domingo, 16 de outubro de 2022

 Que fizeram de ti, meu velho Clube Ferroviário Apolo?

Carlos Alberto dos Santos Dutra

Poesia VOZ

A última imagem que tinha do velho Apolo era essa. Ereto e ainda com cobertura. À semelhança de um velho Charrua, mantinha a dignidade de um posteiro. Resistindo a intempérie e a brisa dos ventos vindo da pampa nua gaúcha.

Ainda depositava alguma esperança no bom senso dos homens, Prefeito, Governador, Presidente. Achei que haveriam de recuperá-lo para o patrimônio histórico, honrando a tradição da minha, da nossa Cacequi. O Cacequi dos meus recuerdos.

Só que os administradores já não pensam mais no ontem. E tampouco no amanhã... Esquecem rápido o que os antigos fizeram, de bom. Já não olham mais para trás, acham-se donos do mundo e do futuro. E rapidamente passam a borracha nos trilhos da história. E apagam tudo, riscando da memória o feito de seus pais.

É uma lástima ver agora o que restou daquele grande clube. Dá vergonha olhar. Dá mais vergonha olhar para os responsáveis por tamanho crime praticado contra o patrimônio do povo.

Mas ei-lo aí, imponente: Tapera. A foto de um gigante nos últimos estertores...

E eis que desperto do saudosismo que me embala para longe da realidade. Coloco os pés no chão. E custo acreditar.

Ah! como dói ver esta foto. É como se as paredes gritassem. Tal qual o apito das locomotivas feridas, encostadas no pátio do depósito, teimando em permanecer de pé. Sobrevida que esperam e a saudade que alimentam.

Parece que foi ontem, éramos meninos, cheios de sonhos e planos. E pulávamos os vagões para chegar cedo no baile. Que começava as 20 horas. E a meia noite, nosso pai já vigiava nossa chegada em casa. E éramos felizes.

Ah! o tempo bom... Aquela escada pomposa do clube para chegar ao salão... E ao longe a bulha do taco da bota cantando. Que orgulho subir aqueles degraus e encontrar o salão cheio. Prendas rodando, a a fina estampa ferroviária vivia os seus melhores dias.

O abandono do prédio é o retrato da decadência. Dos chamados tempos modernos.
Para não dizer da irresponsabilidade dos governantes que voltam às costas para a história de sua gente, de sua terra.

Enquanto o cidadão, em silêncio, tudo assiste...
Acabrunhado e ao mesmo tempo pasmo, diante de tão podres poderes... E em razão deste episódio, considero-me de luto. Até, me refazer deste pialo.

 

Publicado originalmente em 12.Mar.2012. Também em DUTRA, C.A.S., Diálogos impertinentes e crônicas de adeus, Brasilândia, 2020, pág. 217; Trilha: Unforgiven: Claudia’s Theme (Lennie Niehaus, 1994); Voz: Carlito Dutra


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