tudo devora motivada pela sede do lucro e o
ter sempre cada vez mais. E avança aos poucos, adentrando nossas casas, contaminando a saúde e tirando a vida do que há de mais precioso dentro delas:
as pessoas que amamos.
Ainda que possamos agradecer a
Deus por nos encontrar distantes das chamas que engolem florestas, plantações e
animais, ao vê-los em fuga desvairada em busca de um lugar seguro e uma gota de
água sequer para aplacar a sede e o calor infernal que lhe sobem pelas patas, na tela
da TV, nos revolta o estômago.
O calor e a fumaça, ainda
assim, são pacientes e avançam, desde o romper da aurora até o declínio do sol, e
seguem invadindo o corpo de seus filhos-brotos roubando-lhes o ar de suas vias
respiratórias. Célere, a onda de calor e fuligem logo ganham os pulsões, contaminam o
sangue e embotam o modo de ser e pensar da humanidade. Quando nos damos conta,
cá estamos usando máscaras, ou na fila de um hospital em busca de alivio para
nossa dor terminal e tratamento médico, que pouco ou nada poderá mudar o caos instaurado em nossa alma e organismo.
Ainda não nos acostumamos o
bastante com a morte. Neste país abençoado por Deus, nunca tivemos entre nós
os horrores incontroláveis de uma guerra, quando somos
todos vítimas impotentes diante de um mal maior. Lição que ainda deverá ser aprendida, se houver tempo. A fragilidade do meio ambiente
e o cuidado com a vida, nunca foi levado a sério, apesar do alerta dos
ambientalistas contra gestores moucos, senhores da ganância e do capital.
Experimentados em buscar cada vez mais o chamado crescimento econômico e as vantagens tecnológicas da civilização que tornam a vida cada vez mais confortável só para menos de um terço da população do planeta, viramos as costas para o grito dos demais e o socorro que a mãe-terra há tempo vem bradando sob a bandeira das mudanças climáticas, pedindo um basta ao progresso insano que não respeita a vida e coloque um freio na soberba e loucura dos homens, antes que o fogo e a fumaça nos mate a todos.
Brasilândia/MS, 15 de setembro de 2024.
Rogai por nós Nossa Senhora das Dores.
Dia de Nossa Senhora das Dores, também chamada de Nossa Senhora da Piedade, Nossa Senhora da Soledade, Nossa Senhora das Angústias, Nossa Senhora da Agonia, Nossa Senhora das Lágrimas, Nossa Senhora das Sete Dores, Nossa Senhora do Calvário, Nossa Senhora do Monte Calvário, Mãe Soberana e Nossa Senhora do Pranto.
Que Nossa Senhora rogue por todos nós
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